quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Contas bancárias do Estado

Não tenho qualquer procuração do banco central de Timor Leste, a Autoridade Monetária e de Pagamentos (ABP), para escrever o que vou escrever. Escrevo, portanto, em nome exclusivamente pessoal e utilizando o que sei do funcionamento do sistema bancário do país, conhecimento esse de carácter genérico e ao alcance de qualquer pessoa mais interessada no assunto. Não tenho, pois, informação privilegiada sobre o assunto.

O Regulamento 2001-30, de 30 de Novembro de 2001, aprovado ainda no tempo da UNTAET e ainda não alterado é, na prática, o estatuto por que se rege a ABP.
Na alínea g) do seu Artº 6º, sobre "Poderes Específicos) (ver o documento aqui, no 'sítio0 da Autoridade) diz-se que um desses "poderes específicos" é o de

"(g) manter e gerir todos os recursos financeiros públicos, incluindo as reservas de divisas oficiais, mas excluindo os fundos de aposentação criados pelo Administrador Transitório"

Naturalmente que o "Administrador Transitório" da época era o RESG da ONU que tinha a apoiá-lo a administração desta no terreno, a UNTAET. Após a independência (ou a restauração desta, como queiram) em 20 de Maio de 2002 o Estado Timorense substituiu a UNTAET e os direitos e obrigações desta passaram para ele. Foi o caso do disposto nesta alínea, que é bem clara: compete à ABP gerir TODOS os recursos financeiros públicos do país.
Daqui resulta que o Estado Timorense, enquanto tal, não pode ter contas bancárias abertas noutros bancos que não seja o banco central. Com exclusão, portanto, dos bancos comerciais que operam no país.
Não deverá, pois, haver qualquer conta do Estado aberta na banca comercial do país. Como os bancos comerciais sabem qual a norma em vigor, será impensável que tenham desrespeitado a norma legal existente e, por isso, que tenham aberto contas em nome do Estado --- mas eventualmente geridas pela pessoa "A" ou "B" da Administração do país. O que não é o mesmo que dizer que não haja, eventualmente e como parece deduzir-se de notícias postas a circular, dinheiros públicos em contas privadas, eventualmente como mero expediente de gestão de fundos ainda não utilizados. Mas para este tipo de recursos há regras e parece que o que o governo está a tentar saber é se essas regras estão a ser cumpridas ou não. A ver vamos.

Admito, mas não tenho confirmação se existem ou não, que haja algumas contas em que o Estado é co-titular conjuntamente com outras entidades, nomeadamente organizações estrangeiras financiadoras de projectos realizados por doadores internacionais no quadro da sua ajuda ao país. Se existirem não são ilegais pois não se trata verdadeiramente de "recursos financeiros públicos", sendo a existência de uma conta bancária uma necessidade evidente de gestão corrente dos projectos. Mas neste caso, "penso eu de que", é norma que qualquer movimentação da conta seja feita mediante duas assinaturas, representando cada uma das "partes" (a pública e a "privada" --- leia-se "não pública timorense).

2 comentários:

Anónimo disse...

Caro Professor,

Mas então os impostos não são pagos no bnu??? Será que a conta onde caem os impostos não é do estado???

Quer dizer que deveriam ser pagos na ABP???

Não entendo esta questão de o Estado não poder ter contas no bnu...

Anónimo disse...

Os impostos são pagos no BNU mas, tanto quanto sei, numa conta que é da ABP. Esta, por sua vez, coloca imediatamente à disposição do Tesouro Nacional as verbas que recebe.
Para entender a legislação tal como existe --- é teoricamente possível que nos estatutos do futuro Banco Central de Timor-Leste, que sucederá à ABP, a solução seja diferente --- é conveniente reportarmo-nos ao momento da criação da ABP e dos eu estatuto, ainda no tempo da UNTAET.
O objectivo terá sido, creio, evitar a dispersão de contas do Estado, o que dificultaria uma boa gestão dos seus dinheiros. Assim, o único interlocutor do Tesouro Nacional é a ABP, encarregando-se esta, porque mais conhecedora do negócio bancário, de se entender com os bancos comerciais. Creio que foi uma solução apropriada à época e tenderia a deixá-la como está sob pena de o Estado, com alguma facilidade, poder "perder o fio à meada" na gestão dos seus recursos. A multiplicidade de contas --- quantas contas por cada Ministério e por cada Secretaria de Estado, etc.? --- é propícia ao "desaparecimento" de dinheiro...

A. Serra