terça-feira, 31 de março de 2009

O Banco Asiático de Desenvolvimento e as centrais eléctricas

No texto abaixo publicado pelo ADB-Asian Development Bank (Banco Asiático de Desenvolvimento) consta, na última página, uma "caixa de texto" em que se comenta a opção de construção das centrais térmicas. Veja abaixo a tradução:

"Mais de metade dos USD 616 milhões de despesas de capital orçamentados para período 2009-2012 será gasto em construir centrais elétricas abastecidas por óleo importado para eletrificar as áreas urbanas (e depois as rurais).

O Governo assinou um contrato para instalar 180 megawatts (MW) em capacidade geradora até ao fim de 2010, complementada com linhas de transmissão e de distribuição. Isto representa um aumento muito grande relativamente à actual capacidade instalada de 40 MW.

Este programa de eletrificação foi anunciado a meio de 2008 e os contratos foram assinados antes do final do ano. Uma fase de preparação mais longa teria sido útil para permitir analisar de uma forma mais completa as questões de desenvolvimento envolvidas.

Um assunto fundamental é se a expansão da produção [de energia] vai ultrapassar a procura --- um estudo sobre o sector energético realizado [pelo ADB] em 2004 calculou que o país precisaria de 50-100 MW de capacidade adicional antes de 2025 para aumentar a taxa de eletrificação de 20% para 80% Outro assunto é se a eletrificação deveria ter uma prioridade tão alta na elaboração do Orçamento.

Eletricidade é um serviço que pode ser auto-financiado --- pelo menos em parte --- por taxas cobradas aos utilizadores. Pelo contrário, serviços como assegurar a lei e a ordem, manutenção de estradas, educação e saúde para os pobres não podem ser auto-financiados eles deveriam ser a prioridade na utilização de recursos do orçamento. "

Chame-se a atenção, principalmente de um ponto de vista metodológico, para dois pontos levantados no que fica atrás:

1) a opção de instalar, "de uma assentada", uma capacidade de produção de energia que é muito superior à referida no estudo. Como este foi efectuado por encomenda do próprio ADB alguns poderão argumentar que ele não é um observador neutro do assunto já que se sentirá na (quase) obrigação de "defender a sua dama". Mas se isto poderá ser eventualmente verdade (só um bocadinho...) quanto à capacidade total a instalar, fica por resolver a questão do timing da construção. Justiticar-se-á instalar toda a capacidade quase ao mesmo tempo sabendo-se que, muito provavelmente, se irá verificar durante (muitos?) anos uma significativa diferença entre capacidade instalada e níveis de consumo? Qual é, nas estimativas do governo, o timing das necessidades? É ele realista (whatever it means)? E se o era no momento em que se tomou a decisão continuará a sê-lo actualmente, quando as perspectivas de receitas petrolíferas são muito menores devido à queda do preço do petróleo?

2) o outro ponto prende-se com a velha "angústia existencial" dos economistas: o da gestão dos recursos escassos. Isto é: quando o "lençol" dos recursos disponíveis é pequeno e o "corpo" das necessidades a cobrir é grande, há que optar: tapa-se primeiro a cabeça ou os pés? Isto é: a hierarquia de objectivos que esteve subjacente à opção terá sido a mais adequada? Segundo o ADB não foi.

Note-se que em quanto fica dito não se equacionou um outro, terceiro, problema: o do "como" se vai produzir a energia. Isto é: o da conveniência ou inconveniência da opção pela construção de centrais a óleo pesado. Se este assunto não está explicitamente referido a verdade é que se pode dizer que se fala indirectamente dele ao dizer-se que "uma fase de preparação mais longa teria sido útil para permitir analisar de uma forma mais completa as questões de desenvolvimento envolvidas".

Com esta "introdução" acabada de publicar, fico atento ao que o ADB tem para dizer na conferência de doadores de Timor Leste...

PS - mais que concordar ou discordar das opções de "A" [o Governo] ou de "B" [o ADB] interessou-me aqui ajudar a ler a "caixa" de texto publicada pelo Banco. Mania de mestre-escola...

A economia asiática e de Timor Leste segundo o ADB

O Banco Asiático de Desenvolvimento, com sede em Manila, publicou hoje o seu principal relatório anual, o Asian Development Outlook 2009.
Nele se prevê que o conjunto dos países em desenvolvimento da Ásia (que inclui, nomeadamente, a China e a Índia e também Timor Leste) sofrerá um forte abrandamento do seu crescimento económico durante o presente ano. De facto, depois de ter crescido 9,5% em 2007 e 6,3% em 2008, o Banco espera que o grupo cresça apenas 3,4% em 2009, recuperando eventualmente para os 6% em 2010.
Esta queda do ritmo de crescimento fica-se a dever ao contágio da crise económica nos países mais industrializados e consequente queda das suas importações, muitas delas oriundas da Ásia em desenvolvimento. A quebra das exportações desta é, pois, a razão principal do abrandamento do seu crescimento.
Note-se que as estimativas de crescimento feitas pelo ADB partem do princípio de que a contracção do produto nos países industrializados será de cerca de 2,6% (i.e., "crescerá" à taxa de -2,6%) e o comércio internacional diminuirá 3,5% em relação ao ano passado.

Só que... a OCDE acaba de publicar, também hoje, as suas previsões para este ano, bem mais pessimistas que as do ADB. Segundo ela a queda da produção nos países industrializados (os da OCDE) será de 4,3% (e não os 2,6% previstos pelo ADB) e a queda do comércio internacional atingirá o número "impensável" de -13,2%!...
Acrescente-se que a OCDE põe, desde já "as barbas de molho" e vai dizendo que não se admirava nada se a queda da produção no conjunto dos seus membros ultrapassasse aqueles -4,3%. "'Tá lindo isto, 'tá..." Recuperação? Em 2010 e e!...

Isto é: a confirmarem-se as previsões da OCDE a queda da economia asiática será, muito provavelmente, bem maior que o que foi agora previsto pelo banco asiático. Especialmente preocupante é a previsão de queda do comércio internacional, que pode atirar com o crescimento desta região para níveis pouco acima da linha de água...

Uma nota quanto às previsões do ADB e da OCDE para a evolução do preço do petróleo bruto em 2009. Enquanto o primeiro estima que ele vai ser, em média, de 43 USD/barril (50 em 2010), a segunda estima que será de 45 USD/barril este ano. Qualquer dos valores está bem abaixo da previsão do OGE2009 de Timor Leste: 60 USD/barril.
Estes números são, naturalmente, más notícias para o país já que as receitas do petróleo serão, a confirmarem-se os valores estimados pelas duas organizações internacionais, muito menores que no passado recente. Em 2008 o preço médio do barril foi de 97,3 USD, pelo que as actuais estimativas para 2009 apontam para receitas petrolíferas de Timor que serão um pouco menos de metade das do ano passado, com todas as suas consequências sobre o financiamento do OGE e das actividades --- nomeadamente de investimento --- nele previstas.

Finalmente, ficam abaixo as três páginas em que no Asian Development Outlook se apresenta a evolução recente da economia de Timor Leste (clicar nas imagens para as tornar legíveis). Voltaremos a esta análise mais tarde.

segunda-feira, 30 de março de 2009

Goodbye IMF!...

Este "Adeus, FMI!..." tem um duplo significado: um mais local, relativo a Timor Leste, e outro mais global, relativo ao papel do Fundo na economia mundial e, em particular, na crise actual.

O primeiro justifica-se porque parece agora certo que o escritório do Fundo em Dili vai ser encerrado, deixando de haver um representante permanente no país, cujos interlocutores fundamentais, tal como em todos os países, são o Ministério das Finanças e o banco central, no caso a ABP.
Note-se que esta despedida não altera significativamente o relacionamento entre a instituição e Timor Leste já que aquela continuará a prestar apoio técnico às instituições timorenses e a acompanhar (agora menos "de perto"...) a evolução da economia do país. A presença de representantes permanentes do Fundo num país não é a situação mais vulgar e justificou-se em Timor Leste por se estar numa fase de construção institucional que está mais ou menos completada nas duas áreas referidas.
Não cremos, por isso, que esta saída do Fundo tenha um significado muito especial. Provavelmente é um misto da constatação daquela evolução institucional e de... desejo de o FMI poupar alguns dólares numa época em que, todos o sabem, as suas finanças não são o que já foram. Mas certamente que não é esta "poupança" que vai fazer o Fundo "enricar"...

O segundo significado é em sentido menos "absoluto" que o primeiro: não se trata de uma despedida, de um "encerramento", mas sim de uma evidente dificuldade em encontrar um papel para a instituição no quadro da presente crise financeira mundial. Alguns, mais mauzinhos, dirão mesmo "cá se fazem, cá se pagam!...".
Na verdade --- e já salientámos isto aqui há algum tempo --- parece evidente que os países "que contam" para tentar encontrar um caminho que nos tire da crise mundial em que se vive "não estão nem aí" para o que o FMI pensa ou deixa de pensar, faz ou deixa de fazer.
O que não deixa de ser uma situação curiosa já que o Fundo teve origem (em 1945) na necessidade de estabelecer um polícia para o sistema financeiro e cambial mundial, na época constituído quase exclusivamente pelos países mais desenvolvidos.
Foi a crise associada ao primeiro choque petrolífero, lá nos idos de '73, que acabou por, em conjugação com o nascimento de algumas dezenas de novos países na década de 60, contribuir para uma alteração significativa do tabuleiro em que se mexia o Fundo, passando a ser especialmente importante para os países em desenvolvimento.
Depois de resolvida (mais ou menos...) a "crise da dívida (externa)" destes países e com o aparecimento de países como a China e a Venezuela como financiadores (quase sem condições) de muitos países em desenvolvimento, o FMI entrou numa fase de alguma "angústia existencial" que parece ter dificuldade em ultrapassar.
Conscientes de que os países menos desenvolvidos tenderão a sofrer também os efeitos da crise financeira actual através de dificuldades em exportar e em se financiarem, o Fundo e os países mais desenvolvidos (os do "Grupo dos 7"/"G7") têm procurado criar "almofadas" que apoiem aqueles países. Estas "almofadas" são novas facilidades financeiras geridas pelo FMI a que os países poderão recorrer e que têm condições de acesso menos restritivas que as anteriormente existentes.
O curioso é que nem assim os países a que elas se destinam lhes "pegam": segundo notícias recentes o programa de 100 mil milhões de USD criado pelo Fundo para apoiar países em desenvolvimento está sem um único candidato! Até o México, cujo Ministro das Finanças foi quadro importante do Fundo disse "não, obrigado!...".
É evidente o esforço que o Fundo tem feito para modificar a "má fama" de que goza devido à forma como lidou com os seus clientes nos momentos em que estes mais precisaram dele mas tais esforços parece não estarem a produzir (ainda?) resultados. Aquela "má fama" deve-se não só às condições que colocou nos programas de estabilização conjuntural e de ajustamento estrutural dos países em desenvolvimento mas também à forma, por vezes com uma boa dose de arrogância e sobranceria, com que a instituição e o seu pessoal se relacionou com as autoridades e os técnicos dos países sem respeitarem devidamente a autonomia de ambos.
É por estas e por outras que o Ministro das Finanças da África do Sul, Trevor Manuel, diz que "o treino e o recrutamento do pessoal do Fundo deve reflectir adequadamente as alterações do papel e do mandato da organização. Mudar a estrutura e funções actuais do Fundo sem diversificar o seu portfolio intelectual [nomeadamente por modificação do seu quadro de pessoal, clarificamos nós] diminuirá a eficácia e relevância da instituição no futuro".
Como diz um autor: "o DNA da instituição tem de ser literalmente renovado!"

sexta-feira, 27 de março de 2009

Reunião entre Timor Leste e os seus "parceiros de desenvolvimento"

No próximo dia 2 de Abril irá começar a próxima reunião entre Timor Leste e os seus "parceiros de desenvolvimento".
Será interessante ouvir/ler então o que quer o Governo quer os doadores têm para dizer sobre a evolução económica recente da economia e da política económica do país, particularmente tendo em atenção a necessidade de combinar os anseios por um desenvolvimento (rápido) com as limitações a este decorrentes quer das dificuldades estruturais do país --- nível baixo de formação dos recursos humanos, baixo nível de infraestruturação física, (excessiva) dependência do papel do Estado na economia devido ao ('fraquissíssimo', como diria um amigo meu...) sector privado --- quer das de natureza mais conjuntural --- como a adaptação das despesas públicas à queda (brutal) das estimativas de receitas do petróleo devido à baixa do preço médio deste no mercado internacional.

Esperemos para ver. Interessa paticularmente estar atento aos documentos emanados do governo mas também aos documentos provenientes dos "parceiros", em especial as organizações internacionais como o FMI e o Banco Mundial. Lidos nas linhas e nas entrelinhas poderão dar pistas interessantes para o futuro.

quarta-feira, 25 de março de 2009

Pois...

Afinal parece que o mandato de que se fala abaixo não vai ser do tamanho XXL mas sim do tamanho XXS...

sábado, 21 de março de 2009

Mais vale tarde que nunca... ou "água mole em pedra dura..."

Vêm estes títulos a propósito da recente decisão tomada pelas autoridades timorenses de submeterem a uma avaliação independente o processo de construção das centrais térmicas.
Resta saber qual o verdadeiro âmbito do mandato que o grupo de avaliação vai receber.
Será que, como parece deduzir-se, é um mandato suficientemente aberto para que a análise seja feita no contexto da definição de uma política energética alternativa em que se enquadrarão, ou não, as referidas centrais ou é um mandato "curto", limitado à determinação das consequências da construção das centrais e do seu timing --- a qual é assumida como um dado adquirido com a "desculpa" de que já há, pelos vistos, contratos assinados?
E se, no quadro de um mandato mais "alargado", se chegar à conclusão de que as centrais não devem ser construídas? Como descalçam a bota?

Mas há um outro nível, eventualmente mais político, em que esta decisão deve ser analisada: o de que, pela primeira vez, as autoridades timorenses dão um passo (no bom caminho) em resposta a sugestões do que se convencionou chamar a "sociedade civil", numa manifestação de alteração de comportamentos anteriores que deve ser saudado --- e que se espera que se mantenha no futuro, seja qual for o "locatário" do Palácio do Governo. Mas também temos de convir em que o caso era tão "gritante" que era quase impossível fazer "orelhas moucas"...

PS - é, certamente, uma feliz coincidência mas é curioso notar que a decisão foi tomada nas vésperas da reunião de "parceiros de desenvolvimento" de Timor Leste. Não deixará de ser (muito) bem recebida por estes.

sexta-feira, 20 de março de 2009

Timor Leste e o café

O café de Timor Leste é usualmente classificado como um dos melhores do mundo. Principalmente pelos próprios timorenses, claro! Temo, no entanto, que a sua qualidade não seja actualmente o que poderia ser --- embora algumas empresas se preocupem em assegurar uma elevada qualidade no café que produzem e exportam.
Razão para uma certa degradação da qualidade do café será o desaparecimento, em muitas explorações, das "boas práticas" que estão na base de um bom café. Assegurar que são colhidas apenas as cerejas mais maduras --- ou, pelo menos, evitar que se faça uma colheita simultânea de cerejas maduras e verdes --- é essencial.
Assim como o é, p.ex., a boa capinagem dos terrenos cultivados com cafeeiros. E uma progrssiva substituição das plantas mais antigas por outras mais modernas e produtivas.

Vem tudo isto a propósito da adesão de Timor Leste à Organização Internacional do Café, com sede em Londres, no início deste ano.


No 'site' desta organização internacional que "superintende" sobre o mercado internacional de café, há muita informação quer sobre as suas actividades --- que inclui apoio técnico aos países dele necessitados --- quer sobre o mercado internacional do café, particularmente a evolução do preço internacional da bebida.
O último relatório tem a data de Fevereiro passado e dá conta, nomeadamente, de uma expectativa de aumento do preço do café em 2009 devido à combinação de dois efeitos: por um lado, uma baixa da produção em alguns dos exportadores devido a más condições climatéricas e, por outro lado, a manutenção do nível da procura já que se entende que esta é relativamente rígida e, por isso, não susceptível de ser significativamente afectada pela crise mundial. Não há crise que nos faça passar sem a "bica"...

"Em fevereiro os preços do café pouco se alteraram, e a média mensal do preço indicativo composto da
OIC registrou 107,60 centavos de dólar dos EUA por libra-peso, em comparação com 108,39 centavos em
janeiro de 2009. Os preços dos Suaves Colombianos e dos Outros Suaves prosseguem firmes, confirmando
que, devido a problemas climáticos e estruturais, as atuais safras da Colômbia, América Central e Índia estão
menores do que as estimativas iniciais indicavam. Em conseqüência, os prêmios pagos pelo pronto embarque
de café desses países têm aumentado, ampliando a arbitragem com os preços dos Robustas.
O comportamento de curto prazo dos preços do café nas bolsas de futuros de Nova Iorque e Londres, porém, continua a ser influenciado pelo fraco desempenho das principais bolsas de valores e instrumentos financeiros.
Em termos dos fatores fundamentais do mercado cafeeiro, as perspectivas continuam as mesmas. A
disponibilidade no ano cafeeiro de 2008/09 é suficiente para satisfazer a demanda. Durante 2009/10, porém,
o equilíbrio oferta/demanda deve transformar-se em déficit, devido à redução da produção global decorrente
do ano de baixa do ciclo produtivo brasileiro. Ao mesmo tempo, não se prevê que a demanda de café seja
afetada significativamente pela crise econômica mundial. Além disso, nos países produtores os estoques
caíram para seus níveis mais baixos desde que registros começaram a ser mantidos. É provável que no médio
prazo esses fatores contribuam para a sustentação do mercado, e prevê-se um fortalecimento dos preços à
medida que o ano avança.
"

A adesão à OIC-Organização Internacional do Café é um bom sinal quanto ao interesse que, aparentemente, o Governo de Timor Leste coloca na melhoria do sector que, se excluirmos o petróleo, é a única fonte de rendimentos (de exportação) do país e, principalmente, de uma parte importante da sua população nas zonas de produção.
Esse interesse, sabe-se, tem sido manifestado ao mais alto nível do Estado. A Missão Agrícola portuguesa em Timor Leste, apoiada na rectaguarda por outros organismos públicos portugueses, pode vir a dar uma ajuda preciosa na renovação dos cafeeiros de Timor de modo a melhorar significativamente a quantidade e a qualidade produzida.

segunda-feira, 16 de março de 2009

9ª Conferência de Doadores de Timor Leste

Vai realizar-se entre 1 e 4 de Abril próximos, em Dili, a 9ª Conferência de Doadores de Timor Leste.
Ela surge num contexto em que os doadores, nomeadamente os pertencentes à OCDE, procuram desde há algum tempo aumentar a coordenação entre as suas acções e as acções de outros país --- além, naturalmente, de aumentarem a coordenação com os programas de desenvolvimento dos países beneficiários, neste caso Timor.
A procura pela crescente "harmonização" das políticas de cooperação dos doadores em benefício crescente da eficácia dessa ajuda já vem de longe mas encontrou o seu ponto alto, em termos de decisões dos países da OCDE, na chamada "Declaração de Paris", de 2005 (vejam-se abaixo --- clicar para aumentar --- as duas primeiras páginas; na primeira está o link para o documento):


Já com o espírito de preparação da Conferência a realizar em Abril, realizou-se em fins de Outubro passado, na Universidade da Coruña e com o apoio da Cooperação Espanhola, uma conferência que procurou cimentar ainda mais os laços de harmonização de políticas e de actuações concretas no terreno entre os países europeus mais envolvidos na cooperação com Timor Leste. Lá estiveram, além da Espanha, Portugal, a Alemanha, a Suécia e outros, incluindo representantes da Comissão Europeia.
Presente esteve também o governo timorense através de três dos seus membros (Ministras da Justiça e da Solidariedade Social e o Ministro da Agricultura). Presente ainda um grupo de representantes de ONGs timorenses.



Dos trabalhos pareceu evidente a facilidade de diálogo entre os dois países ibéricos para concertarem as suas acções em benefício de Timor Leste. Esta facilidade de entendimento entre portugueses e espanhóis não será tão grande nos demais casos bilaterais ou multilaterais mas foi nítida a boa vontade em dar passos no sentido correcto.
Esperemos que a conferência de Dili confirme esta convergência de vontades a bem de uma cooperação mais eficaz e a redução dos desperdícios de recursos que, por vezes, se verificam.

Uma das sessões do plenário com representantes das agências de cooperação
de vários países da União Europeia

O Reitor da UNTL, Prof. Benjamim de Araújo Corte-Real, lê as conclusões de uma das sessões temáticas. Ao centro o Presidente do Instituto Português para o Apoio ao Desenvolvimento (IPAD) e à direita a Ministra Maria Domingas "Micató"

Uma palavra final para uma "leitura" mais política da realização da conferência: tratou-se manifestamente (até pelo esforço financeiro feito), de uma afirmação explícita da vontade da Espanha de que de ora em diante é necessário contar também com ela na cooperação com Timor Leste. O "recado" foi evidente: "estamos nessa! E contem connosco!..."
Esta posição enquadra-se na manifesta estratégia de afirmação internacional da Espanha como um parceiro com que há que contar no futuro na cena internacional, a par de uma França, uma Inglaterra ou, mesmo, de uma Alemanha. É evidente que o "campeonato" deles é este e não já o dos médios países europeus, como a Itália, por exemplo. Resta saber se a crise económica que agora a afecta não fará adiar por algum tempo esta ambição...

Mas como naqueles azulejos que figuram em muitas casas portuguesas: "Seja bem-vindo quem vier por bem!"

segunda-feira, 9 de março de 2009

Voltando ao assunto...

... da 'entrada' anterior, relembre-se o facto de a certa altura termos salientado que estranhámos não ver no comunicado sobre a reunião do Conselho de Ministros qualquer referência a uma das políticas mais importantes: a do comércio internacional. É impensável que ela não tenha sido abordada.

Relendo um texto do próprio Prof. Haziz Pasha demos com esta passagem (eliminámos uma parte menos interessante):

“TRADE AND INDUSTRIAL POLICY
Flushed with high and rapidly increasing oil revenues, the government has opted to give substantial tax breaks. This includes an across-the-board reduction in the standard rate of import duty from 6% to only 2.5%. While this may stimulate imports and reduce the component of imported inflation, it raises the fundamental issue of whether Timor-Leste has liberalized 'too much, too soon'.
(…)
(…) the move towards a near zero import tariff regime is likely to have a major negative impact on the future prospects of industrialization in the country.
The case for some protection to industry in Timor-Leste is enhanced by the fact that given the small size of the domestic market the scope for realizing economies of scale is very limited. This places potential local manufacturers at a significant disadvantage in relation to imports from, say, a large neighbor like Indonesia or from China.”


Sintetizemos em português: "inundado" com o dinheiro do petróleo, o Governo decidiu reduzir significativamente os impostos, nomeadamente as taxas alfandegárias. Esta política estimulará as importações e levanta a questão de se saber se não se terá "liberalizado demasiado e cedo demais".
É evidente a opinião do autor sobre este assunto quando diz que tal medida pode ter um importante impacto negativo sobre as perspectivas de industrialização do país. E, acrescento eu, quem limita estas perspectivas limita também a capacidade de criar empregos.
A "desprotecção" em que os (potenciais) empresários timorenses ficam resulta da significativa desvantagem relativamente às importações --- bem mais baratas, até pelas 'economias de escala' existentes nesses países --- provenientes de países como a Indonésia e a própria China.

Para tentar remediar a situação sugere-se:

". Uniform Protection: In line with, the ‘infant economy’ argument a uniform tariff be levied of, say, 10%, on all imports, with the exception of imports of food items and capital goods.
. Feasibility Studies:
Detailed micro studies be undertaken by the Ministry of Economy and Development, possibly with help of consultants, to identify small and medium-scale enterprises that can be developed in Timor-Leste, with private sector participation and selective targeting of credit (through the creation of a public sector National Development Bank) and other inputs."


Isto é: sugere-se a fixação de uma taxa aduaneira base de 10% para todas as importações ("com excepção de bens alimentares e de capital") e a realização de um conjunto de estudos que permitam identificar sectores que possam ser desenvolvidos graças ao apoio a pequenas e médias empresas (por exemplo, a concessão de crédito em condições privilegiadas através de um Banco de Desenvolvimento a criar).

Clap! Clap! Clap!

Note-se que a criação de um banco deste tipo, de "fomento nacional" como se chamava o correspondente em Portugal, tem sido objecto de muitas críticas por parte de muitos autores devido à facilidade com que instituições similares têm sido "manipuladas" politicamente --- financiar os amigos e os amigos dos amigos, principalmente os que são mais "liberais" quanto às formas e níveis de "agradecimento"... --- e ao facto de muitos deles se terem tornado em verdadeiros "cancros" dos sistemas bancários dos seus países.
O que há que decidir é se isso é razão suficiente para pôr de parte a hipótese da sua criação ou se se deve avançar mas tendo o cuidado de, pelo menos num período inicial mais ou menos alargado e face à falta de quadros nacionais capazes de colocar de pé uma instituição deste tipo, séria, se deve procurar uma alternativa credível; por exemplo, a associação a uma entidade especializada estrangeira que se responsabilize pelo essencial da gestão do novo banco durante os primeiros anos da sua actividade. Um pouco à semelhança do que aconteceu com a ABP e que parece ter dados bons resultados.
Cremos que esta pode ser uma boa alternativa.

domingo, 8 de março de 2009

Bons conselhos, conselhos assim-assim e (alguns) maus/menos bons conselhos...

É conhecida de todos que, muito provavelmente, a principal lacuna de Timor Leste em termos dos "ingredientes" com que se "cozinha" o desenvolvimento é a falta de capital humano --- leia-se "pessoal tecnicamente qualificado em quantidade e em qualidade e nas mais diversas áreas do conhecimento científico e técnico, incluindo nas suas aplicações práticas".

A "desgraça" é mais ou menos uniforme na grande maioria das referidas áreas mas uma das mais importantes para assegurar um processo equilibrado de desenvolvimento é a falta de quadros técnicos qualificados quer sob o ponto de vista académico quer sob o ponto de vista da prática na área económica. A meia-dúzia (tantos?!...) de nomes que poderia indicar e que constituem o "crème de la crème" do país nesta área são apenas as excepções que confirmam a regra.

Por isso é tão importante o papel dos técnicos estrangeiros que, de uma forma mais permanente ou apenas esporadicamente, com longo conhecimento da economia e da sociedade timorenses ou com pouca experiência destas, colaboram com Timor Leste.

Vem isto a propósito do último comunicado do Conselho de Ministros em que se dá conta da presença, numa sua reunião do passado dia 4, do Prof. Haziz Pasha, do Paquistão, académico e economista "prático" conhecido no seu país e na Ásia por ter desempenhado funções dirigentes no escritório regional do PNUD, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, e ter sido Ministro das Finanças.

Tive a oportunidade de conversar com ele sobre alguns aspectos da economia de Timor Leste e, depois, de assistir a uma conferência pública que ele deu no ginásio da Universidade. Desta última e de um ou outro aspecto de um relatório não publicado que ele elaborou é dada conta na edição de Setembro da Newsletter publicada pelo escritório do UNDP em Dili. As imagens abaixo são dessa publicação e por elas se pode tomar conhecimento do essencial das sugestões que ele deu após uma visita de muito curta duração (clique na imagem para a aumentar e tornar legível o texto --- em inglês).


Não é este o local para comentar, ponto por ponto, os aspectos referidos mas permito-me salientar 2 ou 3 pontos (de natureza diferente) que chamaram a minha atenção.

Sem que tal ponha em causa o CV do Prof. Pasha e as suas qualidades técnicas e humanas --- era o que faltava!... --- chamou a minha atenção um aspecto de que ele não tem qualquer "culpa no cartório", antes sendo da responsabilidade do UNDP e da ONU em geral: a "mania" de que levar ao país A ou B um nome "sonante" durante uma semana ou dez dias é relevante para o futuro do país. Por melhor que seja o técnico convidado dificilmente pode ir além da superfície dos problemas, correndo o risco de muitas das suas recomendações serem um conjunto de ideias "déjà vu" e/ou mais ou menos do tipo "elementar, meu caro Watson!...". Mais uma vez: o que fica dito não põe em causa a contribuição do Prof. Pasha, antes sendo uma chamada de atenção do leitor mais desprevenido para uma prática (da ONU e suas agências) que nos parece pouco produtiva. As prateleiras dos ministérios de vários países estão cheias de relatórios destes consultores que muitas vezes nem são lidos... por quem os saiba ler.

Uma outra consequência desta metodologia é a de que (acredito eu) por vezes o que transparece para o público não reflecte inteiramente o que se passa nas conversas no aconchego de quatro paredes. Não estou a dizer que é este o caso presente mas, "penso eu de que", é natural que haja sempre algum cuidado por parte deste tipo de convidados especiais em, nomeadamente em público, não parecer mal educado em casa de quem nos convida... Além de que é também natural que em certos comunicados de imprensa se "esqueçam" de citar alguns aspectos mais "críticos" dos conselhos dados.

Tudo isto não impede que, dada a generalidade com que muitas das ideias são apresentadas, eu esteja de acordo com uma grande parte do que o Prof. Pasha defente. Mas isso, exactamente devido à sua generalidade, não é grande coisa... Provavelmente a esmagadora maioria dos leitores estarão também de acordo em que é necessário desenvolver mais o sector privado, em que há que procurar alcançar o essencial dos "objectivos do Milénio", etc. O "probrema" não é estar de acrodo com isto ou não. O problema é saber qual o decreto lei que tem de ser assinado para conseguir isso... Dizer que queremos ir para Roma é fácil; o difícil é apanhar a estrada certa...

Finalmente, há dois aspectos relevantes em qualquer política económica que ou não são referidos no texto ou são-no de uma forma que considero menos fundamentada --- o que poderá ser meio caminho andado para uma recomendação "desconseguida"... :-)
Um dos aspectos é o da política em relação ao comércio internacional, nomeadamente quanto às taxas aduaneiras e ao grau de protecção/desprotecção da economia nacional face às demais. No texto divulgado não há referências a este aspecto importantíssimo. Mas admito que ele foi abordado (em que sentido?) na reunião do Conselho de Ministros do passado dia 4 de Março.

Finalmente, o segundo aspecto fundamental é o da política monetária e cambial. Neste domínio é pena que o autor defenda a emissão de moeda própria por Timor Leste sem justificar minimamente (pelo menos no que foi tornado público) a sua opção. A referência ao facto de que o banco central deveria ser independente e ter os instrumentos para controlar a inflação não são mais que o receituário usual; basta ler 99,9% dos estatudos dos bancos centrais desse mundo fora, quase todos eles cópia uns dos outros neste domínio. No limite, os estatutos da ABP dizem pratiamente isso mesmo... So what?
Mas... se a inflação num país for fundamentalmente "importada" através dos preços das importações (incluindo os combustíveis, o arroz, etc) servirá de muito o banco central ter instrumentos de luta contra a inflação? E em Timor a inflação é essencialmente interna ou importada? Não vemos resposta a isto. E se for interna, é por "culpa" de quem? Do banco central que põe (desnecessariamente...) demasiado dinheiro a circular ou de quem passa cheques a mais por ter uma conta bancária choruda?!...

E qual a política cambial a adoptar uma vez decidida a criação de uma moeda nacional? O problema não é criar uma moeda própria e mandar imprimir uns papelinhos bonitinhos a que se dá o valor "x", "y" ou "z" mas sim dizer quanto vale essa moeda face às demais e, principalmente, dizer como "administrar" esse valor. E sobre isto... silêncio! O problema é que este assunto é tão, mas tão, importante que se deveria evitar meter "caraminholas" na cabeça das pessoas sem ter a certeza, de certezinha feita, do qual deve ser o caminho.

PS - escusado será dizer que se aplica aqui o alerta que está aí ao lado: eu sou o único responsável pelo que escrevi. Tá?