quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Mas afinal o que é a "dutch disease"? Uma correcção ao La'o Hamutuk

Na sua recente análise da proposta governamental de Orçamento Geral do Estado para 2012 a ONG La'o Hamutuk diz a certa altura:

"The “Dutch disease” of inflation, currently over 13%, exacerbates poverty in Timor-Leste"

Esta noção de "Dutch disease of inflation" não corresponde exactamente à noção que os economistas têm do fenómeno.
Uma consulta da Wukipédia permite-nos esclarecer o verdadeiro sentido do conceito de "dutch disease" e asua origem:

"In economics, the Dutch disease is a concept that purportedly explains the apparent relationship between the increase in exploitation of natural resources and a decline in the manufacturing sector. The claimed mechanism is that an increase in revenues from natural resources (or inflows of foreign aid) will make a given nation's currency stronger compared to that of other nations (manifest in an exchange rate), resulting in the nation's other exports becoming more expensive for other countries to buy, making the manufacturing sector less competitive. While it most often refers to natural resource discovery, it can also refer to "any development that results in a large inflow of foreign currency, including a sharp surge in natural resource prices, foreign assistance, and foreign direct investment".
The term was coined in 1977 by The Economist to describe the decline of the manufacturing sector in the Netherlands after the discovery of a large natural gas field in 1959"

Isto é: a "dutch disease" não é nem está ligada directamente à inflação mas sim à apreciação da moeda nacional em resultado, nomeadamente, do aumento da procura da moeda nacional com várias origens. Esta apreciação reduz a competitividade das exportações nacionais (nomeadamente de outros sectores industriais que não o petrolífero) e faz com que vários sectores exportadores comecem a ter dificuldades. Estas acabam por levar, por vezes, à falência de empresas e, como consequência, ao aumento do peso relativo do sector petrolífero face a outros sectores produtivos.

Admite-se que parte do efeito passe também pela inflação que se pode gerar na economia com o aumento significativo dos rendimentos com origem no petróleo e, claro, o seu concomitante gasto na economia nacional. Inflação significa preços mais altos para os consumidores nacionais mas também para os consumidores estrangeiros que, assim, reduzem as compras dos nossos produtos. Mas este fenómeno faz, por ventura, mais parte da "maldição dos recursos" ["resource curse"] do que da "doença holandesa".
Resultado: ainda que o conceito não esteja usado da forma mais correcta, o resultado final acaba por não ser muito diferente --- até porque, como Timor Leste não tem moeda própria, a "doença holandesa", strictu sensu, nem se pode verificar.

De facto, a inflação pode ser --- e quase inevitavelmente será... --- uma das consequências do excesso de despesa resultado daquela "maldição". O que se está a passar em 2011, em que a inflação "disparou" e dificilmente ficará abaixo dos 11% em termos de taxa média anual, aí está para o demonstrar. E uma inflação dos preços significa, para quem recebe rendimentos fixos (ex: salários, pensões), menor poder de compra. Pobreza? Sim, para alguns, pelo menos.

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Taxa homóloga de inflação em Setembro (Dili): 13,8%

Segundo dados recentemente publicados pela Direcção Nacional de Estatística, a taxa homóloga de inflação em Setembro passado (SET11 relativamente a SET10) foi de 13,8% e a taxa mensal foi de 1%, contra os 0,2% do mês anterior e os 0,3% do mês homólogo de 2010.


Segundo estimativas efectuadas com base nas taxas observadas desde o início do ano e as médias das taxas mensais de inflação dos últimos 3 meses dos anos 2003-10, a taxa média anual de inflação de 2011 poderá vir a situar-se nos 12,6%, mais do dobro do previsto pelo Governo e o FMI (6%).
A taxa de inflação acumulada desde o início do ano é de 9,7%.

Olhando para as taxas de inflação por tipos de produtos, verificamos que a alimentação, no seu conjunto, registou uma taxa homóloga de 15% em Setembro, "empurrada", entre outras, pelas taxas dos vegetais (30,4%), das frutas (46,7%) e da carne e derivados (23,1%). Os transportes aumentaram 22,7%.

Note-se que os meses finais do ano costumam mostrar alguma aceleração da inflação devido ao aumento da procura relacionada com os gastos nas "festas" do final do ano e com algumas dificuldades no abastecimento dos mercados com produtos agrícolas, alguns dos quais vêm os seus stocks diminuidos antes do início das novas colheitas.

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Timor Leste: "Doing Business 2012"

O Banco Mundial, através da sua componente IFC, acaba de publicar o relatório anual sobre "Doing business 2012". Aqui está o link para a análise de Timor Leste.

Veja abaixo um quadro síntese:


Dele se conclui que o país subiu um lugar na escala (está agora em 168º lugar). Esta subida  fica a dever-se essencialmente à melhoria na obtenção de crédito (subiu 18 lugares). O acesso à electricidade terá piorado, fazendo o país descer 16 lugares na escala respectiva.


Quanto à subrubrica "Iniciar uma actividade empresarial", o país desceu 5 lugares na escala. Note-se, por exemplo, que em Timor Leste são necessários 103 dias até que se possa iniciar a actividade e na média dos países da Ásia-Pacífico bastam 38 dias (cerca de 1/3 do tempo) e apenas 13 dias, em média, nos países da OCDE, os das economias mais avançadas.
Veja-se também a situação quanto à percentagem do rendimento per capita necessária para iniciar  a actividade: a diferença entre Timor Leste e os demais países é muito significativa, resultado, em parte, de o país ter um rendimento por indivíduo baixo.

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Obrigado, Sr. General!...

Não é do perfil deste blogue fazer referências a pessoas concretas, nomeadamente para reconhecer o seu contributo positivo para uma determinada causa. Abro hoje uma excepção para, com alguma emoção traduzida num nó na garganta, dizer apenas
"Obrigado, sr. General Taur Matan Ruak!...".

Síntese do OGE2012 (receitas e despesas)

No quadro abaixo sintetizam-se as principais informações sobre as receitas e despesas do OGE para 2012. Note-se o saldo relativamente reduzido (cerca de 500 milhões de USD) que fica para acumulação no Fundo Petrolífero. Isto é o resultado de dele ir ser retirado este ano cerca 2,4 vezes o "rendimento sustentável", resultante da aplicação da fórmula usual para o seu cálculo (3% da "riqueza petrolífera", definida como a soma do saldo do FP e do valor actualizado do petróleo/gás ainda acumulado no subsolo do Mar de Timor). Este "rendimento" é de 665 milhões e o valor do financiamento do OGE  a retirar do Fundo é de 1594 milhões de USD.

Se recuarmos ao OGE de 2011 e as previsões que fazia para o de 2012 verificamos que as despesas agora orçamentadas ultrapassam em muito as então previstas e que eram de 1300 milhões de USD; isto é, deu-se um aumento de cerca de 40%. Quanto às previsões para "retiradas" do Fundo Petrolífero passou-se dos menos de 1200 milhões para os actuais quase 1600 milhões (+ 33%).

Lembre-se que as despesas públicas orçamentadas tiveram um evolução "explosiva" nos últimos dois anos, passsando de 800 milhões em 2010 para 1300 milhões em 2011 e para 1800 milhões em 2012.
Uma parte muito significativa deste valor vai ser "escoado" para o estrangeiro através das importações associadas, nomeadamente, à construção das infraestruturas mas ainda assim vai ficar muito dinheiro no próprio país.
Ora, tememos que este não tenha uma estrutura produtiva susceptível de a sua "oferta" dar uma resposta adequada ao tão grande aumento da "procura" e que isso se traduza numa (ainda maior?) aceleração da taxa de inflação, que este ano não deverá ficar longe dos 11% (o FMI prevê agora que ela será de 10,5% e não de 6% como estimava inicialmente).
Curiosamente, não está previsto nenhuma "correcção monetária" dos salários dos funcionários públicos e das pensões. Quanto a estas diz-se que vão aumentar 9% em relação ao passado sem que se saliente que isso representa, em termos reais (de poder de compra), uma diminuição das mesmas e não um seu aumento.
O mesmo vai acontecer com os funcionários públicos, com excepção, eventualmente, de alguns que vejam alterado o seu escalão de remuneração.

Uma nota final: a Lei Orgânica do agora Banco Central de Timor Leste (BCTL) prevê que, nomeadamente devido à necessidade de controlo da inflação, haja algum tipo de articulação entre as políticas orçamental e monetária. Pelos valores apresentados para o Orçamento não parece que ela tenha existido e era importante que ela se tivesse realizado, tanto mais que o Banco Central tem relativamente poucos instrumentos de controlo da inflação. Se não for a política orçamental a "dar uma mãozinha" --- o que, pelos números apresentados, não se pode dizer que tenha acontecido agora... --- vai ser difícil controlar a (ainda maior?) subida dos preços. Mas isso só se poderá confirmar em 2012...

Post scriptum:

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

terça-feira, 4 de outubro de 2011

OGE para 2012: os números

O Governo acaba de apresentar ao Parlamento Nacional o Orçamento Geral do Estado para 2012, num total de despesas de ceca de 1,8 mil milhões de USD, uns 35% acima do de 2011. Este aumento fica a dever-se, aparentemente, principalmente ao aumento do "capital de desenvolvimento" integrado no OGE para além do que está previsto para o Fundo de Infraestruturas.
Veja aqui o site do Governo com todos os livros do OGE disponíveis.
O La'o Hamutuk, como habitual, apresenta também o essencial da informação sobre o OGE, incluindo um gráfico útil sobre a evolução dos Orçamentos desde 2002, o ano da restauração da Independência.