Já noutra ocasião falei do assunto mas como volta e meia, meia volta andam a invocá-lo como pedra de arremesso da luta política, volto ao assunto até porque quer no "discurso do Orçamento" quer na entrevista de Zacarias da Costa à LUSA o tema é abordado
Que fique claro que NÃO QUERO CONTESTAR OS DADOS (até porque, naturalmente, não tenho outros para lhos contrapor) mas apenas contextualizá-los.
A primeira nota --- e a mais importante --- para que quero chamar a atenção é a de que estes inquéritos são "fotografias" e não "filmes" pois comparam uma situação num momento com outra situação noutro momento, não dando indicações científicas inequívocas sobre o que se passou no intervalo entre os dois momentos (o "filme"). É como as fotografias dos bilhetes de identidade: quando o vamos renovar parece que "aquele" não somos nós.
A segunda nota é a de que estes inquéritos sobre a situação das famílias são "obrigatoriamente" (por decisão do Banco Mundial e de mais ninguém) realizados a cada 5 anos. Ora, tendo o anterior sido realizado em 2001 este deveria ter sido realizado em 2006. Aliás, começou a sê-lo mas teve de ser interrompido por razões que todos conhecemos.
Tive oportunidade de participar numa sessão de apresentação do inquérito, ainda em 2005, e logo ali chamei a atenção para o facto de, sabendo-se que a situação económica se tinha deteriorado em consequência da saída da ONU, não era necessário ser bruxo para adivinhar que a taxa de pobreza deveria ter aumentado.
Mais, chamei a a tenção para o facto de que, face a isto e sabendo-se que estavam previstas eleições para 2007, a publicação dos resultados iria ser, contrariamente ao que normalmente se pretende, um instrumento de luta política.
Como se sabe, o essencial do inquérito foi realizado já em 2007 e não me enganei quanto ao seu uso como arma política --- ainda que pós-eleições.
Mas... e o que dizer dos resultados? Dada a metodologia utilizada é provável que estejam perto da realidade. Porém, o diferencial em relação ao inquérito anterior parece-me algo exagerado. Como é que isso é possível? É se considerarmos que no inquérito anterior a taxa estava subavaliada --- como creio que estava. Isto é, eventualmente devido a erros de metodologia, a percentagem de pobres seria então maior que a que foi "medida" pelo inquérito de 2001. Quem, já nessa altura, andava pelas montanhas do país "pressentia" isso.
Uma última nota relacionada com tudo o que está escrito acima: se o inquérito tivesse sido efectuado em 2006 --- se este ano não tivesse conhecido a balbúrdia que conheceu (para este efeito é indiferente quais os "culpados") --- e não em 2007 os resultados teriam sido diferentes? Creio que sim. E creio que sim porque em 2005 foi possível à economia atingir uma taxa de crescimento "engraçada", de 6,2% (produto não-petrolífero) depois de no ano anterior ter sido de 4,2% (dados do último relatório do FMI realizado ao abrigo do Artº IV dos seus Estatutos, publicado em Junho passado, reproduzidos abaixo).
O que se passou nos anos de 2002 a 2005 (e 2006, claro) faz parte do "filme" mas não é objecto de tratamento específico nestes inquéritos. Por isso eles são "fotografias" que, se tiradas em "dia de vendaval" como esta foi, mostra as personagens com os cabelos todos em pé! O que não quer dizer que 1 hora antes não estivessem todos penteadinhos, com risca ao meio ou à esquerda...
Apesar daquele aumento do produto/rendimento é possível que mesmo assim um inquérito feito numa época "normal" mostrasse alguma subida do nível de pobreza por dois motivos principais: melhoria da metodologia e, com ela, melhor "medição" da situação, por um lado, e um agravamento, creio que indesmentível por quase todos, da situação nas zonas rurais apesar de alguma melhoria nas cidades, particularmente em Dili.
Onde quero chegar com tudo isto? Apenas à conclusão de que nunca devemos "comprar" nada --- nomeadamente estatísticas --- pelo seu valor facial. É ESSENCIAL compreender os fenómenos e usar as estatísticas conhecendo os seus "pros and cons" para não estarmos a engolir gato por lebre... Até porque --- e já o disse--- tanto fico preocupado com uma taxa de 40% de probreza como com uma de 50%!... As políticas económicas a implementar para corrigir uma ou outra não são, no fundo, diferentes.
Sem comentários:
Enviar um comentário