quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Notas soltas sobre o OGE2010 - 1

Há alguns dias atrás um amigo desafiava-me a tecer alguns comentários sobre o OGE2010 "olhado" na perspectiva da luta contra a pobreza. Tarefa difícil quando os Orçamentos não são construídos dentro dessa lógica e quando, sejamos honestos, não existe um receituário concensual sobre o que fazer (e o que fazer em primeiro lugar...) na luta contra a pobreza.
Confesso que, por ter outras tarefas inadiáveis entre mãos, não tive tempo de espreitar os números do Orçamento com o cuidado que se exige para uma análise deste tipo.
Por isso acabei por dar apenas duas ou três ideias sobre o assunto.

Uma delas é a de que a luta contra a pobreza se faz HOJE com, nomeadamente, a criação de infraestururas rurais que permitam às pessoas e aos bens circularem com mais facililidade e com a criação de empregos nas zonas mais pobres, as zonas rurais de Timor Leste. Esses empregos podem ser (devem ser?) adaptados às condições locais, em que as qualificações da mão de obra não são muito grandes e muita gente vive NA e DA agricultura.
Por isso esquemas de apoio ao desenvolvimento da agricultura e de comercialização dos produtos agrícolas serão sempre benvindos. Tal como a construção de infraestruturas, sejam elas escolas, postos de saúde ou estradas, por exemplo.
Isto é, a luta contra a pobreza deve insistir principalmente na criação de mecanismos de emprego --- "dinheiro contra trabalho" --- e não em mecanismos do tipo redistributivo, assistênciais. Estes devem ser reservados apenas àquela camada da poplação que, por mais idosa ou por outras razões, não pode assegurar a sua subsistência a um nível considerado como mínimo.
Mas mesmo aqui é necessário ter-se em atenção que a tradição europeia do "Estado Social", redistributivo, não é partilhada por todo o mundo, nomeadamente na maioria dos países asiáticos.
Nesta perspectiva, Timor Leste, com o seu sistema de pensões, está algo fora do que é mais usual na região, o que, se para uns é valorado positivamente para outros será olhado com alguma desconfiança até pelas responsabilidades permanentes a que obriga o Estado hoje e no futuro.

Mas o que mais me preocupa é a luta contra a pobreza AMANHÃ (ou melhor e se quiserem, a pobreza DE AMANHÃ).
Esta tem como instrumento poderosíssimo a educação e todo o tempo que se perca hoje dificilmente será recuperado no futuro pois a reprodutividade dos investimentos nesta área só se sente a mais longo prazo.
Ora, experimentei espreitar os valores previstos para seren gastos na educação e compará-los com os de outros países. Alerto, no entanto, para o facto de poder, eventualmente, estar a comparar dados que não são estritamente comparáveis... mas que são os que tenho à mão.

Assim, o OGE2010 prevê um orçamento para o Ministério da Educação (64 milhões USD) que representa cerca de 10% do Orçamento global (637 milhões). A estes gastos poderão adicionar-se os quase 30 milhões a serem suportados pelos doadores (quase mais 50% do orçamento do Ministério, o que é uma percentagem importante). Se somarmos estes dois valores (94 milhões) e compararmos com a soma do OGE e das despesas a serem suportadas pelos doadores) 198 milhões) nas mais diversas áreas e nos mais diversos tipos de despesas (correntes, de capital, etc) temos que as despesas de educação em relação aos gastos públicos serão de cerca de 11,3%.

E o que temos para comparar com estes valores? O último Relatório do Desenvolvimento Humano, publicado pelo PNUD, tem um quadro que nos dá aquilo que identifica como sendo as "despesas públicas em educação em percentagem do total das despesas públicas; média 2000-2007", não sabendo nós como são exactamente calculadas umas e outras. Porém, se suposermos que não é usada uma metodologia muito diferente da que usámos (que, concordamos, é muito simples e eventualmente enganadora), então poderemos comparar os valores acima calculados para Timor Leste --- infelizmente o quadro referido não tem valores para o país --- com os de outros países para tentar medir o "esforço" que Timor Leste está a fazer na educação e se ele se aproxima ou não do que poderíamos designar como um "padrão", média, internacional.

O quadro referido diz-nos, por exemplo, que o Camboja gasta 12,4% do seu orçamento (média de 2000 a 2007) na educação, que o Banglasdesh gasta 14,2%, a Indonésia 17,2%, as Filipinas 15,2% e a Tailândia 25%.
Isto é: a confirmar-se o valor de 10-12% para Timor Leste ele parece ser baixo pelo padrão da região. De onde concluo que há que fazer um esforço MUITO grande para aumentar esta percentagem de gastos na educação, principamente para melhorar a qualidade da educação hoje em dia prestada pelas superlotadas escolas do país.
Só assim se poderá apostar no futuro e reduzir, a prazo, a pobreza, já que a educação é, está demonstrado, um poderoso instrumento de ascenção na escala dos rendimentos e na escala social.

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