Através do blog TimorLorosaeNação tive conhecimento de declarações do Primeiro Ministro Xanana Gusmão prestadas ao Jornal Nacional - Semanário e publicadas a 29 de Agosto passado.
Nele se abordam vários aspectos da vida de Timor Leste nos dez anos que decorreram sobre a data do referendo de 1999. Chamou-me particularmente a atenção para a frase que fica transcrita abaixo:
"O mesmo [governante] também falou do programa do governo da AMP sobre as bolsas de estudos aos jovens que vão estudar na indonésia, nas Filipinas e noutros países. O governo acha que este programa ainda não é suficiente."
A propósito desta política lembrei-me de que Angola, tinha ela cerca de dez anos também, fez uma opção diferente da que parece ter tomado Timor Leste: em vez de enviar muitos estudantes para fora contratou algumas centenas de professores (portugueses) e levou-os para ensinarem no terreno, em Angola.
O programa chegou a ter uma tal dimensão que mais ou menos na época em que em Portugal eram divulgados os resultados das colocações dos professores nas escolas do ensino secundário (Setembro-Outubro), o Ministério da Educação de Angola enviava para Lisboa uma equipa de selecção para captar aqueles professores que quisessem ir leccionar para aquele país.
Eu próprio cheguei a estar a um (pequeníssimo) passo de ir leccionar para a Universidade Agostinho Neto, não se tendo concretizado a minha ida por entretanto terem alterado as disciplinas que eu tinha acordado ir leccionar.
Mas o que interessa é que estamos aqui perante dois modelos "alternativos" (veja-se mais abaixo umas reticências a esta característica de "alternativa"): levar os estudantes para outro país, para um ambiente de trabalho que lhes é estranho, ou trazer os docentes aos alunos e impulsionar, assim, a qualidade do ensino no próprio país.
Não sei se o Ministério da Educação de Timor equacionou as duas alternativas e analisou devidamente os "custos e benefícios" de ambas. Mas ainda que confesse que não tenho dados que me permitam fazer essa análise, não colocaria de parte a "solução angolana". Creio, mesmo, que ela tem virtualidades sobre a melhoria da qualidade do ensino em Timor que a solução pela qual parece estar a optar-se nitidamente não tem. E o que é necessário é, parece-me, criar núcleos de "excelência" (relativa) no ensino que possam servir, pelo menos a longo prazo, de elemento de dinamização e reprodução da qualidade do ensino em Timor Leste.
Uma amiga minha, por exemplo, dizia-me que uma das maiores necessidades do ensino no país é a criação de um espírito científico, de rigor, que é normalmente associado ao ensino das ciências exactas, nomeadamente a matemática mas não só. Por isso e face às IMENSAS fraquezas neste domínio de que enferma o sistema de ensino no país (e a própria sociedade, muito propensa a "crendices" de vária natureza) sugeria a possibilidade de Timor Leste --- eventualmente com a ajuda financeira de alguns doadores --- contratar em países da região (o exemplo por ela referido era a Malásia) professores de Matemática e de Ciências Naturais que ajudassem, em contacto directo com algumas centenas/milhares de alunos, a desenvolver o referido espírito de rigor que tanta falta faz num sistema de ensino e na sociedade em geral.
Numa altura em que se fala na "replicação" parcial da Escola Portuguesa de Dili noutros distritos, a adopção desta política de trazer mais professores para ensinarem directamente aos alunos do ensino secundário poderia ser vista como uma "alternativa" (ou um complemento) ao envio de tantos bolseiros para fora do país.
Claro que não me esqueço de que as bolsas que estão/vão ser dadas são para estudantes universitários e a solução aqui proposta é principalmente para o ensino secundário. Por isso a sugestão não é um verdadeira alternativa mas sim, principalmente, um complemento. Porém, não vejo porque esta alternativa não pode ser aplicada também ao ensino superior: levar para lá docentes capacitados em vez de enviar (tantos) alunos para o exterior. Quais os custos e benefícios de uma e outra solução?
Finalmente, é também para mim claro que (i) o essencial é estudar o assunto e depois tomar uma decisão com base em dados o mais objectivos possível; (ii) a opção de levar para Timor docentes tem também dificuldades no que toca à adaptação destes e (iii) esta solução não pode ser estendida a todas as escolas, o que irá criar algum grau de diferenciação entre estudantes no país. E o sistema de bolsas não faz o mesmo? E o que é melhor: deixar generalizar o ensino de fraca qualidade ou criar, no país, núcleos de qualidade que possam, ao longo do tempo, "reproduzir-se" e alterar o sistema a longo prazo? Como dizia o "outro": "é necessário criar um, dois três, muitos Vietnames...".
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