quarta-feira, 27 de agosto de 2008

As "más ideias" e o caso de Timor Leste

Abaixo referimos a existência de algumas "más ideias" em relação ao desenvolvimento. Vejamos algumas considerações sobre várias delas no caso de Timor Leste:

· Subsidiar a energia excepto em casos muito específicos e dirigidos a sectores altamente vulneráveis da população.
[AS; Timor Leste] Um exemplo é o caso do querosene, de preferência apenas para as famílias mais pobres. Porém, dada a necessidade de proteger o meio ambiente reduzindo ao mínimo dos mínimos o uso de lenha como combustível, é aceitável que o eventual subsídio ao querosene seja universal, i.e., seja acessível a todos e não apenas aos mais pobres.
Este subsídio é mais aceitável que o actualmente concedido ao arroz, podendo haver substituição total ou parcial de um pelo outro.


· Lidar com o nível elevado de desemprego utilizando a Função Pública como “empregador de último recurso”. Isto é diferente dos programas de obras públicas tais como esquemas rurais de emprego, que podem constituir uma rede de segurança social importante
[AS; Timor Leste] Já muitas vezes falei da “solução indonésia” em termos de mercado de trabalho, constituída essencialmente pela tendência a empregar na Função Pública mais gente do que a necessária. Esta “solução” está, temo, a ser aplicada, não havendo esforços suficientes para melhorar a produtividade dos trabalhadores, antes preferindo-se a esta o aumento do número de funcionários mesmo que depois estejam (por vezes muito) sub-aproveitados.

· Impor controlos de preços para travar a inflação, a qual é muito melhor defrontada através de outras políticas macroeconómicas
[AS; Timor Leste] Incluímos neste grupo de medidas o controlo indirecto dos preços através da concessão de subsídios. Como se diz aqui e já se referiu oportunamente, a inflação é melhor combatida com outras medidas de carácter macroeconómico, nomeadamente uma maior disciplina orçamental (e sua coordenação com o Banco Central) e a concessão de apoios à produção em vez de ao consumo.

· Ignorar as questões ambientais nos estádios iniciais de crescimento com o argumento de que se trata de um “luxo insustentável” [para o país]
[AS; Timor Leste] Será, talvez, abusivo e pouco exacto dizer que as autoridades consideram a protecção ambiental um luxo mas a verdade é que, objectivamente, não têm tido efeitos visíveis os esforços feitos até agora.

· Medir o progresso da educação apenas pela construção de infraestruturas escolares ou, até, pela maior taxa de matrícula em vez de focar a atenção na extensão da aprendizagem e na qualidade do ensino.
[AS; Timor Leste] De há muito tempo que sou crítico (muito crítico?) em relação à forma como foram definidos os Objectivos do Milénio e, principalmente, à forma quase fundamentalista como as organizações internacionais querem “vender” o “produto” à falta de imaginação para mais. Não há, de facto, relatório que se preze que não comece de outra forma que não seja a sacrossanta ladainha do “Viva os OdM!...”.
No caso de Timor Leste e por menos “politicamente correcto” que isto possa parecer, apostar todos os trunfos no aumento da quantidade das crianças nas escolas sem que se faça um esforço (muito mais que) proporcional para melhorar a qualidade do ensino é, em boa parte, prolongar a estratégia indonésia --- e, em parte, dos próprios OdM... --- de disseminar a porcaria (ia escrevendo outra coisa mas contive-me a tempo...) em vez de apostar na muito significativa melhoria da qualidade do ensino dos que já estão no sistema (e que já são muitos). É que, não tenham dúvidas, é esta melhor qualidade, muito mais que a quantidade, que ajudará a fazer da próxima geração de timorenses cidadãos mais úteis ao seu país... e a si próprios.
Esta é uma opção estratégica que tem de ser tomada agora devido ao enorme período de tempo que o sistema de ensino leva a produzir efeitos.
Já que neste domínio já se vai tarde para fazer grande coisa pelas gerações actuais, pelo menos que se preparem como deve ser as futuras gerações. Elas não perdoarão se assim não for!


· Pagar mal aos funcionários públicos (incluindo professores) comparativamente com os valores do mercado para qualificações semelhantes e combinar as baixas remunerações com promoções por antiguidade em vez de usar métodos credíveis de medição do desempenho dos funcionários e remunerá-los em função disso
[AS; Timor Leste] Pois... É tudo muito bonito mas... e de quem é a culpa, em Timor Leste, da enorme distorção do mercado de trabalho? Da ONU e das ONGs que por aqui estão e que, apesar de dizerem que Timor Leste é pouco competitivo face ao vizinho do lado (a Indonésia) e que isso dificulta a absorção do desemprego, são os primeiros a pagar salários pelo menos 2 a 3 vezes superiores ao que o Estado Timorense pode pagar para funções semelhantes.
O que, naturalmente, levanta uma questão fundamental: a da concorrência (desleal) entre as entidades internacionais e as nacionais pela contratação de pessoal com um mínimo de qualificações para desempenharem tarefas mais exigentes, deixando o Estado à míngua de bons quadros. E depois queixam-se que este não é capaz de bem desempenhar as suas funções.


· Permitir a excessiva apreciação da taxa de câmbio antes que a economia esteja pronta para a transição para níveis mais elevados de produtividade, nomeadamente da indústria.
[AS; Timor Leste] Isto articula-se com vários aspectos que já referimos aqui, particularmente à crítica de que (e não é só opinião nossa) o país, com a recente reforma fiscal, “se abriu demasiado e demasiado cedo” (“too much and too soon”). Deus queira que não dê para o torto e que a “teoria da banheira” não se verifique.
Outro aspecto que está aqui em causa é o da pouca atenção que parece estar a merecer de quem de direito a necessidade de fazer baixar a taxa de inflação.

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