Em Janeiro deste ano a publicação Energy & Metals Consensus Forecasts indicava como média para as estimativas de várias fontes para o preço do petróleo (WTI) em Junho passado o valor de 83,79 USD/barril. A estimativa máxima era de 95 USD/barril e a mínima de 70 USD/barril.
A realidade, porém, situou-se muito para além destas estimativas e a média do preço efectivo do mês de Junho passado foi de 133,32 USD/barril. Cerca de 60% acima da média das estimativas e quase 50% acima da mais alta!
Já agora adientem-se as estimativas (de Janeiro passado) para Setembro e Dezembro deste ano: 82,89 e 80,89 USD/barril. Onde eles já vão!...
A médio prazo, a estimativa era de que o crude atingisse os cerca de 74,6 USD/ barril em Junho de 2010, com estimativas extremas ainda mais divergentes que as anteriores: 97,75 de máximo e... 50 USD/barril de mínimo! Era bom, não era?
O preço de hoje foi de 115,59 USD/barril.
Blog sobre Economia e Política Económica do Desenvolvimento, em particular sobre a economia de Timor Leste e aquilo que naquelas pode ser útil ao desenvolvimento económico deste país
sexta-feira, 29 de agosto de 2008
quarta-feira, 27 de agosto de 2008
As "más ideias" e o caso de Timor Leste
Abaixo referimos a existência de algumas "más ideias" em relação ao desenvolvimento. Vejamos algumas considerações sobre várias delas no caso de Timor Leste:
· Subsidiar a energia excepto em casos muito específicos e dirigidos a sectores altamente vulneráveis da população.
[AS; Timor Leste] Um exemplo é o caso do querosene, de preferência apenas para as famílias mais pobres. Porém, dada a necessidade de proteger o meio ambiente reduzindo ao mínimo dos mínimos o uso de lenha como combustível, é aceitável que o eventual subsídio ao querosene seja universal, i.e., seja acessível a todos e não apenas aos mais pobres.
Este subsídio é mais aceitável que o actualmente concedido ao arroz, podendo haver substituição total ou parcial de um pelo outro.
· Lidar com o nível elevado de desemprego utilizando a Função Pública como “empregador de último recurso”. Isto é diferente dos programas de obras públicas tais como esquemas rurais de emprego, que podem constituir uma rede de segurança social importante
[AS; Timor Leste] Já muitas vezes falei da “solução indonésia” em termos de mercado de trabalho, constituída essencialmente pela tendência a empregar na Função Pública mais gente do que a necessária. Esta “solução” está, temo, a ser aplicada, não havendo esforços suficientes para melhorar a produtividade dos trabalhadores, antes preferindo-se a esta o aumento do número de funcionários mesmo que depois estejam (por vezes muito) sub-aproveitados.
· Impor controlos de preços para travar a inflação, a qual é muito melhor defrontada através de outras políticas macroeconómicas
[AS; Timor Leste] Incluímos neste grupo de medidas o controlo indirecto dos preços através da concessão de subsídios. Como se diz aqui e já se referiu oportunamente, a inflação é melhor combatida com outras medidas de carácter macroeconómico, nomeadamente uma maior disciplina orçamental (e sua coordenação com o Banco Central) e a concessão de apoios à produção em vez de ao consumo.
· Ignorar as questões ambientais nos estádios iniciais de crescimento com o argumento de que se trata de um “luxo insustentável” [para o país]
[AS; Timor Leste] Será, talvez, abusivo e pouco exacto dizer que as autoridades consideram a protecção ambiental um luxo mas a verdade é que, objectivamente, não têm tido efeitos visíveis os esforços feitos até agora.
· Medir o progresso da educação apenas pela construção de infraestruturas escolares ou, até, pela maior taxa de matrícula em vez de focar a atenção na extensão da aprendizagem e na qualidade do ensino.
[AS; Timor Leste] De há muito tempo que sou crítico (muito crítico?) em relação à forma como foram definidos os Objectivos do Milénio e, principalmente, à forma quase fundamentalista como as organizações internacionais querem “vender” o “produto” à falta de imaginação para mais. Não há, de facto, relatório que se preze que não comece de outra forma que não seja a sacrossanta ladainha do “Viva os OdM!...”.
No caso de Timor Leste e por menos “politicamente correcto” que isto possa parecer, apostar todos os trunfos no aumento da quantidade das crianças nas escolas sem que se faça um esforço (muito mais que) proporcional para melhorar a qualidade do ensino é, em boa parte, prolongar a estratégia indonésia --- e, em parte, dos próprios OdM... --- de disseminar a porcaria (ia escrevendo outra coisa mas contive-me a tempo...) em vez de apostar na muito significativa melhoria da qualidade do ensino dos que já estão no sistema (e que já são muitos). É que, não tenham dúvidas, é esta melhor qualidade, muito mais que a quantidade, que ajudará a fazer da próxima geração de timorenses cidadãos mais úteis ao seu país... e a si próprios.
Esta é uma opção estratégica que tem de ser tomada agora devido ao enorme período de tempo que o sistema de ensino leva a produzir efeitos.
Já que neste domínio já se vai tarde para fazer grande coisa pelas gerações actuais, pelo menos que se preparem como deve ser as futuras gerações. Elas não perdoarão se assim não for!
· Pagar mal aos funcionários públicos (incluindo professores) comparativamente com os valores do mercado para qualificações semelhantes e combinar as baixas remunerações com promoções por antiguidade em vez de usar métodos credíveis de medição do desempenho dos funcionários e remunerá-los em função disso
[AS; Timor Leste] Pois... É tudo muito bonito mas... e de quem é a culpa, em Timor Leste, da enorme distorção do mercado de trabalho? Da ONU e das ONGs que por aqui estão e que, apesar de dizerem que Timor Leste é pouco competitivo face ao vizinho do lado (a Indonésia) e que isso dificulta a absorção do desemprego, são os primeiros a pagar salários pelo menos 2 a 3 vezes superiores ao que o Estado Timorense pode pagar para funções semelhantes.
O que, naturalmente, levanta uma questão fundamental: a da concorrência (desleal) entre as entidades internacionais e as nacionais pela contratação de pessoal com um mínimo de qualificações para desempenharem tarefas mais exigentes, deixando o Estado à míngua de bons quadros. E depois queixam-se que este não é capaz de bem desempenhar as suas funções.
· Permitir a excessiva apreciação da taxa de câmbio antes que a economia esteja pronta para a transição para níveis mais elevados de produtividade, nomeadamente da indústria.
[AS; Timor Leste] Isto articula-se com vários aspectos que já referimos aqui, particularmente à crítica de que (e não é só opinião nossa) o país, com a recente reforma fiscal, “se abriu demasiado e demasiado cedo” (“too much and too soon”). Deus queira que não dê para o torto e que a “teoria da banheira” não se verifique.
Outro aspecto que está aqui em causa é o da pouca atenção que parece estar a merecer de quem de direito a necessidade de fazer baixar a taxa de inflação.
· Subsidiar a energia excepto em casos muito específicos e dirigidos a sectores altamente vulneráveis da população.
[AS; Timor Leste] Um exemplo é o caso do querosene, de preferência apenas para as famílias mais pobres. Porém, dada a necessidade de proteger o meio ambiente reduzindo ao mínimo dos mínimos o uso de lenha como combustível, é aceitável que o eventual subsídio ao querosene seja universal, i.e., seja acessível a todos e não apenas aos mais pobres.
Este subsídio é mais aceitável que o actualmente concedido ao arroz, podendo haver substituição total ou parcial de um pelo outro.
· Lidar com o nível elevado de desemprego utilizando a Função Pública como “empregador de último recurso”. Isto é diferente dos programas de obras públicas tais como esquemas rurais de emprego, que podem constituir uma rede de segurança social importante
[AS; Timor Leste] Já muitas vezes falei da “solução indonésia” em termos de mercado de trabalho, constituída essencialmente pela tendência a empregar na Função Pública mais gente do que a necessária. Esta “solução” está, temo, a ser aplicada, não havendo esforços suficientes para melhorar a produtividade dos trabalhadores, antes preferindo-se a esta o aumento do número de funcionários mesmo que depois estejam (por vezes muito) sub-aproveitados.
· Impor controlos de preços para travar a inflação, a qual é muito melhor defrontada através de outras políticas macroeconómicas
[AS; Timor Leste] Incluímos neste grupo de medidas o controlo indirecto dos preços através da concessão de subsídios. Como se diz aqui e já se referiu oportunamente, a inflação é melhor combatida com outras medidas de carácter macroeconómico, nomeadamente uma maior disciplina orçamental (e sua coordenação com o Banco Central) e a concessão de apoios à produção em vez de ao consumo.
· Ignorar as questões ambientais nos estádios iniciais de crescimento com o argumento de que se trata de um “luxo insustentável” [para o país]
[AS; Timor Leste] Será, talvez, abusivo e pouco exacto dizer que as autoridades consideram a protecção ambiental um luxo mas a verdade é que, objectivamente, não têm tido efeitos visíveis os esforços feitos até agora.
· Medir o progresso da educação apenas pela construção de infraestruturas escolares ou, até, pela maior taxa de matrícula em vez de focar a atenção na extensão da aprendizagem e na qualidade do ensino.
[AS; Timor Leste] De há muito tempo que sou crítico (muito crítico?) em relação à forma como foram definidos os Objectivos do Milénio e, principalmente, à forma quase fundamentalista como as organizações internacionais querem “vender” o “produto” à falta de imaginação para mais. Não há, de facto, relatório que se preze que não comece de outra forma que não seja a sacrossanta ladainha do “Viva os OdM!...”.
No caso de Timor Leste e por menos “politicamente correcto” que isto possa parecer, apostar todos os trunfos no aumento da quantidade das crianças nas escolas sem que se faça um esforço (muito mais que) proporcional para melhorar a qualidade do ensino é, em boa parte, prolongar a estratégia indonésia --- e, em parte, dos próprios OdM... --- de disseminar a porcaria (ia escrevendo outra coisa mas contive-me a tempo...) em vez de apostar na muito significativa melhoria da qualidade do ensino dos que já estão no sistema (e que já são muitos). É que, não tenham dúvidas, é esta melhor qualidade, muito mais que a quantidade, que ajudará a fazer da próxima geração de timorenses cidadãos mais úteis ao seu país... e a si próprios.
Esta é uma opção estratégica que tem de ser tomada agora devido ao enorme período de tempo que o sistema de ensino leva a produzir efeitos.
Já que neste domínio já se vai tarde para fazer grande coisa pelas gerações actuais, pelo menos que se preparem como deve ser as futuras gerações. Elas não perdoarão se assim não for!
· Pagar mal aos funcionários públicos (incluindo professores) comparativamente com os valores do mercado para qualificações semelhantes e combinar as baixas remunerações com promoções por antiguidade em vez de usar métodos credíveis de medição do desempenho dos funcionários e remunerá-los em função disso
[AS; Timor Leste] Pois... É tudo muito bonito mas... e de quem é a culpa, em Timor Leste, da enorme distorção do mercado de trabalho? Da ONU e das ONGs que por aqui estão e que, apesar de dizerem que Timor Leste é pouco competitivo face ao vizinho do lado (a Indonésia) e que isso dificulta a absorção do desemprego, são os primeiros a pagar salários pelo menos 2 a 3 vezes superiores ao que o Estado Timorense pode pagar para funções semelhantes.
O que, naturalmente, levanta uma questão fundamental: a da concorrência (desleal) entre as entidades internacionais e as nacionais pela contratação de pessoal com um mínimo de qualificações para desempenharem tarefas mais exigentes, deixando o Estado à míngua de bons quadros. E depois queixam-se que este não é capaz de bem desempenhar as suas funções.
· Permitir a excessiva apreciação da taxa de câmbio antes que a economia esteja pronta para a transição para níveis mais elevados de produtividade, nomeadamente da indústria.
[AS; Timor Leste] Isto articula-se com vários aspectos que já referimos aqui, particularmente à crítica de que (e não é só opinião nossa) o país, com a recente reforma fiscal, “se abriu demasiado e demasiado cedo” (“too much and too soon”). Deus queira que não dê para o torto e que a “teoria da banheira” não se verifique.
Outro aspecto que está aqui em causa é o da pouca atenção que parece estar a merecer de quem de direito a necessidade de fazer baixar a taxa de inflação.
sábado, 23 de agosto de 2008
Moeda própria e política monetária
PS (pre-scriptum...) – os comentários abaixo, porque da área de actuação do banco central de Timor Leste a que me encontro ligado neste momento, exigem que chame a atenção mais uma vez para o que está escrito no “acerca de mim” aqui à esquerda: As considerações a fazer aqui são ESTRITAMENTE INDIVIDUAIS E SÓ A MIM RESPONSABILIZAM. As instituições a que tenho estado ligado profissionalmente, nomeadamente em Timor Leste, NÃO SÃO RESPONSÁVEIS pelo conteúdo deste blog. Este é determinado APENAS E EXCLUSIVAMENTE por aquilo que penso serem sãos princípios de Economia e de Política Económica”. Entendidos?
Na ‘entrada’ anterior incluímos um link para o site do Banco Central Europeu em que se referem os principais instrumentos de política monetária. É a sua utilização que será possível quando um país tem moeda própria.
No caso de Timor Leste --- como nos demais países --- os principais instrumentos seriam as “operações de open market” e as reservas mínimas a impor aos bancos comerciais.
As operações de “mercado aberto” servem para controlar a taxa de juro --- já lá vai o tempo que esta era controlada directamente; agora é-o indirectamente através destas operações ---, controlar a liquidez (disponibilidade de dinheiro) no mercado monetário e dar indicações sobre o sentido genérico da política monetária.
Sendo o dinheiro uma “mercadoria” como qualquer outra, aumentar a sua oferta através de disponibilização de mais dinheiro na economia --- p.ex., por empréstimos de muito curto, curto, ou médio prazo aos bancos --- fará baixar a taxa de juro, o que, teoricamente, facilitará os investimentos e ajudará ao acrescimento.
Movimentos de redução da oferta de dinheiro farão aumentar o seu preço, i.e, a taxa de juro. Estes aumentos provocarão um “arrefecimento” da economia, diminuindo as pressões sobre ela e, assim, a inflação.
Assim sendo, face à tendência actual de o Governo ser “despesista” provocando inflação, ao banco central não restaria outra alternativa que não fosse uma política contraccionista, utilizando os instrumentos monetários para retirar de circulação parte significativa da moeda posta a circular devido às despesas do Estado e, como isso, provocar um aumento da taxa de juro.
Mas aqui é que a “porca torce o rabo”!... O que teríamos na economia nacional era uma realidade em que o sector público (o Estado, em geral) era “despesista” porque não tinha “restrição financeira” por ter acesso ao financiamento pelo Fundo Petrolífero e o sector privado, sem outra fonte de financiamento que não fosse o sistema bancário, se defrontaria com taxas de juro elevadas que impediriam o seu normal crescimento --- o que o impediria de criar os postos de trabalho tão necessários à absorção do desemprego no país. Teríamos, portanto, uma tendência a um sector público “gordo e anafado” e a um sector privado “espirra canivetes”, “magricela, “pau de virar tripa” porque “morto à míngua” pelas elevadas taxas de juro.
Mas há mais!...
O actual sistema bancário não tem problemas de liquidez por ter acesso a poupanças dos seus depositantes e/ou por, sendo constituído basicamente por filiais de bancos estrangeiros, tem acesso a financiamentos das respectivas “casas mãe”. Mas se é assim, qual a eficácia de usar aqueles instrumentos monetários de que falámos? Pois é: reduzidíssima! Isto é: uma solução “teoricamente” perfeita poderá vir a mostrar-se uma inutilidade prática ...
Mas há mais!...
Em todo este esquema há ainda que pensar nos que procuram dinheiro para investimento e recorrem ao sistema bancário para isso. Simplificando, teremos os investidores nacionais e os investidores estrangeiros (Investimento Directo Estrangeiro).
Estes, face a uma situação de taxas de juro elevadas na moeda nacional, acabarão por optar por contrair empréstimos no exterior (nos seus países de origem, por exemplo) para investirem em Timor Leste –- o que é bom para a balança de pagamentos, “sangrada” pelo elevado nível de importações.
E os investidores nacionais? Pois... Esses serão o mexilhão... Ou têm a possibilidade de contrair empréstimos no exterior, onde a taxa de juro for mais baixa que em Timor (o que não será fácil devido à necessidade de dar garantias reais), ou estão “condenados” a ter de pagar taxas de juro internas elevadas.
Mas então teremos uma situação em que os investidores nacionais estarão em nítida desvantagem face aos investidores estrangeiros.... Nada de novo, aliás: já vi isto mesmo em Moçambique há alguns anos atrás, com os investidores nacionais (moçambicanos) a queixarem-se sistematicamente de que eram prejudicados pois os seus custos financeiros eram bem mais elevados que os das empresas estrangeiras actuando no país...
Vão pensando nisto...
Post sriptum: naturalmente que o que fica acima não esgota a questão da moeda e da política monetária em Timor Leste. Como o McArthur ao abandonar as Filipinas na Segunda Grande Guerra diremos: "Voltarei!..." (ao assunto)
Na ‘entrada’ anterior incluímos um link para o site do Banco Central Europeu em que se referem os principais instrumentos de política monetária. É a sua utilização que será possível quando um país tem moeda própria.
No caso de Timor Leste --- como nos demais países --- os principais instrumentos seriam as “operações de open market” e as reservas mínimas a impor aos bancos comerciais.
As operações de “mercado aberto” servem para controlar a taxa de juro --- já lá vai o tempo que esta era controlada directamente; agora é-o indirectamente através destas operações ---, controlar a liquidez (disponibilidade de dinheiro) no mercado monetário e dar indicações sobre o sentido genérico da política monetária.
Sendo o dinheiro uma “mercadoria” como qualquer outra, aumentar a sua oferta através de disponibilização de mais dinheiro na economia --- p.ex., por empréstimos de muito curto, curto, ou médio prazo aos bancos --- fará baixar a taxa de juro, o que, teoricamente, facilitará os investimentos e ajudará ao acrescimento.
Movimentos de redução da oferta de dinheiro farão aumentar o seu preço, i.e, a taxa de juro. Estes aumentos provocarão um “arrefecimento” da economia, diminuindo as pressões sobre ela e, assim, a inflação.
Assim sendo, face à tendência actual de o Governo ser “despesista” provocando inflação, ao banco central não restaria outra alternativa que não fosse uma política contraccionista, utilizando os instrumentos monetários para retirar de circulação parte significativa da moeda posta a circular devido às despesas do Estado e, como isso, provocar um aumento da taxa de juro.
Mas aqui é que a “porca torce o rabo”!... O que teríamos na economia nacional era uma realidade em que o sector público (o Estado, em geral) era “despesista” porque não tinha “restrição financeira” por ter acesso ao financiamento pelo Fundo Petrolífero e o sector privado, sem outra fonte de financiamento que não fosse o sistema bancário, se defrontaria com taxas de juro elevadas que impediriam o seu normal crescimento --- o que o impediria de criar os postos de trabalho tão necessários à absorção do desemprego no país. Teríamos, portanto, uma tendência a um sector público “gordo e anafado” e a um sector privado “espirra canivetes”, “magricela, “pau de virar tripa” porque “morto à míngua” pelas elevadas taxas de juro.
Mas há mais!...
O actual sistema bancário não tem problemas de liquidez por ter acesso a poupanças dos seus depositantes e/ou por, sendo constituído basicamente por filiais de bancos estrangeiros, tem acesso a financiamentos das respectivas “casas mãe”. Mas se é assim, qual a eficácia de usar aqueles instrumentos monetários de que falámos? Pois é: reduzidíssima! Isto é: uma solução “teoricamente” perfeita poderá vir a mostrar-se uma inutilidade prática ...
Mas há mais!...
Em todo este esquema há ainda que pensar nos que procuram dinheiro para investimento e recorrem ao sistema bancário para isso. Simplificando, teremos os investidores nacionais e os investidores estrangeiros (Investimento Directo Estrangeiro).
Estes, face a uma situação de taxas de juro elevadas na moeda nacional, acabarão por optar por contrair empréstimos no exterior (nos seus países de origem, por exemplo) para investirem em Timor Leste –- o que é bom para a balança de pagamentos, “sangrada” pelo elevado nível de importações.
E os investidores nacionais? Pois... Esses serão o mexilhão... Ou têm a possibilidade de contrair empréstimos no exterior, onde a taxa de juro for mais baixa que em Timor (o que não será fácil devido à necessidade de dar garantias reais), ou estão “condenados” a ter de pagar taxas de juro internas elevadas.
Mas então teremos uma situação em que os investidores nacionais estarão em nítida desvantagem face aos investidores estrangeiros.... Nada de novo, aliás: já vi isto mesmo em Moçambique há alguns anos atrás, com os investidores nacionais (moçambicanos) a queixarem-se sistematicamente de que eram prejudicados pois os seus custos financeiros eram bem mais elevados que os das empresas estrangeiras actuando no país...
Vão pensando nisto...
Post sriptum: naturalmente que o que fica acima não esgota a questão da moeda e da política monetária em Timor Leste. Como o McArthur ao abandonar as Filipinas na Segunda Grande Guerra diremos: "Voltarei!..." (ao assunto)
Agora que se começa a preparar o Orçamento/2009...
Já temos referido várias vezes que na situação actual de Timor Leste, em que o banco central não emite moeda própria e não tem, por isso, possibilidade de usar os instrumentos de política monetária (ver mais aqui; exemplo dos países da zona Euro), cabe principalmente ao Governo e à sua política fiscal/orçamental (receitas e, principalmente, despesas públicas) a tarefa principal de ajudar a controlar a inflação --- que, noutras circunstâncias, é o objectivo principal dos bancos centrais.
Dado o passado recente do país --- subida vertiginosa do valor dos orçamentos do Governo nos ---, alguns observadores pensam que está na hora de, numa procura de instrumentos que lhe permitam actuar mais sobre a economia e, em parte, contrabalançar uma certa tendência “despesista” do Governo, o banco central (em coordenação com o governo) deve encarar a hipótese de passar a emitir moeda própria, abandonando-se assim o período de utilização do dólar americano iniciado por iniciativa da UNTAET.
Independentemente do que possamos pensar sobre se se trata ou não de uma boa solução --- e basicamente oensamos que teoricamente é uma solução correcta mas que na prática até pode ser perigosa e sair-nos o tiro pela culatra... ---, há um “probleminha” neste raciocínio: é que lançar uma moeda própria é tarefa para, pelo menos, cerca de 2 a 3 anos. Ora, mesmo que a decisão de criar o “OSAN” (nome fictício, claro; “osan” é a palavra tetum para “dinheiro”) fosse tomada a curto prazo, coloca-se sempre o problema de controlar a inflação no curto-médio prazo. E aí voltamos à resposta original: terá de ser o Governo, num acto de auto-restrição, a controlar a sua tendência para expandir os gastos públicos sem cuidar dos seus efeitos inflacionistas. Que só não são maiores porque a maior parte da pressão acaba por ser feita não sobre a oferta interna mas sim sobre as importações. Mas aqui estamos caídos na “teoria da banheira” de que se falou anteriormente.
Dado o passado recente do país --- subida vertiginosa do valor dos orçamentos do Governo nos ---, alguns observadores pensam que está na hora de, numa procura de instrumentos que lhe permitam actuar mais sobre a economia e, em parte, contrabalançar uma certa tendência “despesista” do Governo, o banco central (em coordenação com o governo) deve encarar a hipótese de passar a emitir moeda própria, abandonando-se assim o período de utilização do dólar americano iniciado por iniciativa da UNTAET.
Independentemente do que possamos pensar sobre se se trata ou não de uma boa solução --- e basicamente oensamos que teoricamente é uma solução correcta mas que na prática até pode ser perigosa e sair-nos o tiro pela culatra... ---, há um “probleminha” neste raciocínio: é que lançar uma moeda própria é tarefa para, pelo menos, cerca de 2 a 3 anos. Ora, mesmo que a decisão de criar o “OSAN” (nome fictício, claro; “osan” é a palavra tetum para “dinheiro”) fosse tomada a curto prazo, coloca-se sempre o problema de controlar a inflação no curto-médio prazo. E aí voltamos à resposta original: terá de ser o Governo, num acto de auto-restrição, a controlar a sua tendência para expandir os gastos públicos sem cuidar dos seus efeitos inflacionistas. Que só não são maiores porque a maior parte da pressão acaba por ser feita não sobre a oferta interna mas sim sobre as importações. Mas aqui estamos caídos na “teoria da banheira” de que se falou anteriormente.
sexta-feira, 22 de agosto de 2008
"Más ideias"
Do relatório referido nas duas entradas anteriores respigamos também o seguinte por nos parecer com interesse para a política económica de Timor Leste:
"Os debates ajudam a clarificar as boas ideias, sujeitando-as a análise e ao debate construtivo. Mas os debates também podem ser infectados por ideias más. Isto coloca dois tipos de dificuldades aos decisores políticos. Primeiro têm de identificar as ideias más, porque propostas destas podem aparentemente parecer prometedoras. Depois, precisam de evitar que elas sejam implementadas.
Uma lista ilustrativa de “más ideias” (que apesar disso são, muitas vezes, trazidas aos debates e a que se deve resistir) é apresentada abaixo. Devemos acrescentar desde já que, tal como as nossas recomendações sobre boas políticas devem ser tomadas com as devidas cautelas e adaptações à realidade de cada país, também a nossa lista de más políticas devem ser sujeitas aos mesmos cuidados.
Há situações e circunstâncias em que pode ser justificado adoptar temporariamente algumas das políticas abaixo mencionadas mas a maior parte da evidência sugere que tais políticas implicam grandes custos e que os seus objectivos declarados --- muitas vezes bons --- são melhor prosseguidos por outros meios.
· Subsidiar a energia excepto em casos muito específicos e dirigidos a sectores altamente vulneráveis da população.
· Lidar com o nível elevado de desemprego utilizando a Função Pública como “empregador de último recurso”. Isto é diferente dos programas de obras públicas tais como esquemas rurais de emprego, que podem constituir uma rede de segurança social importante
· (...)
· Impor controlos de preços para travar a inflação, a qual é muito melhor defrontada através de outras políticas macroeconómicas
· (...)
· Ignorar as questões ambientais nos estádios iniciais de crescimento com o argumento de que se trata de um “luxo insustentável” [para o país]
· Medir o progresso da educação apenas pela construção de infraestruturas escolares ou, até, pela maior taxa de matrícula em vez de focar a atenção na extensão da aprendizagem e na qualidade do ensino
· Pagar mal aos funcionários públicos (incluindo professores) comparativamente com os valores do mercado para qualificações semelhantes e combinar as baixas remunerações com promoções por antiguidade em vez de usar métodos credíveis de medição do desempenho dos funcionários e remunerá-los em função disso
· (...)
· Permitir a excessiva apreciação da taxa de câmbio antes que a economia esteja pronta para a transição para níveis mais elevados de produtividade, nomeadamente da indústria.
A lista acima é ilustrativa e não exaustiva. Cada país deve ter a sua própria lista de práticas que parecem desejáveis mas são ineficientes."
In The Growth Report: Strategies for Sustained Growth and Inclusive Development (vd link abaixo)
"Os debates ajudam a clarificar as boas ideias, sujeitando-as a análise e ao debate construtivo. Mas os debates também podem ser infectados por ideias más. Isto coloca dois tipos de dificuldades aos decisores políticos. Primeiro têm de identificar as ideias más, porque propostas destas podem aparentemente parecer prometedoras. Depois, precisam de evitar que elas sejam implementadas.
Uma lista ilustrativa de “más ideias” (que apesar disso são, muitas vezes, trazidas aos debates e a que se deve resistir) é apresentada abaixo. Devemos acrescentar desde já que, tal como as nossas recomendações sobre boas políticas devem ser tomadas com as devidas cautelas e adaptações à realidade de cada país, também a nossa lista de más políticas devem ser sujeitas aos mesmos cuidados.
Há situações e circunstâncias em que pode ser justificado adoptar temporariamente algumas das políticas abaixo mencionadas mas a maior parte da evidência sugere que tais políticas implicam grandes custos e que os seus objectivos declarados --- muitas vezes bons --- são melhor prosseguidos por outros meios.
· Subsidiar a energia excepto em casos muito específicos e dirigidos a sectores altamente vulneráveis da população.
· Lidar com o nível elevado de desemprego utilizando a Função Pública como “empregador de último recurso”. Isto é diferente dos programas de obras públicas tais como esquemas rurais de emprego, que podem constituir uma rede de segurança social importante
· (...)
· Impor controlos de preços para travar a inflação, a qual é muito melhor defrontada através de outras políticas macroeconómicas
· (...)
· Ignorar as questões ambientais nos estádios iniciais de crescimento com o argumento de que se trata de um “luxo insustentável” [para o país]
· Medir o progresso da educação apenas pela construção de infraestruturas escolares ou, até, pela maior taxa de matrícula em vez de focar a atenção na extensão da aprendizagem e na qualidade do ensino
· Pagar mal aos funcionários públicos (incluindo professores) comparativamente com os valores do mercado para qualificações semelhantes e combinar as baixas remunerações com promoções por antiguidade em vez de usar métodos credíveis de medição do desempenho dos funcionários e remunerá-los em função disso
· (...)
· Permitir a excessiva apreciação da taxa de câmbio antes que a economia esteja pronta para a transição para níveis mais elevados de produtividade, nomeadamente da indústria.
A lista acima é ilustrativa e não exaustiva. Cada país deve ter a sua própria lista de práticas que parecem desejáveis mas são ineficientes."
In The Growth Report: Strategies for Sustained Growth and Inclusive Development (vd link abaixo)
Sobre a agricultura no processo de desenvolvimento
in The Growth Report: Strategies for Sustained Growth and Inclusive Development
(Relatório da "Comissão Spence", pg 60)
"Há muitas e boas razões para investir na agricultura. Os ganhos podem ser impressionantes. A investigação agrária e a extensão rural têm taxas de retorno de cerca de 35% na África Sub-Saariana e de 50% na Ásia, de acordo com o último World Development Report [do Banco Mundial].
Além disso, em muitos países em desenvolvimento as áreas rurais são aquelas onde reside e trabalha a grande maioria dos pobres. Criar postos de trabalho para esta população na economia urbana levará várias décadas mesmo nas economias mais dinâmicas. (...)
As populações rurais são, muitas vezes, servidas deficientemente por serviços públicos, o que leva muitos a procurarem melhor educação ou saúde nas cidades.
A experiência sugere que o crescimento agrícola reduz a pobreza mais rapidamente que o crescimento da indústria ou dos serviços. Os Governos deveriam investir na agricultura até porque muitos desses investimentos se justificam por si próprios pelos seus méritos. ."
(Relatório da "Comissão Spence", pg 60)
"Há muitas e boas razões para investir na agricultura. Os ganhos podem ser impressionantes. A investigação agrária e a extensão rural têm taxas de retorno de cerca de 35% na África Sub-Saariana e de 50% na Ásia, de acordo com o último World Development Report [do Banco Mundial].
Além disso, em muitos países em desenvolvimento as áreas rurais são aquelas onde reside e trabalha a grande maioria dos pobres. Criar postos de trabalho para esta população na economia urbana levará várias décadas mesmo nas economias mais dinâmicas. (...)
As populações rurais são, muitas vezes, servidas deficientemente por serviços públicos, o que leva muitos a procurarem melhor educação ou saúde nas cidades.
A experiência sugere que o crescimento agrícola reduz a pobreza mais rapidamente que o crescimento da indústria ou dos serviços. Os Governos deveriam investir na agricultura até porque muitos desses investimentos se justificam por si próprios pelos seus méritos. ."
A propósito da possível emissão de moeda própria
Um dos problemas que há que defrontar quando se emite/passa a emitir moeda própria é o da definição da taxa de câmbio e, principalmente, do regime cambial em que se fará a gestão da taxa de câmbio.
John Williamson, o "pai" da expressão "Washington consensus/Consenso de Washington" disse nomeadamente:
“give [a country] an exchange rate suffi ciently competitive that its entrepreneurs are motivated to go and sell on the world market, and it will grow.
Give it too much easy money from oil exports, or aid, or capital infl ows, and let its exchange rate appreciate in consequence, and too many people with ability will be diverted from exporting to squabbling about the rents, and growth will be doomed.”
Traduzindo: "dêm [a um país] uma taxa de câmbio suficientemente competitiva para os seus empresários se sentirem motivados a venderem no mercado internacional e o país crescerá.
Dêm-lhe demasiado dinheiro fácil de exportações de petróleo, de ajuda ou de entradas de capital e deixem a sua taxa de câmbio apreciar-se em resultado disto e demasiadas pessoas com capacidade serão desviadas da exportação para a procura de "rendas" [nomeadamente como simples intermediários comerciais ou junto dos poderes públicos - AS] e o crescimento será afectado."
(in Williamson, John. 2003 Review of “Too Sensational” by Max Corden. Journal of Economic Literature 41(4): 1289–90)
John Williamson, o "pai" da expressão "Washington consensus/Consenso de Washington" disse nomeadamente:
“give [a country] an exchange rate suffi ciently competitive that its entrepreneurs are motivated to go and sell on the world market, and it will grow.
Give it too much easy money from oil exports, or aid, or capital infl ows, and let its exchange rate appreciate in consequence, and too many people with ability will be diverted from exporting to squabbling about the rents, and growth will be doomed.”
Traduzindo: "dêm [a um país] uma taxa de câmbio suficientemente competitiva para os seus empresários se sentirem motivados a venderem no mercado internacional e o país crescerá.
Dêm-lhe demasiado dinheiro fácil de exportações de petróleo, de ajuda ou de entradas de capital e deixem a sua taxa de câmbio apreciar-se em resultado disto e demasiadas pessoas com capacidade serão desviadas da exportação para a procura de "rendas" [nomeadamente como simples intermediários comerciais ou junto dos poderes públicos - AS] e o crescimento será afectado."
(in Williamson, John. 2003 Review of “Too Sensational” by Max Corden. Journal of Economic Literature 41(4): 1289–90)
quinta-feira, 21 de agosto de 2008
Cantoneiros, precisam-se!...
Já por mais de uma vez tenho chamado a atenção para a necessidade de fazer chegar dinheiro às zonas rurais através de vários mecanismos. Um deles seria a criação de um corpo semelhante ao dos "cantoneiros" existentes em Portugal e que têm a seu cargo a vigilância, manutenção e pequenas reparações da rede viária do país. Com tanto buraco por aí, trabalho não faltará...
"À consideração superior"
PS: "Navegando" na net dei com esta 'entrada' de um blog em que se fala dos cantoneiros e do seu manual de comportamento mas também de instrução técnica para o desempenho das suas actividades: http://alentejanando.weblog.com.pt/arquivo/064798.html
Esta seria uma forma mais organizada (e, espera-se, mais eficiente) de continuar a campanha feita há algum tempo em que muitas pessoas foram envolvidas na limpeza das estradas mas que, infelizmente, não teve continuidade.
Uma forma complementar de fazer o dinheiro circular nas zonas rurais era apoiar a constituição de pequenas empresas locais que, devidamente apoiadas, se dedicassem a executar reparações um pouco maiores que as que podem ser executadas por uma só pessoa.
Claro que não é possível começar com um esquema deste tipo simultaneamente em todo o país. Mas por algum lado (1 ou 2 distritos) se tem de começar, retirando depois as lições a aprender antes de expandir o processo para o resto do país."À consideração superior"
PS: "Navegando" na net dei com esta 'entrada' de um blog em que se fala dos cantoneiros e do seu manual de comportamento mas também de instrução técnica para o desempenho das suas actividades: http://alentejanando.weblog.com.pt/arquivo/064798.html
terça-feira, 19 de agosto de 2008
Do bom método para fazer política económica
Tenho para mim que um dos problemas principais que se colocam hoje à política económica que está a ser implementada em Timor Leste é o da... falta de método! Que deriva da falta de conhecimentos e da falta de estudo...
Na verdade, creio que muitos erros que se estão a cometer são derivados de não serem seguidos os bons princípios da metodologia da política económica, nomeadamente quanto ao chamado "processo de tomada de decisões".
Tinbergen, o holandês que foi o primeiro prémio Nobel da Economia por ter sido exactamente o pai da metodologia da política económica, ensinava que no processo de tomada de decisões há, no mínimo, seis fases diferentes. A saber:
1ª fase: conhecimento da realidade (diagnóstico);
2ª fase: análise das divergências entre a realidade e o desejável;
3ª fase: estimativa dos efeitos de políticas económicas alternativas;
4ª fase: escolha e decisão sobre a política económica a executar;
5ª fase: execução da política económica escolhida;
6ª fase: avaliação dos resultados
Isto é: as medidas de política económica devem ser previamente preparadas com cuidado (o "planeamento" da política económica), nomeadamente através de um bom conhecimento da realidade e do estudo dos efeitos de medidas alternativas (construção de cenários). E para saber determinar estes efeitos é preciso estudar, saber quais são as ligações (os 'linkages') existentes entre variáveis e agentes económicos (sim, isto da economia é como um cesto de cerejas...). Só depois é possível actuar. Decisões mal informadas são, quase sempre, más decisões... E dá-me a sensação que há por aí muita gente que não está a fazer o TPC (trabalho de casa) como deve ser...
Um exemplo é o da decisão de comprar arroz no mercado internacional e distribuí-lo a preço subsidiado.
Dá a impressão que só se pensou no (muitíssimo) curto prazo e não se tomaram em consideração os efeitos a médio e longo prazo. E ainda menos se estudou a possibilidade de existência de medidas alternativas e com menores custos.
Subsidiar um preço de um bem importado tem como consequência que os produtores nacionais são prejudicados, principalmente se, como é o caso em Timor, eles tendem a vender o seu arroz a preços mais altos que o arroz importado e vendido no mercado sem subsídio.
O resultado é que os produtores nacionais estão a queixar-se de que têm dificuldade em escoar o arroz que produzem devido ao facto de o mercado (quase) só absorver arroz subsidiado pelo Governo.
Não havia alternativas? Claro que havia e com menos custos. Por exemplo a de distribuir a cada família uma certa quantia de dinheiro (transferência em dinheiro; cash advance) que ela usaria para adquirir o que quisesse, particularmente o arroz. Os cerca de 15 USD que constituem o subsídio por saca poderiam ter sido entregues mensalmente, em dinheiro, a cada família timorense. Na prática isto constituia uma redução do preço do arroz mas o consumidor ficava com a opção de comprar arroz importado ou arroz nacional. E era bem bom se optasse por este último. Assim...
Outra alternativa era, se se queria subsidiar o consumo, faze-lo em menor grau do que foi feito para não prejudicar tanto os produtores nacionais e usar o diferencial para apoiar a agricultura nacional, nomeadamente os produtores de arroz. De facto e quase por princípio (que tem algumas excepções), devem ser evitados os subsídios ao consumo e a serem usados subsídios, devem se canalizados para a produção.
Um outro aspecto que não se teve em conta foi o das consequências a médio-longo prazo daquele subsídio. Para além de ter de haver, desde o início, não só uma estratégia de "entrada" no sistema de subsídios ao consumo mas também uma estratégia de "saída" (já pensaram nisso?), é necessário ter em consideração que o subsídio a um preço distorce a informação que este dá aos consumidores. Deixar subir o preço do arroz era uma mensagem aos consumidores de que têm de alterar o seu padrão de consumo, consumindo menos quantidade de arroz (nomeadamente importado) e maior quantidade de produtos alternativos/substitutos, de preferência de produção nacional.
E aqui somos levados a uma última referência (isto já vai longo...): a de que é necessário URGENTEMENTE definir uma política alimentar em perfeita articulação com a política agrícola e de desenvolvimento rural. A realidade é complexa e como tal tem de ser encarada; e isto exige estudo da situação (o diagnóstico da realidade) e a articulação de várias políticas entre si, em vez de se tomarem decisões mais ou menos avulsas, sem obedecerem a uma estratégia bem programada e melhor implementada.
Na verdade, creio que muitos erros que se estão a cometer são derivados de não serem seguidos os bons princípios da metodologia da política económica, nomeadamente quanto ao chamado "processo de tomada de decisões".
Tinbergen, o holandês que foi o primeiro prémio Nobel da Economia por ter sido exactamente o pai da metodologia da política económica, ensinava que no processo de tomada de decisões há, no mínimo, seis fases diferentes. A saber:
1ª fase: conhecimento da realidade (diagnóstico);
2ª fase: análise das divergências entre a realidade e o desejável;
3ª fase: estimativa dos efeitos de políticas económicas alternativas;
4ª fase: escolha e decisão sobre a política económica a executar;
5ª fase: execução da política económica escolhida;
6ª fase: avaliação dos resultados
Isto é: as medidas de política económica devem ser previamente preparadas com cuidado (o "planeamento" da política económica), nomeadamente através de um bom conhecimento da realidade e do estudo dos efeitos de medidas alternativas (construção de cenários). E para saber determinar estes efeitos é preciso estudar, saber quais são as ligações (os 'linkages') existentes entre variáveis e agentes económicos (sim, isto da economia é como um cesto de cerejas...). Só depois é possível actuar. Decisões mal informadas são, quase sempre, más decisões... E dá-me a sensação que há por aí muita gente que não está a fazer o TPC (trabalho de casa) como deve ser...
Um exemplo é o da decisão de comprar arroz no mercado internacional e distribuí-lo a preço subsidiado.
Dá a impressão que só se pensou no (muitíssimo) curto prazo e não se tomaram em consideração os efeitos a médio e longo prazo. E ainda menos se estudou a possibilidade de existência de medidas alternativas e com menores custos.
Subsidiar um preço de um bem importado tem como consequência que os produtores nacionais são prejudicados, principalmente se, como é o caso em Timor, eles tendem a vender o seu arroz a preços mais altos que o arroz importado e vendido no mercado sem subsídio.
O resultado é que os produtores nacionais estão a queixar-se de que têm dificuldade em escoar o arroz que produzem devido ao facto de o mercado (quase) só absorver arroz subsidiado pelo Governo.
Não havia alternativas? Claro que havia e com menos custos. Por exemplo a de distribuir a cada família uma certa quantia de dinheiro (transferência em dinheiro; cash advance) que ela usaria para adquirir o que quisesse, particularmente o arroz. Os cerca de 15 USD que constituem o subsídio por saca poderiam ter sido entregues mensalmente, em dinheiro, a cada família timorense. Na prática isto constituia uma redução do preço do arroz mas o consumidor ficava com a opção de comprar arroz importado ou arroz nacional. E era bem bom se optasse por este último. Assim...
Outra alternativa era, se se queria subsidiar o consumo, faze-lo em menor grau do que foi feito para não prejudicar tanto os produtores nacionais e usar o diferencial para apoiar a agricultura nacional, nomeadamente os produtores de arroz. De facto e quase por princípio (que tem algumas excepções), devem ser evitados os subsídios ao consumo e a serem usados subsídios, devem se canalizados para a produção.
Um outro aspecto que não se teve em conta foi o das consequências a médio-longo prazo daquele subsídio. Para além de ter de haver, desde o início, não só uma estratégia de "entrada" no sistema de subsídios ao consumo mas também uma estratégia de "saída" (já pensaram nisso?), é necessário ter em consideração que o subsídio a um preço distorce a informação que este dá aos consumidores. Deixar subir o preço do arroz era uma mensagem aos consumidores de que têm de alterar o seu padrão de consumo, consumindo menos quantidade de arroz (nomeadamente importado) e maior quantidade de produtos alternativos/substitutos, de preferência de produção nacional.
E aqui somos levados a uma última referência (isto já vai longo...): a de que é necessário URGENTEMENTE definir uma política alimentar em perfeita articulação com a política agrícola e de desenvolvimento rural. A realidade é complexa e como tal tem de ser encarada; e isto exige estudo da situação (o diagnóstico da realidade) e a articulação de várias políticas entre si, em vez de se tomarem decisões mais ou menos avulsas, sem obedecerem a uma estratégia bem programada e melhor implementada.
segunda-feira, 18 de agosto de 2008
Até faz dó!...
Sábado passado fui para os lados de Maubara, visitar o "Vô Serra", o meu parente que vive em Timor desde 1965, há 43 anos! Uma vida!
E meteu-me dó o cada vez maior número de pilhas de lenha que se vêm um pouco por todo o lado à borda da estrada pronta para ser vendida ao primeiro viajante que a queira comprar. Nunca, em cerca de 8 anos que já "levo" de Timor Leste, tinha visto tanta lenha, símbolo do desmatamento que os timorenses estão a fazer, certamente a um ritmo muito maior que a capacidade de crescimento das árvores que têm sido plantadas.
E meteu-me dó o cada vez maior número de pilhas de lenha que se vêm um pouco por todo o lado à borda da estrada pronta para ser vendida ao primeiro viajante que a queira comprar. Nunca, em cerca de 8 anos que já "levo" de Timor Leste, tinha visto tanta lenha, símbolo do desmatamento que os timorenses estão a fazer, certamente a um ritmo muito maior que a capacidade de crescimento das árvores que têm sido plantadas.
É necessário encontrar uma solução urgente para esta verdadeira "razia" que se está a fazer na cobertura florestal do país e que não pode deixar de ter consequências graves em termos ambientais, fazendo o país ficar cada vez mais exposto aos riscos de degradação ambiental e de seca.
O que fazer? Não simpatizo (mesmo nada) com subsídios ao consumo mas há que ser realista e colocar a hipótese de se facilitar, através de um subsídio que faça baixar o seu preço ou através de esquemas de aproveitamento do gás que brota naturamente num ou noutro ponto do país (costa sul), a aquisição de petróleo ou de gás para uso doméstico. Sob risco de, se tal não for feito em tempo útil, a actual geração legar às próximas um Timor completamente "careca", seco, castanhão, em vez do Timor verde que todos apreciamos.
quinta-feira, 14 de agosto de 2008
Espertos!... :-) Sobre o arroz comprado aos camponeses timorenses pelo Governo
"É dos livros" que algumas das relações mais interessantes de seguir num país em desenvolvimento são as que se estabelecem entre os agricultores familiares e o Estado.
Habituados que este não seja, propriamente, um seu "amigo do peito", os camponeses têm tendência a encontrar rapidamente estratégias de adaptação quando as relações com o Estado não são o que desejavam. Será que o mesmo está a começar a acontecer em Timor em torno da questão da compra do arroz local aos camponeses? Talvez. Ou, pelo menos, merece a pena estar atento ao fenómeno.
Assim, fui ontem ao mercado comprar arroz para comparar preços e deparei com um vendedor que tinha uma saca de arroz de Uato Lari (Viqueque) disponibilizado pelo Governo (a 15 USD a saca de 35kg) e que ele vende a 1 USD cada 5 latas, sensivelmente 1kg.
Ora, o arroz em questão é de baixíssima qualidade, de bago pequeno e muito partido, a meio caminho entre o arroz normal e o que chamamos de "trinca" de arroz. O que pode estar a acontecer é os camponeses ficarem com o arroz de melhor qualidade que produzem para venderem directamente no mercado a preço mais elevado que aquele a que o Governo lhes compra e vender a este o refugo da sua produção... Espertos!...
Como é que o Governo vai controlar a qualidade do arroz que lhe vendem? Mais outra dor de cabeça... Ai Maromak!... "E eu que julgava que governar o país é mais ou menos o mesmo que governar a minha casa!..."
Habituados que este não seja, propriamente, um seu "amigo do peito", os camponeses têm tendência a encontrar rapidamente estratégias de adaptação quando as relações com o Estado não são o que desejavam. Será que o mesmo está a começar a acontecer em Timor em torno da questão da compra do arroz local aos camponeses? Talvez. Ou, pelo menos, merece a pena estar atento ao fenómeno.
Assim, fui ontem ao mercado comprar arroz para comparar preços e deparei com um vendedor que tinha uma saca de arroz de Uato Lari (Viqueque) disponibilizado pelo Governo (a 15 USD a saca de 35kg) e que ele vende a 1 USD cada 5 latas, sensivelmente 1kg.
Ora, o arroz em questão é de baixíssima qualidade, de bago pequeno e muito partido, a meio caminho entre o arroz normal e o que chamamos de "trinca" de arroz. O que pode estar a acontecer é os camponeses ficarem com o arroz de melhor qualidade que produzem para venderem directamente no mercado a preço mais elevado que aquele a que o Governo lhes compra e vender a este o refugo da sua produção... Espertos!...
Como é que o Governo vai controlar a qualidade do arroz que lhe vendem? Mais outra dor de cabeça... Ai Maromak!... "E eu que julgava que governar o país é mais ou menos o mesmo que governar a minha casa!..."
quarta-feira, 13 de agosto de 2008
Taxa de inflação: 12,4%
Segundo números recentemente divulgados pela Direcção Nacional de Estatística, a taxa de inflação em Timor Leste (na verdade, na cidade de Dili, onde a informação é recolhida) foi de 12,4% em Julho passado comparativamente com Julho do ano anterior (2007) --- a chamada "taxa homóloga", neste caso de Julho.
Isto representa uma subida relativamente aos 11,6% do mês anterior.
As rubricas que mais influenciaram esta taxa foram as da alimentação (15,9%, por "culpa" principalmente dos 40,3% dos "cereais, raízes e seus produtos" --- leia-se, o arroz, etc), dos materiais de construção (23,1%) e dos transportes, principalmente os combustíveis (23,4%).
Com esta evolução parece difícil que se concretizem as estimativas de que a taxa anual de inflação em 2008 seria de cerca de 9%. Será que vamos a caminho dos 15% ou mais?
Considerando que durante o mês de Julho foram pagos valores muito significativos a vários grupos da população ("deslocados internos", "peticionários", pensões aos heróis da luta de libertação) vai ser interessante acompanhar o valor da inflação nos próximos meses para tentar determinar se aqueles pagamentos vão exercer pressão sobre os preços, "empurrando" a taxa de inflação para valores ainda mais altos.
Isto representa uma subida relativamente aos 11,6% do mês anterior.
As rubricas que mais influenciaram esta taxa foram as da alimentação (15,9%, por "culpa" principalmente dos 40,3% dos "cereais, raízes e seus produtos" --- leia-se, o arroz, etc), dos materiais de construção (23,1%) e dos transportes, principalmente os combustíveis (23,4%).
Com esta evolução parece difícil que se concretizem as estimativas de que a taxa anual de inflação em 2008 seria de cerca de 9%. Será que vamos a caminho dos 15% ou mais?
Considerando que durante o mês de Julho foram pagos valores muito significativos a vários grupos da população ("deslocados internos", "peticionários", pensões aos heróis da luta de libertação) vai ser interessante acompanhar o valor da inflação nos próximos meses para tentar determinar se aqueles pagamentos vão exercer pressão sobre os preços, "empurrando" a taxa de inflação para valores ainda mais altos.
terça-feira, 12 de agosto de 2008
A "teoria da banheira"
Lembram-se daqueles problemas irritantes que nos davam volta à cabeça e em que tínhamos de calcular quanto tempo levava a esvaziar-se uma banheira cuja torneira debitava "x" litros por segundo e cujo ralo escoava "y" litros?
Pois um amigo meu, talvez inspirado nesses problemas, descreveu a situação económica actual de Timor Leste como sendo parecida com a de uma banheira (ele chama-lhe, na verdade, a "teoria do bidé"...) para a qual a torneira do dinheiro do Mar de Timor despeja dinheiro mas em que uma parte significativa desse dinheiro sai pelo ralo, via importações, a caminho da Indonésia (cerca de metade das importações de TL) e de outras paragens, ficando (relativamente) pouca coisa no país. Pelo menos em termos produtivos, já que muito é "desperdiçado" em consumo.
Numa perspectiva de médio-longo prazo, d eestratégia de desenvolvimento, isto é preocupante e merece a atenção das autoridades económicas já que a revisão da política fiscal que foi feita, com redução das taxas alfandegárias a uns quase simbólicos 2,5%+2,5%, deixa o país relativamente "desarmado" para fazer face à invasão do mercado nacional com produtos importados, em prejuízo da possibilidade de desenvolver internamente algumas produções que satisfaçam, pelo menos, parte do mercado já existente.
Associando a isto a crescente inflação, pode estar (já está?) a criar-se uma situação próxima de uma "dutch disease" em que produzir internamente sai mais caro que importar (da Indonésia, p.ex.) e em que a abundância de dinheiro (do petróleo) torna fáceis/apetecíveis as importações. Com prejuízo do saldo da balança de pagamentos e, principalmente, da economia nacional e da capacidade de gerar empregos no país.
"À consideração superior"!...
Pois um amigo meu, talvez inspirado nesses problemas, descreveu a situação económica actual de Timor Leste como sendo parecida com a de uma banheira (ele chama-lhe, na verdade, a "teoria do bidé"...) para a qual a torneira do dinheiro do Mar de Timor despeja dinheiro mas em que uma parte significativa desse dinheiro sai pelo ralo, via importações, a caminho da Indonésia (cerca de metade das importações de TL) e de outras paragens, ficando (relativamente) pouca coisa no país. Pelo menos em termos produtivos, já que muito é "desperdiçado" em consumo.
Numa perspectiva de médio-longo prazo, d eestratégia de desenvolvimento, isto é preocupante e merece a atenção das autoridades económicas já que a revisão da política fiscal que foi feita, com redução das taxas alfandegárias a uns quase simbólicos 2,5%+2,5%, deixa o país relativamente "desarmado" para fazer face à invasão do mercado nacional com produtos importados, em prejuízo da possibilidade de desenvolver internamente algumas produções que satisfaçam, pelo menos, parte do mercado já existente.
Associando a isto a crescente inflação, pode estar (já está?) a criar-se uma situação próxima de uma "dutch disease" em que produzir internamente sai mais caro que importar (da Indonésia, p.ex.) e em que a abundância de dinheiro (do petróleo) torna fáceis/apetecíveis as importações. Com prejuízo do saldo da balança de pagamentos e, principalmente, da economia nacional e da capacidade de gerar empregos no país.
"À consideração superior"!...
Último relatório trimestral do Fundo Petrolífero
Foi divulgado na passada sexta-feira o relatório do Fundo Petrolífero relativo ao segundo trimestre de 2008 (Abril-Junho). Leia-o a partir do site do banco central de Timor-Leste (a ABP) aqui.
No mesmo local pode aceder aos relatórios trimestrais publicados desde a criação do Fundo, em Setembro de 2005, quando o seu capital era de cerca de 250 milhões USD (contra os 3200 mil milhões actuais). Aí está também disponível o relatório anual relativo ao ano fiscal 2005-06.
No mesmo local pode aceder aos relatórios trimestrais publicados desde a criação do Fundo, em Setembro de 2005, quando o seu capital era de cerca de 250 milhões USD (contra os 3200 mil milhões actuais). Aí está também disponível o relatório anual relativo ao ano fiscal 2005-06.
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