Blog sobre Economia e Política Económica do Desenvolvimento, em particular sobre a economia de Timor Leste e aquilo que naquelas pode ser útil ao desenvolvimento económico deste país
sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011
Já há mais de 20 anos se dizia que...
Pesquisando a questão da independência dos bancos centrais em relação ao poder político (principalmente o Governo), dei com um texto publicado há quase 15 anos que cita, logo no seu início, a frase acima tomada do The Economist.
Na conclusão do estudo diz-se [deixamos no original inglês para que a eventual tradução não altere, mesmo que ligeiramente, o sentido das conclusões dos autores]:
" Is “the only good central bank one that can say no to the politicians”? Although an independent central bank is neither a sufficient nor necessary condition for price stability, we must agree with the theoretical literature and previous empirical studies that a country with an independent central bank will, ceteris paribus, have a lower rate of inflation than will a country where politicians can steer the central bank’s policy. In principle, then, because attaining lower inflation rates bears no costs in terms of lower long-term economic growth, we can answer the question in the affirmative. The tendency that is currently [há 20 anos atrás!... - AS] apparent in many countries toward greater central-bank autonomy should therefore be regarded positively." [pg 54 de EIJFFINGER, S. and DE HAAN, J. The Political Economy of Central-Bank Independence, Princeton University, 1996]
Naturalmente --- e os autores do estudo alertam para isso ---, essa independência não é uma condição suficiente para a estabilidade dos preços mas parece ser, de facto, muito importante para ela.
Suponhamos um automóvel em que o acelerador [os políticos, o Governo, o Ministério das Finanças...] quer é "prego a fundo" [crescer o mais rapidamente possível] e em que ele próprio controla também o travão [o que evita as "derrapagens" nas curvas mas também nas próprias rectas, i.e., a inflação]. O que aconteceria?Mais cedo ou mais tarde... zás, traz, catrapaz!... A economia ficaria, com forte probabilidade, desregulada, com a inflação a crescer rapidamente...
Ora todos sabem (saberão mesmo?) que a inflação é o mais traiçoeiro imposto sobre os mais pobres da sociedade, designadamente os que recebem rendimentos fixos que verão o seu poder de compra diminuído enquanto que os mais ricos, normalmente com rendimentos dependentes do nível dos preços, acabarão por ser os principais beneficiados, "enricando" cada vez mais! Isto é: a inflação é inimiga de uma equilibrada e justa repartição de rendimentos na sociedade.
Por isso é importante que o travão [o banco central] seja independente do acelerador [normalmente o Governo, qualquer governo em qualquer país e não o Governo X do país Y] na condução (DEFINIÇÃO e EXECUÇÃO) da política monetária.
Note-se que a tendência ao reconhecimento das vantagens ECONÓMICAS da independência do Banco Central aumentou significativamente desde aquela época, sendo hoje raros os casos em que ela não existe.
Por fim, recorde-se que o que está em causa é mesmo a capacidade de dizer "não" se e quando for necessário mas que não restem dúvidas também de uma coisa: não há, de certeza, governador nenhum de um banco central que dirá "não" por ter mau feitio ou por querer, de alguma forma, desfeitear as políticas económicas do Governo.
O Governador do banco central mais feliz é aquele que consegue sentar-se à mesa com o Ministro das Finanças e, bebendo um café "expresso" feito de café de Timor ou um chá, acordar com ele uma política económica (monetária e financeira + orçamental) em que o principal ganhador seja, no longo prazo, o desenvolvimento económico do país!
Afinal é para isso que cada um ocupa o respectivo cargo, não é?!...
segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011
A questão dos empréstimos do Banco Central ao Estado
No relatório apresentado à Comissão "C" do Parlamento Nacional e que acompanha o projecto de lei dos estatutos do Banco Central de Timor-Leste apresentado por deputados do Parlamento Nacional pode ver-se que a solução defendida pelo Governo é diferente da que consta do projecto original.
Neste, "o Banco [Central] não deverá conceder créditos directos ou indirectos ao Governo ou qualquer outra agência pública ou entidade detida pelo Estado à excepção dos créditos intra-dia para assegurar o fundionamento dos sistema de pagamentos", o qual "deverá ser pago antes do final do mesmo dia". Isto é e na prática: proibe-se a concessão de crédito ao Governo.
Pelo contrário e chamando a atenção para o facto de ser uma prática corrente noutros bancos centrais --- tal como a outra, aliás, que corresponde às "boas práticas" mais usuais ---, na proposta do Governo o Banco Central "pode conceder créditos ao Governo por períodos que não excedem [devia estar "excedam"] os noventa dias, cobrando as taxas de juro praticáveis [não deveria ser "praticadas (no mercado monetário)"?] em Timor-Leste".
Ainda que esta concessão de créditos apareça limitada no ponto seguinte a "5% da média anual das receitas ordinárias do Governo para os três anos financeiros precedentes", a verdade é que, como se disse, esta não corresponde às "boas práticas" mais generalizadas hoje em dia. E há razões estritamente económicas para ser assim (i.e., para não ser autorizada a concessão de empréstismos ao Governo).
Mesmo que, a manter-se o recurso às receitas petrolíferas, seja pouco provável que este pedido de empréstimo pelo Governo se venha a verificar, a verdade é que a proibição da sua concessão se baseia num duplo princípo teórico-prático:
i) por um lado, o de que ao emprestar ao Governo o Banco Central está a criar dinheiro novo, moeda, e, por isso, a aumentar (mesmo que limitadamente) a massa monetária, com a consequente pressão para a subida dos preços (inflação); e,
ii) por outro, que numa situação em que o banco central é, de facto, o emprestador "de último recurso" dos bancos comerciais, ao emprestar ao Estado está, pelo menos potencialmente, a limitar as disponibilidades para financiar a banca comercial, i.e., o sector privado nacional, assim se prejudicando este em benefício do Estado/sector público --- até porque, naturalmente, aquele acabará por ter de vir a pagar taxas de juro mais altas se o Governo aparecer a contrair empréstimos e assim "secar" parcialmente o crédito disponível.
Assim, o que se pretende nas "boas práticas" mais modernas é que o Governo, se precisar de financiamento, se apresente no mercado como outro qualquer cliente --- de preferência, até, no mercado internacional desde que tenha cuidado com os níveis de dívida pública ao exterior --- e pague as taxas de juro praticadas no mercado --- e não as taxas "praticáveis", como se diz na proposta de alteração do projecto de lei.
No caso de Timor Leste há ainda um problema suplementar (pelo menos até agora...): quais são as taxas de juro "praticadas"? A verdade é que não existe um mercado interbancário em funcionamento --- os bancos comerciais têm excesso de liquidez e por isso não precisam de se financiarem nem junto de outros bancos nem junto do banco central. Assim sendo, qual a taxa a praticar nos empréstimos do Banco Central ao Governo.
Mais: só um ingénuo pensará que a relação entre banco central e Governo é/será --- pior ainda se forem aprovadas algumas das propostas do Governo --- uma relação de perfeita igualdade de poder negocial entre as duas partes...
Enfim, também aqui cremos que as "boas práticas" são as que constam do projecto de lei proposto pelos senhores deputados e não as que constam das propostas do Governo. E que aquelas "boas práticas" são as que, sob o ponto de vista estritamente económico, são mais defensáveis.
Voltaremos!... :-)
Neste, "o Banco [Central] não deverá conceder créditos directos ou indirectos ao Governo ou qualquer outra agência pública ou entidade detida pelo Estado à excepção dos créditos intra-dia para assegurar o fundionamento dos sistema de pagamentos", o qual "deverá ser pago antes do final do mesmo dia". Isto é e na prática: proibe-se a concessão de crédito ao Governo.
Pelo contrário e chamando a atenção para o facto de ser uma prática corrente noutros bancos centrais --- tal como a outra, aliás, que corresponde às "boas práticas" mais usuais ---, na proposta do Governo o Banco Central "pode conceder créditos ao Governo por períodos que não excedem [devia estar "excedam"] os noventa dias, cobrando as taxas de juro praticáveis [não deveria ser "praticadas (no mercado monetário)"?] em Timor-Leste".
Ainda que esta concessão de créditos apareça limitada no ponto seguinte a "5% da média anual das receitas ordinárias do Governo para os três anos financeiros precedentes", a verdade é que, como se disse, esta não corresponde às "boas práticas" mais generalizadas hoje em dia. E há razões estritamente económicas para ser assim (i.e., para não ser autorizada a concessão de empréstismos ao Governo).
Mesmo que, a manter-se o recurso às receitas petrolíferas, seja pouco provável que este pedido de empréstimo pelo Governo se venha a verificar, a verdade é que a proibição da sua concessão se baseia num duplo princípo teórico-prático:
i) por um lado, o de que ao emprestar ao Governo o Banco Central está a criar dinheiro novo, moeda, e, por isso, a aumentar (mesmo que limitadamente) a massa monetária, com a consequente pressão para a subida dos preços (inflação); e,
ii) por outro, que numa situação em que o banco central é, de facto, o emprestador "de último recurso" dos bancos comerciais, ao emprestar ao Estado está, pelo menos potencialmente, a limitar as disponibilidades para financiar a banca comercial, i.e., o sector privado nacional, assim se prejudicando este em benefício do Estado/sector público --- até porque, naturalmente, aquele acabará por ter de vir a pagar taxas de juro mais altas se o Governo aparecer a contrair empréstimos e assim "secar" parcialmente o crédito disponível.
Assim, o que se pretende nas "boas práticas" mais modernas é que o Governo, se precisar de financiamento, se apresente no mercado como outro qualquer cliente --- de preferência, até, no mercado internacional desde que tenha cuidado com os níveis de dívida pública ao exterior --- e pague as taxas de juro praticadas no mercado --- e não as taxas "praticáveis", como se diz na proposta de alteração do projecto de lei.
No caso de Timor Leste há ainda um problema suplementar (pelo menos até agora...): quais são as taxas de juro "praticadas"? A verdade é que não existe um mercado interbancário em funcionamento --- os bancos comerciais têm excesso de liquidez e por isso não precisam de se financiarem nem junto de outros bancos nem junto do banco central. Assim sendo, qual a taxa a praticar nos empréstimos do Banco Central ao Governo.
Mais: só um ingénuo pensará que a relação entre banco central e Governo é/será --- pior ainda se forem aprovadas algumas das propostas do Governo --- uma relação de perfeita igualdade de poder negocial entre as duas partes...
Enfim, também aqui cremos que as "boas práticas" são as que constam do projecto de lei proposto pelos senhores deputados e não as que constam das propostas do Governo. E que aquelas "boas práticas" são as que, sob o ponto de vista estritamente económico, são mais defensáveis.
Voltaremos!... :-)
domingo, 20 de fevereiro de 2011
Comércio externo de Timor Leste
No quadro abaixo indicam-se os principais parceiros comerciais de Timor Leste quanto às importações deste, os valores destas provenientes de cada um deles (em milhares de USD) e o seu peso (%) no total das importações.
No quadro abaixo dá-se informação sobre os principais tipos de produtos importados. Note-se, por exemplo, que o peso dos "petróleo e derivados" e "veículos" atinge, normalmente, mais de 1/3 das importações.
As exportações, que raramente chegam aos 10 milhões de USD/ano, são apenas de café ou pouco mais. O petróleo e gás natural não são contabilizados como exportações do país por a sua exploração ser feita em "território" (marítimo) internacional (conjunto de Timor Leste e da Austrália).
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sábado, 19 de fevereiro de 2011
"Continuação do capítulo anterior" ou a história dos 3 "chapéus" usados por um banqueiro central
Na "entrada" anterior chamámos a atenção para a importância ECONÓMICA da independência do banco central em relação ao poder político de modo a que possa gerir as políticas monetária, financeira e cambial da forma que melhor sirva os interesses da gestão da economia e do crescimento equilibrado da mesma no longo prazo.
Uma nota que deve ficar bem clara, mais uma vez, é a de que é essencial, no entanto, que haja mecanismos de articulação, coordenação entre estas políticas e as demais, nomeadamente a política orçamental. Mais, deve ficar bem claro que o facto de haver independência do banco central --- no que toca à definição e implementação das políticas pelas quais é responsável --- não deve ser entendido como o primeiro passo para haver conflito entre este e o Governo ou o Parlamento. Ora parece que em algumas propostas em debate é isso que se teme. Nada de mais errado!
O Governador de um banco central é, ele próprio, um cidadão do país e é nomeado para o cargo pelo poder político e por isso passa a ter uma legitimidade própria que, não lhe tendo sido outorgada directamente pelo voto popular, deriva dele pois são pessoas/instituições eleitas pelo povo quem o nomeia.
Mais. Há uma história deliciosa que corre nos meios dos bancos centrais e que diz bem do espírito que deve presidir à acção de um "banqueiro central" e, por consequência, a própria instituição que dirige.
Essa história sobre o uso pelos "banqueiros centrais" e "seus" bancos de três "chapéus" refere as características do comportamento de um banqueiro/banco central. Como se poderá verificar, dificilmente haverá que temer que este se vire contra "os superiores interesses do país".
Transcrevemos abaixo essa história na versão que nos foi passada pelo antigo director-geral da ABP, Luís Quintaneiro, a quem agradecemos:
"Um responsável de um banco central deve saber usar adequadamente os seus “três chapéus”:
Por um lado deve ter as capacidades de um “académico”: deve saber usar o arsenal teórico desenvolvido pela ciência económica para entender o comportamento da economia e antecipar as suas tendências de modo a “desenhar” a política económica não de acordo com a realidade presente mas sim tendo em conta os previsíveis desenvolvimentos futuros.
Por outro lado deve ser um “banqueiro”, isto é, deve ter a percepção das motivações e do comportamento das instituições bancárias que estão sob a sua supervisão, de modo a permitir que se desenvolvam novos instrumentos que sirvam simultaneamente os bancos e os seus clientes, mas que paralelamente impeça práticas não concorrenciais, abusivas ou que causem distorções do mercado. Também deve ter os “instintos” de um banqueiro nas áreas de actuação do banco central que tenham mais semelhanças com a actividade da banca comercial, como a gestão das reservas cambiais ou de fundos sob a sua gestão, bem como a gestão dos sistemas de pagamentos.
Por último deve ter a ética de um “civil servant”, lembrando-se a cada momento que a sua acção deve ser norteada pelo interesse público e que uma instituição com as características de um banco central tem acima de tudo a missão de assegurar que esse interesse público prevalece sobre quaisquer outros interesses. Recorde-se que a estabilidade monetária e a confiança do público no sistema bancário são “bens públicos” de que o banco central deverá ser o guardião"
Entendidos?
PS - uma nota final apenas para esclarecer, da forma mais simples possível, o significado de "bem público": o ar, a água, as estradas mas também a estabilidade política e económica são "bens públicos" na medida em que, não sendo "propriedade" de ninguém, beneficiam, pela sua simples existência, o bem estar da sociedade. Assim, a "estabilidade monetária e a confiança do público no sistema bancário" são bens públicos exactamente porque ajudam a garantir a estabilidade do crescimento económico do país. É para isso que é necessária a independência dos bancos centrais.
Uma nota que deve ficar bem clara, mais uma vez, é a de que é essencial, no entanto, que haja mecanismos de articulação, coordenação entre estas políticas e as demais, nomeadamente a política orçamental. Mais, deve ficar bem claro que o facto de haver independência do banco central --- no que toca à definição e implementação das políticas pelas quais é responsável --- não deve ser entendido como o primeiro passo para haver conflito entre este e o Governo ou o Parlamento. Ora parece que em algumas propostas em debate é isso que se teme. Nada de mais errado!
O Governador de um banco central é, ele próprio, um cidadão do país e é nomeado para o cargo pelo poder político e por isso passa a ter uma legitimidade própria que, não lhe tendo sido outorgada directamente pelo voto popular, deriva dele pois são pessoas/instituições eleitas pelo povo quem o nomeia.
Mais. Há uma história deliciosa que corre nos meios dos bancos centrais e que diz bem do espírito que deve presidir à acção de um "banqueiro central" e, por consequência, a própria instituição que dirige.
Essa história sobre o uso pelos "banqueiros centrais" e "seus" bancos de três "chapéus" refere as características do comportamento de um banqueiro/banco central. Como se poderá verificar, dificilmente haverá que temer que este se vire contra "os superiores interesses do país".
Transcrevemos abaixo essa história na versão que nos foi passada pelo antigo director-geral da ABP, Luís Quintaneiro, a quem agradecemos:
"Um responsável de um banco central deve saber usar adequadamente os seus “três chapéus”:
Por um lado deve ter as capacidades de um “académico”: deve saber usar o arsenal teórico desenvolvido pela ciência económica para entender o comportamento da economia e antecipar as suas tendências de modo a “desenhar” a política económica não de acordo com a realidade presente mas sim tendo em conta os previsíveis desenvolvimentos futuros.
Por outro lado deve ser um “banqueiro”, isto é, deve ter a percepção das motivações e do comportamento das instituições bancárias que estão sob a sua supervisão, de modo a permitir que se desenvolvam novos instrumentos que sirvam simultaneamente os bancos e os seus clientes, mas que paralelamente impeça práticas não concorrenciais, abusivas ou que causem distorções do mercado. Também deve ter os “instintos” de um banqueiro nas áreas de actuação do banco central que tenham mais semelhanças com a actividade da banca comercial, como a gestão das reservas cambiais ou de fundos sob a sua gestão, bem como a gestão dos sistemas de pagamentos.
Por último deve ter a ética de um “civil servant”, lembrando-se a cada momento que a sua acção deve ser norteada pelo interesse público e que uma instituição com as características de um banco central tem acima de tudo a missão de assegurar que esse interesse público prevalece sobre quaisquer outros interesses. Recorde-se que a estabilidade monetária e a confiança do público no sistema bancário são “bens públicos” de que o banco central deverá ser o guardião"
Entendidos?
PS - uma nota final apenas para esclarecer, da forma mais simples possível, o significado de "bem público": o ar, a água, as estradas mas também a estabilidade política e económica são "bens públicos" na medida em que, não sendo "propriedade" de ninguém, beneficiam, pela sua simples existência, o bem estar da sociedade. Assim, a "estabilidade monetária e a confiança do público no sistema bancário" são bens públicos exactamente porque ajudam a garantir a estabilidade do crescimento económico do país. É para isso que é necessária a independência dos bancos centrais.
quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011
À política o que é da política, à economia o que é da economia...
Antes de escrever quanto se segue devo, mais uma vez e AGORA POR MAIORIA DE RAZÃO, pedir ao leitor que releia o "aviso" que figura aqui ao lado sobre a independência com que escrevo estas notas. Mesmo o que se vai seguir, que diz directamente respeito à entidade a que estou ligado profissionalmente neste momento em Timor Leste --- a Autoridade Bancária e de Pagamentos --- deve ser visto neste quadro pois SÓ A MIM RESPONSABILIZA e não a ABP, representada em todas as circunstâncias pela sua Administração e não por mim --- claro!
Vamos então ao que me traz aqui.
Ao fim de um longo processo de gestação e de avanços e recuos em direcção à sua aprovação pelo Parlamento Nacional, foi ontem aprovado na generalidade o projecto de lei apresentado pela bancada da FRETILIN sobre o estatuto do "Banco Central de Timor-Leste". A proposta foi remetida para discussão na comissão da especialidade acompanhada de um parecer da deputada Maria Paixão da Costa. Deverá depois regressar ao plenário para aprovação. Esta proposta, deve esclarecer-se, é "herdeira directa" de uma que a própria ABP tinha feito ainda no tempo dos governos anteriores.
Neste parecer figuram várias propostas com origem no Governo para alteração da proposta inicial . É, para já, sobre um dos pontos que gostaria de dizer aqui qualquer coisa que se prende, muito directamente, com um dos aspectos mais relevantes de qualquer estatuto de qualquer banco central --- com poucas excepções, acredito. Trata-se do problema, verdadeira pedra basilar de qualquer estatuto e de qualquer banco central, da sua independência face ao Governo.
A "boa prática" internacional é a de assegurar essa independência POR RAZÕES ECONÓMICA, ainda que também, em parte, por razões políticas --- que se ligam, por fim, com as razões económicas.
A razão económica é o facto de com essa independência do banco central se pretender assegurar --- ou assegurar o mais possível --- a independência entre a definição da política fiscal/orçamental (a cargo do Governo) e a da política monetária e cambial (que deve estar ao cuidado do Banco Central).
Essa independência é como que a garantia de uma vigilância mútua entre ambas as políticas e, principalmente, de que a política monetária tem instrumentos para contrabalançar os "excessos" quantas vezes cometidos pelos "políticos" ao adoptarem os orçamentos anuais. Note-se que o que fica dito é-o em sentido genérico e NÃO tem nada a ver com o que eu possa pensar ou deixar de pensar com a actual política orçamental.
Por outro lado, a independência do banco central face ao governo e ao Ministério das Finanças tem também uma vantagem: a de que se existir instabilidade política num país, com "demasiadas" alterações da orientação da política orçamental, há pelo menos uma entidade (o banco central), usualmente com um perfil essencialmente técnico e não político, que pode ser essencial para assegurar uma certa estabilidade do comportamento da economia. Assim melhorando o desempenho desta.
Ora o que vimos nós na proposta que subiu à comissão "C"? A redacção do artigo 5 passará a ser, se for aprovada a proposta do Governo, como segue: "O objectivo primário do Banco é atingir e manter a estabilidade interna dos preços e [aqui é que começa o busílis...] é co-responsável com o Governo por definir e implementar a política financeira e monetária, aprovada pelo Parlamento Nacional".
Mas então onde fica a ideia da independência do Banco Central? Em lado nenhum, claro! Curiosamente, o BC, na sua função de definição e implementação das políticas monetária, financeira e cambial, passa a ficar dependente não só do Governo MAS TAMBÉM DO PARLAMENTO. O Parlamento, um órgão eminentemente político, a ditar as regras da política monetária e financeira (e cambial)?!...
Note-se que não está em causa a necessidade de haver algum tipo de articulação entre as várias políticas (orçamental e monetária, principalmente) mas "articulação" é uma coisa (boa); dependência e co-responsabilidade, são outras (más).
Para contraposição vejam-se alguns exemplos retirados de estatutos de outros bancos centrais da região (Sudeste Asiático) para se perceber a que distância se está das referidas "boas práticas" internacionais:
Banco Central da Indonésia:
Banco Central da Malásia:
Podem ter a certeza: a independência do banco central compensa! Economicamente falando.
Vamos então ao que me traz aqui.
Ao fim de um longo processo de gestação e de avanços e recuos em direcção à sua aprovação pelo Parlamento Nacional, foi ontem aprovado na generalidade o projecto de lei apresentado pela bancada da FRETILIN sobre o estatuto do "Banco Central de Timor-Leste". A proposta foi remetida para discussão na comissão da especialidade acompanhada de um parecer da deputada Maria Paixão da Costa. Deverá depois regressar ao plenário para aprovação. Esta proposta, deve esclarecer-se, é "herdeira directa" de uma que a própria ABP tinha feito ainda no tempo dos governos anteriores.
Neste parecer figuram várias propostas com origem no Governo para alteração da proposta inicial . É, para já, sobre um dos pontos que gostaria de dizer aqui qualquer coisa que se prende, muito directamente, com um dos aspectos mais relevantes de qualquer estatuto de qualquer banco central --- com poucas excepções, acredito. Trata-se do problema, verdadeira pedra basilar de qualquer estatuto e de qualquer banco central, da sua independência face ao Governo.
A "boa prática" internacional é a de assegurar essa independência POR RAZÕES ECONÓMICA, ainda que também, em parte, por razões políticas --- que se ligam, por fim, com as razões económicas.
A razão económica é o facto de com essa independência do banco central se pretender assegurar --- ou assegurar o mais possível --- a independência entre a definição da política fiscal/orçamental (a cargo do Governo) e a da política monetária e cambial (que deve estar ao cuidado do Banco Central).
Essa independência é como que a garantia de uma vigilância mútua entre ambas as políticas e, principalmente, de que a política monetária tem instrumentos para contrabalançar os "excessos" quantas vezes cometidos pelos "políticos" ao adoptarem os orçamentos anuais. Note-se que o que fica dito é-o em sentido genérico e NÃO tem nada a ver com o que eu possa pensar ou deixar de pensar com a actual política orçamental.
Por outro lado, a independência do banco central face ao governo e ao Ministério das Finanças tem também uma vantagem: a de que se existir instabilidade política num país, com "demasiadas" alterações da orientação da política orçamental, há pelo menos uma entidade (o banco central), usualmente com um perfil essencialmente técnico e não político, que pode ser essencial para assegurar uma certa estabilidade do comportamento da economia. Assim melhorando o desempenho desta.
Ora o que vimos nós na proposta que subiu à comissão "C"? A redacção do artigo 5 passará a ser, se for aprovada a proposta do Governo, como segue: "O objectivo primário do Banco é atingir e manter a estabilidade interna dos preços e [aqui é que começa o busílis...] é co-responsável com o Governo por definir e implementar a política financeira e monetária, aprovada pelo Parlamento Nacional".
Mas então onde fica a ideia da independência do Banco Central? Em lado nenhum, claro! Curiosamente, o BC, na sua função de definição e implementação das políticas monetária, financeira e cambial, passa a ficar dependente não só do Governo MAS TAMBÉM DO PARLAMENTO. O Parlamento, um órgão eminentemente político, a ditar as regras da política monetária e financeira (e cambial)?!...
Note-se que não está em causa a necessidade de haver algum tipo de articulação entre as várias políticas (orçamental e monetária, principalmente) mas "articulação" é uma coisa (boa); dependência e co-responsabilidade, são outras (más).
Para contraposição vejam-se alguns exemplos retirados de estatutos de outros bancos centrais da região (Sudeste Asiático) para se perceber a que distância se está das referidas "boas práticas" internacionais:
Banco Central da Indonésia:
Banco Central da Malásia:
Banco central de Singapura (MAS):
Estes são alguns exemplos que nos parecem merecer atenção, qualquer deles apontando no mesmo sentido da proposta que foi submetida ao Parlamento Nacional e em sentido contrário à proposta do Governo.Podem ter a certeza: a independência do banco central compensa! Economicamente falando.
sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011
Huuummmmm!... O que se passará?!...
Refiro-me à subida do preço dos combustíveis. Neste momento acabam de ultrapassar a barreira psicológica do 1 USD por litro. Curiosamente, em Janeiro de 2008 o preço também era esse. Só que então o preço do barril era mais alto que agora: ele era então de 93 dólares. Agora está a 89,5 USD/barril.
A diferença não é grande mas mesmo assim fica-se com a desconfiança de que anda por aí alguma combinação de preços entre vendedores para empurrar o preço dos combustíveis para cima...
Esse "conluio" --- se existir, claro! --- não é necessariamente nacional --- que também poderá existir, claro... --- pois pode muito bem ser internacional. E isto é tão verdade para o país X como para o Y, para não falar no Z...
A diferença não é grande mas mesmo assim fica-se com a desconfiança de que anda por aí alguma combinação de preços entre vendedores para empurrar o preço dos combustíveis para cima...
Esse "conluio" --- se existir, claro! --- não é necessariamente nacional --- que também poderá existir, claro... --- pois pode muito bem ser internacional. E isto é tão verdade para o país X como para o Y, para não falar no Z...
Taxas médias anuais de inflação, 2003-2010
Não há grandes comentários a fazer ao gráfico abaixo. Os mais atentos repararão que a estimativa de 4% para 2010 que consta de documentos do Governo e do FMI terá sido ultrapassada.
Muitas razões terão contribuído para isso mas o custo crescente das (muitas) importações --- resultantes de subidas de preços nos países fornecedores, nomeadamente a Indonésia (inflação de 7% em 2010) e da desvalorização do USD (cerca de 13% face à rupia) ---, o encarecimento dos combustíveis e efeitos multiplicadores sobre o resto da economia, um excesso de procura (privada e pública) sobre a oferta (nacional e importada), são algumas das causas.
É cedo para fazer previsões em relação ao futuro (2011) mas quase que aposto as minhas barbas em como ela, a não ser que haja significativas mudanças em relação ao passado, vai ficar acima dos 4%...Bele?!...
PS - há uns sete anos que NÃO tenho barbas...! Rssss!...
quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011
Um país que nasceu ... virado para a Lua? :-)
Desculpem-me o popularismo mas não resisti...
O Orçamento de 2011 foi elaborado tendo como um dos pressupostos o de que o preço médio do petróleo em 2011 seria de 68 USD/barril. Ora, a média das cotações de Janeiro foi de... 89,5 USD/barril! Mais 31%!...
E toda a gente conta que, com ou sem crise no Egito, a cotação continue a subir... E a Energy Information Agency americana estima que o preço médio de 2011 venha a ser de 93,26 USD/barril! 37% acima do preço usado nos cálculos. Mas vai passar essa marca, quase de certeza...
Resultado? As receitas petroliferas vão ser (espera-se...) muito maiores que o esperado. O que significa que os mais de mil milhões de USD que vão ser retirados do Fundo Petrolífero para financiar o OGE vão "fazer mossa" no seu capital potencial mas não tão grande como o que se perspectiva neste momento.
Mas o verdadeiro problema não é esse: o problema é saber se os recursos a gastar vão ser bem utilizados, se o Estado não irá "pagar gato por lebre", se um volume tão grande de despesa não vai ter consequências noutras variáveis --- por exemplo num acelerar da taxa de inflação ---, etc. Isto é: o problema é mais o da eficiência da utilização dos recursos do que o do gastar as quantidades X, Y ou Z de recursos. O problema é o das utilizações alternativas a fazer do mesmo dinheiro e da rentabilidade que a sociedade tira de uma forma ou de outra de o gastar. Ou, dito de outra forma: se não será possível obter o mesmo por menos dinheiro...
Para alguns é claro que o problema é também o de que quanto mais notas aparecerem a espreitar fora da algibeira de quem o tem mais a gula de uns quantos se aguça e a sua imaginação se desdobra em esquemas de ficar com a maior parte possível do bolo... Ainda se o aproveitassem de uma forma produtiva!...
O Orçamento de 2011 foi elaborado tendo como um dos pressupostos o de que o preço médio do petróleo em 2011 seria de 68 USD/barril. Ora, a média das cotações de Janeiro foi de... 89,5 USD/barril! Mais 31%!...
E toda a gente conta que, com ou sem crise no Egito, a cotação continue a subir... E a Energy Information Agency americana estima que o preço médio de 2011 venha a ser de 93,26 USD/barril! 37% acima do preço usado nos cálculos. Mas vai passar essa marca, quase de certeza...
Resultado? As receitas petroliferas vão ser (espera-se...) muito maiores que o esperado. O que significa que os mais de mil milhões de USD que vão ser retirados do Fundo Petrolífero para financiar o OGE vão "fazer mossa" no seu capital potencial mas não tão grande como o que se perspectiva neste momento.
Mas o verdadeiro problema não é esse: o problema é saber se os recursos a gastar vão ser bem utilizados, se o Estado não irá "pagar gato por lebre", se um volume tão grande de despesa não vai ter consequências noutras variáveis --- por exemplo num acelerar da taxa de inflação ---, etc. Isto é: o problema é mais o da eficiência da utilização dos recursos do que o do gastar as quantidades X, Y ou Z de recursos. O problema é o das utilizações alternativas a fazer do mesmo dinheiro e da rentabilidade que a sociedade tira de uma forma ou de outra de o gastar. Ou, dito de outra forma: se não será possível obter o mesmo por menos dinheiro...
Para alguns é claro que o problema é também o de que quanto mais notas aparecerem a espreitar fora da algibeira de quem o tem mais a gula de uns quantos se aguça e a sua imaginação se desdobra em esquemas de ficar com a maior parte possível do bolo... Ainda se o aproveitassem de uma forma produtiva!...
quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011
Ainda sobre o Fundo Petrolífero, as receitas petrolíferas e as transferências para o OGE
Em complemento da informação aqui dispnibilizada ontem, considerámos de interesse comparar as receitas petrolíferas tal como estimadas no momento da elaboração dos Orçamentos de Estado para os anos em referência, as receitas que vieram efectivamente a ser cobradas e as transferências efectuadas para o OGE em cada um dos três últimos anos, i.e., desde que o ano fiscal passou a coincidir com o ano civil.
Os valores, tomados dos Orçamentos tal como apresentados inicialmente ao Parlamento Nacional e não nas suas versões "rectificadas" a meio do ano, são apresentados no gráfico abaixo. Por ele se pode verificar que as estimativas efectuadas quanto às receitas foram sempre significativamente "conservadoras" devido ao método utilizado na fixação do preço do barril a que elas eram feitas.
Por isso, não admira --- e até se compreende ---, que na preparação do OGE de 2011 o Governo tenha adoptado um método menos conservador que fez "disparar" o valor do "rendimento sustentável" dos 501 de 2010 para os 732 de 2011 (ainda assim ultrapassado em 323 milhões extra --- mais 44%!... ---, para 1055 milhões de USD, na versão do Orçamento aprovada recentemente pelo Parlamento Nacional.
Como o Presidente da República achou por bem solicitar a análise da constitucionalidade do OGE2011, ficamos à espera dos valores finais (estes ou outros, se o Tribunal de Recurso entender, como o PR e outros agentes políticos ou simples observadores, que há inconstitucionalidades no actual Orçamento).
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terça-feira, 8 de fevereiro de 2011
Fundo Petrolífero: 6,9 mil milhões de USD no fim de 2010
A Autoridade Bancária e de Pagamentos de Timor-Leste, a entidade responsável pela gestão corrente do Fundo Petrolífero, divulgou hoje o relatório trimestral nº 22, sobre os resultados da gestão do Fundo durante o último trimestre de 2010.
As principais conclusões são que:
a) o capital do Fundo era, em 31 de Dezembro de 2010, de 6,9 mil milhões de dólares americanos, um crescimento de 300 milhões relativamente ao trimestre terminado em 30 de Setembro e apesar de...
b) o Governo ter solicitado a transferência para a sua conta de uma verba de 436 milhões de USD;
c) As entradas brutas de dinheiro foram de 762 milhões de USD.
O gráfico abaixo sintetiza a evolução do capital do Fundo desde a sua criação em Setembro de 2005 bem como o valor retirado em cada trimestre pelo Governo para financiamento do OGE.
Por sua vez, no gráfico abaixo apresentam-se as percentagens das receitas anuais do Fundo solicitadas pelo Governo para financiar o Orçamento. Entre parenteses figura o montante (em milhões de USD) das transferências anuais efectuadas. Note-se o crescendo da percentagem e o facto de em 2010 terem atingido um pouco mais de 1/3 das receitas, quando no ano anterior a percentagem tinha sido de quase 28%. O baixo valor de 2008 deve-se em boa parte ao facto de as receitas petrolíferas nesse ano terem sido especialmente elevadas devido ao aumento do preço do petróleo que se verificou nesse ano.
As principais conclusões são que:
a) o capital do Fundo era, em 31 de Dezembro de 2010, de 6,9 mil milhões de dólares americanos, um crescimento de 300 milhões relativamente ao trimestre terminado em 30 de Setembro e apesar de...
b) o Governo ter solicitado a transferência para a sua conta de uma verba de 436 milhões de USD;
c) As entradas brutas de dinheiro foram de 762 milhões de USD.
O gráfico abaixo sintetiza a evolução do capital do Fundo desde a sua criação em Setembro de 2005 bem como o valor retirado em cada trimestre pelo Governo para financiamento do OGE.
Por sua vez, no gráfico abaixo apresentam-se as percentagens das receitas anuais do Fundo solicitadas pelo Governo para financiar o Orçamento. Entre parenteses figura o montante (em milhões de USD) das transferências anuais efectuadas. Note-se o crescendo da percentagem e o facto de em 2010 terem atingido um pouco mais de 1/3 das receitas, quando no ano anterior a percentagem tinha sido de quase 28%. O baixo valor de 2008 deve-se em boa parte ao facto de as receitas petrolíferas nesse ano terem sido especialmente elevadas devido ao aumento do preço do petróleo que se verificou nesse ano.
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