... Relatório Nacional do Desenvolvimento Humano de Timor Leste, editado no início deste mês de Maio/11 pelo escritório do PNUD no país.
Desta vez vamos debruçarmo-nos sobre o capítulo 3, intitulado "O Fundo Petrolífero e o Desenvolvimento Humano de Timor-Leste". Nele se referem, a certa altura, três estratégias possíveis para o uso dos recursos do Fundo Petrolífero não apenas para assegurar o crescimento da economia e o desenvolvimento em geral mas, principalmente, esse tipo específico de desenvolvimento designado por “humano”, com uma forte componente de redução da pobreza, nomeadamente a do mundo rural de Timor Leste.
As estratégias identificadas como possíveis para usar aqueles recursos são as seguintes e correspondem, grosso modo, às estratégias usadas por Fundos semelhantes noutros países:
1- Investir capital financeiro directamente na economia nacional através de investimentos no capital social de empresas
2- Criar fundos “dedicados” a aplicações especiais
3- Distribuir directamente o dinheiro pelos cidadãos, como se eles fossem, p.ex., sócios de uma firma “Timor-Leste, SA”
O trabalho estuda as diversas vantagens e inconvenientes que o PNUD vê nas diferentes estratégias.
A primeira, por exemplo, diverge da actual estratégia do FP de Timor Leste porque este é, por definição, um fundo aplicado apenas no exterior --- com a excepção, não pequena, dos recursos usados para financiar o Orçamento Geral do Estado.
Abrir o leque de investimentos possíveis do Fundo de modo a que ele possa investir em capital de empresas nacionais tem uma vantagem, pelo menos: a de ajudar a desenvolver o sector privado nacional. Porém, há alguns inconvenientes: um deles é o facto de, dada a fraqueza deste mesmo sector privado, o nível de liquidez (ou seja, de capacidade de o FP, se necessário, vender as suas participações no capital de empresas para procurar fazer outros investimentos) é muito baixo. Além disso, o tipo de desenvolvimento da sociedade timorense poderia resultar num aumento dos níveis de corrupção no país pois certamente iriam aparecer investidores que, usando as suas relações privilegiadas com o poder, procurariam "deitar mão" a parte dos capitais investidos captando-a para as suas actividades. Que poderiam ter, ou não, um verdadeiro interesse para o país.
A segunda estratégia tem semelhanças com a que o Governo adoptou no último OGE ao constituir um fundo de Infraestruturas e outro para a melhoria dos recursos humanos. Dois problemas podem surgir: aparecerem grupos sociais pressionando o Governo e/ou o Fundo para abrirem mais fundos específicos para certos fins/actividades que poderão ter um interesse nacional duvidoso, por um lado, e a eficácia das aplicações dos recursos ser duvidosa. Ora dê lá aí 0,5% para os grupos desportivos, mais 4,5% para isto, mais 2,3% para aquilo, etc...
Finalmente a terceira estratégia é a de distribuir dinheiro directamente pelos cidadãos. O Alaska, por exemplo, tem um Fundo deste tipo. Anualmente determina-se um valor que é distribuído igualmente por cada habitante daquele Estado dos Estados Unidos.
Sabendo das preocupações com a luta contra a pobreza e pelo desenvolvimento rural que o PNUD tem, não é de admirar que esta seja a estratégia preferida pela instituição.
O seu argumento baseia-se nas várias vantagens que ela tem: permite fazer o dinheiro chegar mais directamente aos cidadãos, sem a intermediação de um OGE que tende, nomeadamente no caso de Timor Leste, a sofrer de um nítido "enviesamento pró-urbano" (urban bias); permite, por isso, reduzir os níveis de corrupção para "acaparação" de parte do "bolo" por alguns em detrimento da maioria; e, last not least, permite que as próprias economias locais sejam dinamizadas pois os cidadãos que receberem o dinheiro vão ter tendência a gastá-lo nas suas regiões, provocando assim uma distribuição mais equitativa dos recursos não só entre os cidadãos mas tamém entre as diversas partes do território nacional.
O que achei curioso foi que, conversando com amigos timorenses sobre as diversas estratégias, eles tivessem discordado da opção do PNUD com um argumento não totalmente inesperado mas que, ainda assim, não deixou de me surpreeender vindo de quem vinha: o de que, tendo uma boa parte da sociedade timorense um gosto especial pelo "não-trabalho", atribuir um subsídio mensal a cada habitante adulto seria um incentivo para ele não trabalhar MESMO... Esse subsídio, muito provavelmente, seria o suficiente (ou quase) para que muitas dessas pessoas satifizessem boa parte das suas actuais necessidads, o que as desincentivaria a contribuir para o bem estar geral da população através de trabalho produtivo --- além de não contribuirem para a melhoria da sua própria situação...
E esta, hem?!...
Uma nota final suscitada por este assunto: não é invulgar ver economistas e políticos não tomarem grande atenção a algumas lições que algum conhecimento antropológico das sociedades lhes daria, permitindo melhorar as suas sugestões e as suas políticas. Emendem-se!...
Sem comentários:
Enviar um comentário