domingo, 10 de abril de 2011

2º episódio...

ATENÇÃO, LEITOR: SE AINDA NÃO LEU, COMECE POR LER A ENTRADA ANTERIOR, SFF!

Da entrada anterior resulta que, dado o facto de Timor Leste ser uma economia extremamente aberta ao exterior por via do peso significativo das importações na economia nacional, a sua taxa taxa de inflação será sempre, em parte, aquilo que os outros países e o mercado internacional "deixarem" que seja. Isto é, o sucesso da nossa luta por uma taxa de inflação mais "aceitável" --- por exemplo 4% (ou 5%, no máximo dos máximos) --- estará sempre dependente do que for a inflação "importada".
Note-se que esta, como em 2009, até pode "atirar" com a nossa inflação para níveis muito baixos, como os menos de 1% que então se verificaram devido`, nomeadamente, à forte queda do preço dos combustíveis relativamente ao ano anterior (2008).

Continuemos.

Além dos factores externos já referidos, há também factores internos. Diz uma das teorias mais conhecidas sobre a origem das subidas dos preços, a Teoria Quantitativa da Moeda, que ela depende também da quantidade de moeda existente na economia. Se tivermos 100 ananazes para vender e se houver na economia apenas 100 dólares, o preço dos ananazes será de 1 dólar cada. Mas se, por qualquer motivo, aumentarmos o dinheiro disponível para 120 dólares mas não a quantidade de ananazes disponíveis, é certo e sabido que a competição entre os compradores (p.ex. 100) para obterem cada um o seu ananaz vai fazer com que o mercado (os vendedores...) "empurre" o preço de cada ananaz para 1,2 dólares cada um. Mais 20%!

Ora, o que se tem verificado nos últimos anos é uma subida significativa da "massa monetária" em circulação na economia nacional. Com mais dinheiro disponível, vai haver pressão para os compradores comprarem mais ananazes.... E ou aumentamos a produção interna destes e/ou compramos lá fora para vender cá dentro.
Se comprarmos lá fora ficamos sujeitos a uma subida de preços "importada" nos termos vistos anteriormente (por exemplo, subida do preço no país fornecedor e desvalorização da nossa moeda face à do nosso "vizinho").
Se não houver resposta da produção nacional de ananazes ou se ela for insuficiente face ao acréscimo da procura --- por exemplo, porque têm agora mais dinheiro os consumidores querem 150 ananazes e não 100 ---, o jogo da oferta e da procura no mercado fará empurrar os preços para cima.

Ora, o que se passou nos últimos anos em Timor Leste? Quanto a nós uma "excessivamente rápida" subida da massa monetária face às capacidades de resposta da economia nacional. E porque houve essa rápida subida da massa monetária? "Chercher la femme!..." e vão encontrá-la deitada no leito do Orçamento Geral do Estado.
Isto é: cremos que uma das justificações para a a actual forte subida dos preços é a subida, muito (demasiado?) rápida das despesas públicas. E isto apesar de uma parte significativa delas ir parar ao estrangeiro.
Se queremos fazer baixar a taxa de inflação há que pensar, portanto, em subidas mais moderadas dos gastos públicos de modo a que a economia vá criando mais capacidade de absorção (incluindo mais capacidade de produção) do excesso de procura que hoje se verifica por haver dinheiro "a mais".

É exactamente por quanto fica acima que nos últimos relatórios do FMI e do Banco Mundial se sugere às autoridades fiscais timorenses mais moderação na subida das despesas públicas. Neste caso somos obrigados a concordar...

Duas notas finais.
Primeira: exactamente porque as causas da inflação são múltiplas, não é fácil, muitas vezes, fazer o "trabalho de casa" num só ano e por isso os programas anti-inflacionistas devem ter um horizonte temporal mais alargado do que um ano apenas. Até porque se quisermos que o "doente" melhore "tudo" de repente nos arriscamos a dar-lhe uma "overdose" de medicamentos e ele não morrer da doença mas sim da cura.
Segunda: porque o país não dispõe de moeda própria, os instrumentos de política monetária disponíveis para lutar contra a inflação não são muitos. Além disso e como vimos, uma parte importante do "excesso de massa monetária" em circulação tem origem no excesso de despesa pública. Por isso, só uma boa articulação entre os responsáveis pela política fiscal (o Governo) e pela política monetária (o banco central) pode contribuir para resolver a questão. Note-se que "boa articulação", coordenação de várias políticas, não quer dizer submissão de um a outro. Significa exactamente o que quer dizer normalmente a palavra "cooperação": colaboração "inter pares", colaboração entre entidades independentes uma da outra mas que estão "condenadas" a entenderem-se. Como nos casamentos felizes... ("e foram felizes para sempre!")

PS - não! A solução das limitações quanto à disponibilidade de (mais) instrumentos de política monetária NÃO passa por termos moeda própria. Ou melhor: ter mais instrumentos de política monetária não pode ser o principal critério para optarmos por ter uma moeda nacional. A realidade é muito mais complexa e a actual realidade aconselha a ser muito cautelosso neste domínio, não correndo riscos desnecessários. Mas isso (ter ou não moeda própria) é outra história, de que já falámos aqui algumas vezes, sempre desaconselhando a que, neste momento e no futuro próximo, se dê esse passo. Que pode ser o passo em fente à beira do abismo...

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