Blog sobre Economia e Política Económica do Desenvolvimento, em particular sobre a economia de Timor Leste e aquilo que naquelas pode ser útil ao desenvolvimento económico deste país
sexta-feira, 30 de abril de 2010
"Plano de Desenvolvimento Estratégico" de Timor Leste para 2011-2030
São as ideias centrais de tal plano que o Primeiro Ministro anda a divulgar pelos distritos.
Este "sumário" é um "compacto" das ideias fortes do plano e, apesar de ser um documento de dimensão limitada (24 págs no total), a sua densidade dificulta a análise numa única 'entrada' de um blog como este.
O documento fixa uma certa visão --- que será certamente classificada como "ambiciosa" por uns, "irrealista" por outros e "exigente mas realista" por mais alguns --- do que será o país no final dos 20 anos que terminam em 2030. Sintetizando, pretende-se que Timor Leste deixe de ser um país de "baixo médio rendimento" e se inclua no grupo dos países de "elevado médio rendimento", classificações usuais do Banco Mundial: "Timor‐Leste will be an upper‐middle income country no later than 2030, with the gap closed with today’s richer neighbors, such as Indonesia, Thailand, and Malaysia"
Quanto aos aspectos mais estritamente económicos o que primeiro nos chamou a atenção foi o documento, ao contrário do que tem sido usual (e que será mais aconselhável? Cremos que sim), partir da análise do Produto NACIONAL Bruto e não da do Produto INTERNO Bruto.
Qual a diferença fundamental entre estes dois conceitos: é que no primeiro entram os rendimentos petrolíferos e no segundo eles não são considerados.
Esclareçamos melhor os conceitos usando a Wikipédia:
"O Produto Nacional Bruto (PNB) é uma expressão monetária dos bens e serviços produzidos por fatores de produção nacionais, independentemente do território económico [onde são gerados/produzidos]."
"O Produto Interno Bruto (PIB) difere do Produto Nacional Bruto (PNB) basicamente pelo Rendimento Líquido Enviado ao (ou Recebido do) Exterior (RLEE ou RLRE): o valor deste não é considerado no cálculo do PIB mas é considerado no do PNB"
Tomar em consideração o valor do PNB e não o do PIB tem como efeito, no caso de Timor Leste e devido às suas receitas petrolíferas, "inflacionar" (significativamente) a produção do país. Para se ter uma ideia do que está em causa refira-se que o relatório do FMI sobre a economia de Timor divulgado em meados do ano passado estimava que o Rendimento NACIONAL Bruto do país em 2008 tinha sido de 2915 milhões de USD --- graças aos elevados preços do petróleo naquele ano --- mas que o produto INTERNO bruto não-petrolífero foi de 499 milhões.
Note-se que os rendimentos do petróleo não correspondem, de facto, ao valor da produção de gás e petróleo bruto na zona de exploração conjunta do Mar de Timor mas sim ao somatório dos impostos e dos royalties cobrados às empresas petrolíferas.
A "inflação" da produção que resulta de se tomar em consideração o PNB e não o PIB continua mais adiante quando no documento se analisa o quadro económico geral que se espera vir a ter em 2015:
Nele se diz no final que "Timor Leste continuará a ter um excedente comercial substancial...".
Ora, a balança comercial de um país é o saldo das exportações e das importações de bens/produtos de um país. Mas os impostos e os royalties recebidos não são "bens"/"produtos" e por isso não entram na balança comercial. Uma consulta da balança de pagamentos calculada pela Autoridade Bancária e de Pagamentos de Timor Leste é elucidativa: esses valores, que são aplicados no mercado de capitais para constituição do Fundo Petrolífero, aparecem contabilizados na balança de capitais ou, mais exactamente, na conta financeira [Financial Account].
Note-se, já agora, que a balança comercial incluída na Balança de Pagamentos publicada está muito longe de ter o "substancial trade surplus" referido no Sumário do Plano já que foi de -267 milhões USD em 2008 e -169 no ano anterior.
Há, portanto, uma falta de rigor dos conceitos utilizados que teria sido bom evitar e que nem a necessidade de fazer realçar a disponibilidade de recursos para financiar o plano parece ser justificação suficiente já que se chegaria à mesmíssima conclusão se tivessem sido seguidas as normas usuais de classificação das rubricas da Contabilidade Nacional e da Balança de Pagamentos.
Para terminar, realce-se a parte inicial do "macroeconomic framework" acima [2015], quando se diz que ele "se baseia numa rápida expansão do sector do petróleo e do gás e um investimento dos ganhos desse sector em capital humano [saúde + educação], infraestruturas e sectores estratégicos da economia."
Aqui se refere o principal (?) pressuposto de todo o plano --- a "rápida expansão do sector do petróleo e do gás" --- e o que parecem ser os 3 principais objectivos "instrumentais" a alcançar: o desenvolvimento do capital humano e o aumento do capital físico (em infraestruturas e em sectores estratégicos da produção).
Quanto àquele pressuposto, ele parece ser de tal maneira forte e central a todo o Plano que qualquer "desaire" neste domínio --- por exemplo, a não concretização a curto-médio prazo da instalação da fábrica de liquefacção do gás natural na costa sul do país --- pode deitar por terra todo o "castelo" construído sobre essa base.
Quanto aos objectivos é importante realçar não só a lista como também a ordem em que eles aparecem. Dificilmente estaria mais de acordo com uma e com outra mas tamém é verdade que este é um caso semelhante ao que costumo dizer aos meus alunos quando falamos sobre os Objectivos do Milénio: "eu não contesto os Objectivos do Milénio; são tão genéricos e consensuais que duvido que alguém discorde. Onde eu tenho dúvidas é nas metas para os Objectivos do Milénio".
Isto é: podemos estar de acordo sobre a estrada a tomar mas discordarmos do ponto da estrada onde vamos acampar para piquenicar: à borda da estrada? Um pouco mais para o interior, perto daquele lago que se vê ali em baixo?
E aqui temo que a minha opção seja mais pela qualidade que pela quantidade. Diferentemente do que se deduz do documento em análise? A ver vamos...
terça-feira, 13 de abril de 2010
Banco Asiático de Desenvolvimento sobre a economia de Timor Leste
Nas análises por país há 3 páginas sobre a economia de Timor Leste que reproduzimos abaixo.
A Lei do Fundo Petrolífero (de 2005) e o seu contexto histórico
Não vamos aqui adiantar nada sobre eventuais linhas de força que poderão ajudar a dar forma a tal revisão mas sim recordar --- é sempre bom recordar... --- o contexto histórico em que a lei em vigor foi aprovada.
Um dos elementos principais desse contexto é, certamente, a história e as perspectivas de evolução do preço do petróleo bruto no mercado internacional naquela época. O gráfico abaixo retrata o panorama que então se vivia (desde 2000 até 2005).
Como se pode verificar, o preço do crude sempre sofreu de alguma instabilidade mas, em média, terá rondado os cerca de 25 dólares por barril até meados de 2003 (mas em Dezembro de 1998 andou pelos 8-9 dólares por barril). A partir dessa altura entrou numa fase de aumento quase constante e em meados de 2005, quando a Lei foi aprovada, o preço atingia os cerca de 60 USD/barril. Recorde-se que actualmente o seu preço ronda os cerca de 80 USD/barril.
Com base nos valores de então estimou-se, com o conservadorismo que é de bom tom neste tipo de previsões, que as receitas anuais do Fundo Petrolífero poderiam sustentar uma transferência anual de cerca de 70 milhões de dólares para o Orçamento Geral do Estado. Este valor, que hoje parece ridiculamente baixo face aos montantes actualmente transferidos, resulta, como dissemos, da adopção de estimativas cautelosas das receitas previsíveis (ver o gráfico abaixo, retirado do documento para discussão pública da Lei do Fundo publicado em 2004).
Comparem-se agora as estimativas acima com as que figuram abaixo e que foram publicadas no relatório de 2009 do FMI sobre a economia timorense. Reparem-se nas diferentes escalas do eixo lateral e no que isso significa em termos de diferença, para muito mais, das receitas actuais face às previsões do passado.
Por exemplo, o "pico" de receitas estimado anteriormente deveria ocorrer em 2011 com um pouco menos de 400 milhões de USD. Na verdade o pico, devido ao elevado preço do petróleo nesse ano, verificou-se em 2008 com bem mais que 2000 milhões.
Estas diferenças de escala ajudam a compreender o perfil da Lei adoptada em 2005. Tal como ajudam a compreender as posições recentes do governo no sentido de aumentar significativamente os recursos a utilizar anualmente.
Parece evidente que, estritamente do ponto de vista financeiro e em comparação com o que era o horizonte de 2005, existe uma margem de manobra para aumentar as despesas no curto-médio prazo.
Mais importante do que isso, porém, será definir qual o acréscimo admissível em função de uma política de poupança do país e da capacidade de execução orçamental sem desperdício de recursos, por um lado, e, talvez principalmente, em que sectores é que o acréscimo de recursos serão prioritariamente gastos. Talvez isso possa, mesmo, ser vertido na letra da lei reformulada, terminando com a norma de não imposição de qualquer restrição ao uso dos recursos. Por exemplo, fará sentido obrigar a que pelo menos 2/3 dos recursos sejam obrigatoriamente gastos em "despesas de desenvolvimento"?
Mas isso é conversa para outra altura.
domingo, 11 de abril de 2010
Espreitando por cima do muro da casa do vizinho...
Muito se tem falado ultimamente no Fundo Petrolífero de Timor-Leste e na utilização dos seus recursos financeiros. Não vamos discutir aqui o assunto mas lembrei-me de espreitar a "casa" dos outros.
Foi assim que dei com informações sobre o Fundo de Estabilização Económica e Social do Governo do Chile. Apresento abaixo as imagens correspondentes às 3 primeiras páginas do seu último relatório trimestral (publicado em Dezembro/2009). O texto está em castelhano mas dá para compreender o seu significado.
De qualquer forma chamo particularmente a atenção para os gráficos incluidos, nomeadamente quanto à evolução do valor do Fundo (primeiro gráfico) e à estrutura das suas aplicações, nomeadamente em termos de moedas em que ela são efectuadas (clicar nas páginas para as aumentar e tornar legíveis, sff).
sexta-feira, 9 de abril de 2010
Novos dados sobre a economia de Timor em relatório do Banco Mundial sobre a Ásia
quinta-feira, 8 de abril de 2010
Evolução do preço internacional do arroz
quarta-feira, 7 de abril de 2010
E não acham esquisito?!... Será que as contas foram bem feitas?
“Timor-Leste é um exemplo perfeito [de Estado frágil e dos efeitos da ajuda internacional]. Apesar de terem sido gastos milhares de milhões de dólares no desenvolvimento do país desde a independência, provenientes de parceiros de desenvolvimento e da própria riqueza petrolífera recém-adquirida, a pobreza aumentou para o dobro entre 2001 e 2007"
Isto, a ser tomado pelo seu valor facial --- que não pode ser pois a pobreza NÃO aumentou para o dobro mas sim de cerca de 40% para cerca de 50% segundo as estatísticas ---, denota uma enoooooormeeeee ineficiência da ajuda internacional e, mesmo, das políticas internas de combate à pobreza.
Porém, há que não pôr de parte uma segunda ou, mesmo, uma terceira hipótese: a de que as contas foram mal feitas... Ou que houve uma combinação das duas coisas...
Eu, pessoalmente, acho tão esquisita esta evolução que tendo a acreditar mais que as contas foram mal feitas --- ou pouco "bem feitas"... --- em algum momento do tempo. Provavelmente os dados do primeiro inquérito (de 2001) estão subavaliados e na ocasião a pobreza era muito maior do que o que os números mostram.
Um documento do Banco Mundial sobre a pobreza em Timor Leste em 1999 (sob administração indonésia) diz textualmente que
"1. Este anexo contém uma perspectiva geral da pobreza em Timor Leste, com base
em dados indonésios recolhidos até 1999.
2. Durante 1999, 56% da população timorense estava classificada como pobre,
implicando que cerca de 500.000 pessoas viviam em pobreza." (vd aqui)
Como é possível que dos 56% de 1999 se tenha passado aos 40% de 2001 depois do que se passou? Isto é: há aqui qualquer coisa que não bate certo...
Em contrapartida, estarão os dados de 2007 sobreavaliados? Se compararmos as metodologias seguidas num caso e noutro a resposta é clara: o inquérito de 2007 (e os seus resultados) são muito mais credíveis dos que os do início da década.
Mas há uma outra situação que pode ter inflenciado os resultados dos inquéritos: ambos foram efectuados depois de situações traumáticas muito fortes: o primeiro após a violência de 1999 e o segundo depois da de 2006 e quando algumas zonas do país estavam ainda pejadas de campos de refugiados.
Isto é: situações conjunturais podem ter influenciado significativamente as respostas dos inquiridos.
Mas o que é mais relevante é que a pobreza é muita --- fará realmente diferença que seja 50% ou 40%?!... --- e se concentra principalmente nas zonas rurais do país. Ora, os dados dos inquéritos querem, pelo menos, dizer uma coisa: que a política de desenvolvimento rural não está a resultar... O que nos leva à pergunta seguinte: será que está a haver MESMO uma política de desenvolvimento rural?
Tenho para mim que "Roma e Pavia não se fizeram num dia" e por isso admito que uma estratégia de desenvolvimento rural possa/deva ser "casada" com uma de desenvolvimento regional através, or exemplo e para já, da definição de uma zona piloto em que se proceda a um desenvolvimento integrado e se aprenda a lidar com o assunto de forma a posteriormente estender a experiência ao resto do país.
O que exige, provavelmente, a definição de um órgão gozando de alguma autonomia e que tenha poderes "substraídos" a vários ministérios (pois... Esse vai ser um dos problemas: convencer os Ministros...) de modo a poder desenvolver uma política efectivamente integrada de desenvolvimento (rural e regional). Um exemplo --- outros podem ser imaginados --- seria uma associação dos distritos de Manatuto, Baucau e Viqueque.
Querem experimentar?
terça-feira, 6 de abril de 2010
Ainda os dinheiros do Fundo Petrolífero
Bele, Drª Emília?
Foto a partir de http://jn.sapo.pt/multimedia/infografia.aspx?content_id=1181253
segunda-feira, 5 de abril de 2010
Ainda a propósito das declarações de Jeff Sachs
Será que tomou consciência, por exemplo, das dificuldades de execução orçamental? E será que existe capacidade para gastar anualmente muito mais do que está a ser gasto sem desperdício significativo de recursos? E quais as consequências de uma eventual "explosão" de gastos públicos sobre o resto da economia, nomeadamente em termos de inflação e de (ainda maior) desequilíbrio na balança comercial?
Alguma moderação nas palavras teria sido (muito) bem vinda...
E a propósito: sabendo-se que o Primeiro-Ministro está a elaborar as linhas de força do plano de desenvolvimento para os próximos 20 anos, será que quem convidou Sachs (não sei quem foi) não teve como objectivo (encapotado?!...) enviar "recados" ao PM e ao governo?
Na passagem fulgurante de Jeff Sachs pelo país é curioso que nada tenho sido dito sobre um sector que considero fundamental e que, no curto-médio prazo, pode dinamizar mais a produção nacional --- e não a da Indonésia... --- do que alguns dos investimentos de que Sachs falou: o da habitação e do saneamento básico no contexto de um verdadeiro reordenamento do território --- particularmente em cidades como Dili e Baucau mas também em algumas outras capitais de distrito (Maliana, Aileu, Lospalos e Suai só para citar algumas).
É sabido que o sector da habitação --- para quando uma política habitacional "casada" com uma política de reordenamento do território e de saneamento básico naquelas duas cidades, pelo menos? --- é dos que têm uma menor componente importada e que geram mais emprego quer na fase de construção quer na de decoração (mobiliário, etc). É também um sector que pode dar trabalho a muitas pequenas e médias empresas de timorenses, assim ajudando o empresariado nacional a "crescer", melhorando tecnica e financeiramente.
Fundamental para evitar que tudo fique entregue a uma série de "patos bravos" que repliquem no país o que se fez em Portugal com as famosas "casas tipo maison com janelas tipo fenêtre" e forradas por fora com azulejos de casa de banho --- cujo equivalente em Dili é o uso do verdinho e do amarelinho nas pinturas exteriores de que nem o gradeamento do palãcio presidencial escapou... --- é que sejam organizados gabinetes de arquitectura que definam alguns tipos-padrão de habitações cujos planos deverão ser disponibilizados gratuitamente. Tais gabinetes terão, muito provavelmente, de ser inicialmente assessorados por técnicos estrangeiros.
Para garantir que a contrução segue mínimos de qualidade o Estado poderá dar alguns incentivos, nomeadamente encarregando-se do financiamento de parte das despesas de ordenamento do espaço a construir (arruamentos, esgotos, etc).
Porque esperam?
quinta-feira, 1 de abril de 2010
Fundo Petrolífero de Timor Leste: cerca de 5750 milhões/USDS
Destes, quase 20% estão sob administração do BIS-Bank of International Settelements [Banco de Pagamentos Internacionais], uma instituição financeira internacional que assinou a meio do ano passado um contrato de gestão com a ABP.
No cumprimento do que são as normas orientadoras constantes da Lei do Fundo Petrolífero (que poderá/deverá vir a ser revista este ano, passados 5 anos da sua publicação), o BIS tem autorização (e usou-a) para aplicar uma parte (menor) dos recursos sob sua administração em títulos denominados em outras moedas que não o dólar norte-americano --- ao contrário da ABP que tem no seu "portfolio" apenas títulos do Tesouro dos Estados Unidos.