sábado, 18 de fevereiro de 2012

Segurança Social em Timor Leste: que modelo?

Decorreu nos últimos três dias, aqui em Dili, uma conferência que tentou fazer um balanço de segurança social em Timor Leste nos últimos 10 anos e, principalmente, um como que balanço da actividade do Ministério da Solidariedade Social, à frente do qual se encontra a ministra Maria Domingas Alves, vulgo "Micató". Cabe aqui uma palavra de apreço pelo seu trabalho que acompanho desde os meus primeiros tempos em Timor Leste. A consideração mútua que sempre existiu entre nós não interfere (mas não é, evidentemente, indiferente) ao apreço que sempre tive (e tenho) pelo seu trabalho. Parabéns por este ao longo dos anos e pela forma como decorreu a conferência.

O que quero abordar aqui é o modelo de segurança social adoptado e agora aprovado pelo Parlamento. Ou melhor: quero colocar em confronto dois modelos possíveis para ela, de que se escolheu um deles.
Há basicamente dois modelos: o "de acumulação" e o "de distribuição". O primeiro, mais vulgar em alguns países asiáticos, como Singapura, caracteriza-se por cada trabalhador e cada entidade patronal deste descontarem determinadas percentagens do salário deste para uma conta em nome do trabalhador; o valor acumulado nessa conta ao longo dos anos em que são efectuados descontos e o resultado dos "juros" ganhos por ela são, no momento da reforma do trabalhador, entregues a este na sua totalidade, cessando nesse momento toda e qualquer responsabilidade do sistema de segurança social pra com o trabalhador. Este pode, então, aplicar o dinheiro acumulado como quiser. Trata-se, no essencial, de um sistema de poupança forçada.

O segundo modelo, "de distribuição", é o que caracteriza o "estado social" como praticado na quase totalidade dos países europeus. Os trabalhadores e os patrões descontam para um "bolo" comum a todos os inscritos no sistema e quando o trabalhador atinge a idade de reforma começa a receber uma pensão vitalícia (i.e., até morrer) que é função dos salários que recebeu ao longo da vida e dos descontos que efectuou. Na prática o elemento essencial aqui é a esperança de vida após a idade de reforma e o número de anos de descontos efectuados. Se, por exemplo, as contas tiverem sido feitas para o caso de o trabalhador se reformar aos 60 anos e morrer aos 70, o que ele e o seu patrão descontaram para ele dá para suportar a pensão até esta idade. O "problema" (?) surge se ele sobrevier aos 70 anos e viver, por exemplo, até aos 77... Neste caso quem suporta o "prejuízo" é o conjunto dos trabalhadores que continuarem a trabalhar e a desocontar ou, no limite, o Estado.

Foi este o modelo escolhido para Timor Leste. A sustentabilidade do sistema depende, como vimos, da proporção entre o número de pensionistas e o número de pessoas que continuam a trabalhar e a descontar. Em países de população jovem, como Timor Leste, não há, em princípio que temer por essa sustentabilidade... Já nos países "velhos", como a Europa, a sustentabilidade do sistema está em perigo porque há muitos trabalhadores a receberem pensões e proporcionalmente poucos a trabalharem e descontar...
Mas como todo o cuidado é pouco, é preciso fazer bem as contas, "na ponta do lápis", para saber se o sistema a implementar é sustentável ou não. Em princípio, acreditamos que sim mas mentiria se dissesse que não fico a remoer as ideias... É que é socialmente mais fácil (será?) mudar de um sistema de acumulação para um de distribuição do que o contrário se as coisas não correrem tão bem como o esperado. Por isso o meu receio é de o Estado Timorense se ver envolvido, a um prazo de 30-40 anos --- quando o petróleo acabar... ---, num conjunto de responsabilidades financeiras que podem, na época, serem "pesadas" em relação aos recursos disponíveis.
Por isso fico à espera de ver mais contas sobre a sustentabilidade deste regime de segurança social. É que, como chamou a atenção o Prof. Alfredo Bruto da Costa na sua última conferência, a "segurança social" não se esgota nas prestações pecuniárias. E em Timor Leste há várias formas de "assistência social" que podem ser socialmente mais eficazes que a "simples" transferência de uns dólares.

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