sábado, 25 de abril de 2009

Comentário a um comentário

Quis um leitor anónimo tecer um comentário à nossa entrada de há alguns dias sobre a evolução dos depósitos e dos empréstimos em Timor Leste de acordo com as últimas estatísticas monetárias disponíveis.
Transcrevo abaixo apenas uma parte desse comentário, a que me parece mais relevante para a resposta que se seguirá:

"Imaginemos precisamente esse mesmo cenário, em que a banca de facto concede empréstimos a um nível acima dos seus depósitos, e que era obrigada a recorrer ao banco central. num cenário com os mesmos riscos qual seria a taxa de juro? mais baixa ou mais alta? será que se assim fosse a concorrência não seria maior na banca? será que o serviço não seria melhor? será que o preço pago pelo serviço não seria menor?

e mais qual e o critério utilizado para a cedência de credito? quais os parâmetros? serão os mesmos q por ex em Portugal?"

Vejamos alguns aspectos.
Não é fácil responder com "certezas absolutas" às questões colocadas. Mas é possível tentar "adivinhar" algumas linhas de força tendenciais...
A taxa de juro activa --- aquela que os bancos cobram aos seus clientes, em oposição à taxa passiva, que é aquela que pagam pelos depósitos --- depende essencialmente, em circunstâncias (aproximadamente) normais, do custo do dinheiro que, em média, o banco tem de pagar pelos recursos que utiliza, da taxa de risco de cada negócio e da rentabilidade que o banco pretende obter do seu próprio negócio. Admitindo que esta será uma taxa "normal" e não especulativa, o essencial será, pois, o custo do dinheiro e a taxa de risco do negócio a quem se vai conceder o empréstimo --- isto é, a capacidade de ele ser bem sucedido e de o empresário devolver o dinheiro do empréstimo ao banco.
Quanto ao custo do dinheiro, ele é determinado pelas taxas passivas --- isto é e como referi pela taxa média paga pelos depósitos dos clientes, normalmente baixa --- e pela taxa a pagar pelo dinheiro pedido a outros, seja o banco central seja a banca internacional. Se a taxa fixada pelo primeiro poderá ter em consideração os seus objectivos para a política monetária, o que é certo é que não poderá abstrair-se do "custo (internacional) do dinheiro".
Ora este será determinado principalmente pelo risco-país de Timor Leste que, se for elevado, dará origem à cobrança de taxas de juro elevadas. Claro que quanto mais o país tiver de se endividar no exterior maior será a taxa de juro que terá de pagar. Isso mesmo está a acontecer agora com os empréstimos pedidos pela República Portuguesa e pela banca comercial nacional no mercado internacional de capitais.
Mas as taxas de juro dependem não só das condições em que os bancos se financiam mas também do risco do negócio que vão apoiar.
Ora, parece-me, que aqui é que estará um ponto fundamental de diferenciação entre empresários nacionais e empresários estrangeiros actuando em Timor. Os empresários nacionais tenderão, devido a condições estruturais do país --- incluindo o do nível de desenvolvimento dos próprios empresários timorenses ---, a oferecer à banca comercial garantias (as chamadas "garantias reais" ou outras) muito menores que os empresários estrangeiros. Ora, os parâmetros de decisão dos bancos em relação aos empréstimos são iguais em todos o mundo: o banco não é uma agência de beneficência; é um negócio que é, por um lado, como outro qualquer mas que, por outro, é específico pois depende muito da garantia de o banco vir a receber, mais tarde, o dinheiro que emprestou. Os critérios de concessão de empréstimos são, pois, iguais em toda a parte, seja em Portugal ou no Sudão! Ou em Timor!

Genericamente falando, se houver mais bancos haverá mais concorrência. Mas não estamos a falar de situações "genéricas" mas sim de uma situação concreta, a de Timor, em que o número de bancos e o mercado para empréstimos tenderão a ser sempre relativamente reduzidos. Por isso é que essa concorrência poderá, quando muito, beneficiar os melhores empresários, que oferecem mais garantias de retorno do dinheiro emprestado. Era isso que acontecia em Moçambique quando, há alguns anos atrás, tive de estudar a situação do sistema bancário do país. Os bancos concorriam entre si para atraírem bons clientes e estes jogavam com a situação pondo os bancos a baixar as taxas de juro dos empréstimos que lhes concediam. Mas esse bons clientes, ligados a bons projectos, boas garantias reais e boa capacidade de retorno do investimento eram, em 99,9% dos casos... empresários/empresas estrangeiras. Que, além do mais, tinham a possibilidade de se endividarem nos seus países de origem ou, até e no caso de Moçambique, na África do Sul, com taxas de juro muito mais vantajosas. Isto é: os bancos moçambicanos, para obterem bons clientes, tinham de praticar, a estes, taxas de juro comparáveis com as internacionais. Para os empresários moçambicanos, com dificuldade em obter empréstimos no exterior, menor capacidade de gestão, etc, etc, etc, as taxas de juro eram significativamente superiores --- 2 a 2,5 vezes superiores!
O meu ponto é o de que, tendencialmente e se passar a existir um "risco país" mais elevado --- ele próprio incorporando um risco de eventual desvalorização da moeda nacional ---, os empresários timorenses podem vir a deparar-se com uma situação semelhante à que tiveram de defrontar os empresários moçambicanos: o dinheiro, para eles, ser muito mais caro que para outros, dificultando o desenvolvimento dos seus negócios.

Claro que uma solução (sempre parcial) para este problema poderia ser a criação de um banco nacional "de desenvolvimento" cujos parâmetros de actuação não fossem apenas os utilizados pela banca comercial "normal".
Mas aqui é preciso muito cuidado pois ou há (muito!) fortes garantias de essa instituição --- que não poderá deixar de ter um forte envolvimento do Estado no seu capital e/ou na concessão de bonificações às taxas de juro --- ser bem gerida e não sujeita a esquemas de corrupção e/ou de favorecimento de determinados empresários em detrimento de outros por critérios não-económicos --- p.ex., políticos --- ou então estaremos numa situação em que será "pior a emenda que o soneto".

2 comentários:

Anónimo disse...

entao e se esse banco de investimento, mesmo sendo do estado, for gerido mediante parametros bem definidos e de forma independente? por exemplo por uma equipa de gestão de um banco/consultora internacional que posto esta situacao nao podera ter qualquer interesse adicional em timor? deste modo garantia-se o desenvolvimento do sector privado timorense com um banco de invetimento direccionado, no fundo, era uma gaiola fechada dentro da gaiola aberta...

Anónimo disse...

Pode ser parte da solução... Mas se e só se...
AS