sexta-feira, 17 de setembro de 2010

"Urban bias"

Falámos ontem aqui de um fenómeno que caracteriza muitos processos de desenvolvimento: o "urban bias", traduzível por "enviesamento pró-urbano".
Enviesamento da política, da política económica e não só. Significa ele, como facilmente se deduz do nome, que ao longo do processo de desenvolvimento há a tendência a os benefícios para as zonas urbanas crescerem muito mais rapidamente do que os das zonas rurais.
Este enviesamento está também presente em Timor Leste e manifesta-se de diversas formas que não vale a pena especificar aqui e agora. É um processo, em parte, "natural", para o qual a política (económica e não só) tem de estar muito atento para o contrariar e não deixar que o fosso cidade-campo aumente exageradamente, contribuindo para que parte da população rural "desça" para a cidade capital.

Uma forma visível desse enviesamento é a evolução dos preços dos produtos agrícolas comparada com a dos preços não agrícolas e com os preços em geral.

Por exemplo, o IPC (Índice de Preços no Consumidor) no fim de 2009 era de 149,2 (Dez2001=100). Isto quer dizer que o custo da 'mostarda verde', que era de 40 centavos em Dezembro de 2001, deveria ser, em fins de 2009 e para manter o mesmo valor real daquele mês, de cerca de 0,6 USD (60 cêntimos = 1,492 * 40 ¢) e não exactamente os mesmos 40 centavos de 8 anos antes!


No mesmo sentido, o preço do vulgar "cancun", deveria ser 67 centavos e não 50, o seu preço em DEZ09 --- apenas mais 5 centavos que 8 anos antes.
 
Estes valores dão ideia da enorme perda de poder de compra dos respectivos produtores ao longo dos anos. O caso mais flagrante é do do repolho, cujo preço deveria ser actualmente de cerca de 90 cêntimos e é 1/3 disto.
 
Esta enorme rigidez dos preços de muitos produtos agrícolas deve ter várias explicações, umas eventualmente mais complexas que outras. Vou continuar a "matutar" no assunto... :-) Alguém quer "matutar" comigo?

4 comentários:

Noons disse...

A questão poderia sêr posta assim: a perda do poder de compra dos productores agrícolas é causada pelo "urban bias" ou é a causa do dito?

Argumentos podem sêr dados a suporte de ambos mas importa saber, porque isso ditará o caminho a seguir para evitar o enviesamento, ou pelo menos para minimizar as suas consequências.

Ou de outro modo: o que causa o movimento para os centros urbanos? A falta de comida? Não deve sêr. A falta de meios educacionais? Penso que não, não sei ao certo. Então o quê? A falta de diversões? Talvez.

Nesse caso, a recente mensagem do pres.RH sobre proporcionar o acesso Internet ao interior de Timor poderá sêr um factor a ajudar a manter o pessoal nos campos.

Um abraço
NPdS

pakhartotata nan ruin disse...

É simples, os agricultores produzem os produtos agrícolas, porém vendem-nos aos preços reduzidos, aliás não há evolução dos preços em relação aos seus produtos locais. Enquanto os importados são mais caros, bem comercializados, com uma boa rede de distribuição e mais qualidade de produtos ou seja bem apresentados aos consumidores locais e malaes. Por isso, tendem-se, os preços desses, a subir aproveitando a realidade fabricada de crescimento económico de dois dígitos, o caótico e ausência de planeamento na politica económica do País pelos governantes responsáveis por tal.

No entanto, essa desvantagem e desequilibro da realidade económica contribuirão naturalmente a 'descida' daqueles ze povinhos à cidade Dili.

A isso baptiza-se de enviesamento urbano ou seja desequilíbrio económico das zonas rurais em relação a ou versus Dili.

A solução passa pela necessidade de afastamento dos incompetentes responsáveis pela condução de politicas no sector agrícola (lê-se Mariano Sabino) e dos no planeamento e execução de politica económica de Timor Leste (lê-se Joe Goncalves, Gil Alves e Vaquinha Pires).

Gracias.

Anónimo disse...

Caro Prof,

Está a comparar só produtos exclusivamente comprados por Timorenses, se vir o Ananás, a Banana e as Papaias bem q subiram de preço. Os mercados estão completamente distorcidos e o grande responsável por isso são as vias de acesso, as estradas que não permitem a comercialização dos produtos vindos dos Distritos.
Veja os milhões gastos em tractores, o q beneficiou na produção agricola?? Pouco ou nada e sem as estradas arranjadas, esses tractores daqui a 2 anos estaram na sucata, pq os agricultores não conseguem ter acesso aos mercados desmotivando-os.

Beijinhos da Querida Lucrécia

Noons disse...

Então mas vamos lá a vêr: o problema das estradas - vias de acesso, o que lhes quisermos chamar - não é exactamente novo! Já nos anos 60 eu me lembro das estradas ficarem intransitáveis depois da primeira chuvada da monção.

Isso levou-me a rir-me a bom rir quando ouvi o govêrno Indonésio invocar o alcatroar das estradas por êles como um indicador do seu empenhamento em melhorar Timor: só quem não conhece é que pode acreditar que o alcatrão iria fazêr a mais pequena diferença!

Portanto, há que investigar as vias de comunicação que não fiquem inutilizadas cada vêz que o S.Pedro dá a volta à torneira.

Na década de 60 isso era tratado pelo Arbiru e as 2 barcaças que andavam constantemente pela costa toda a buscar e levar productos.

Claro que hoje há muito melhores e mais rápidos meios marítimos, ninguém está a sugerir um retôrno à lenta barcaça (6nós!...).

Mas que há um lugar para a frota de transporte costeiro rápida, isso há. Principalmente num país onde o estabelecimento de estradas permanentes é tão difícil devido à geografia, clima e frequentes tremores de terra.

Claro: não é a única solução. Mas pelo menos é uma que pode sêr considerada para aliviar o fôsso de transporte com o interior: é incomparávelmente mais fácil construir *E* manter uma estrada de Viqueque para a costa do que de Díli para Viqueque!