ENTREVISTA: Ministro das Finanças timorense defende novos aumentos na taxa de importação
Díli, 11 jan 2023 (Lusa) - O ministro das Finanças de Timor-Leste defendeu hoje novos aumentos na taxa de importação, que duplicou, afirmando que continua a ser baixa e que faz parte de esforços para aumentar as receitas domésticas.
“Estamos há anos a adiar a aprovação de medidas que aumentem a receita doméstica e a assistir ao Fundo Petrolífero a esvaziar-se e é preciso começar a levar este problema a sério”, afirmou Rui Gomes, em declarações à Lusa.
“O aumento afetou os refrigerantes, o açúcar e os carros de luxo. Nenhum destes produtos faz parte do cabaz de compras da maioria das famílias timorenses e por isso o aumento das taxas não terá impacto substantivo na taxa de inflação”, enfatizou.
Rui Gomes explicou que com a entrada em breve de Timor-Leste na Organização Mundial de Comércio (OMC), o país “vai ficar praticamente impedido de aumentar as suas taxas de importação no futuro”.
“Acontece que as nossas taxas de importação são muito baixas comparativamente com outros países e por isso o nosso setor privado não consegue produzir nem exportar nada, enquanto os outros países conseguem facilmente inundar o mercado timorense com os seus produtos. Por exemplo, na Indonésia a taxa de importação vai de 5% aos 15%, por isso a nossa nova taxa de 5% mesmo assim ainda é reduzida”, explicou.
Rui Gomes referia-se à polémica que continua relativamente à introdução de novos impostos seletivos na importação e do aumento de 2,5% para 5% na taxa de importação de todos os bens.
As medidas fazem parte do Orçamento Geral do Estado (OGE) para 2023, em vigor desde 01 de janeiro, que chegou a causar debate no parlamento – com críticas das bancadas dos partidos que apoiam o Governo -, mas ficaram inalteradas na proposta final, entretanto já em vigor.
O aumento dos impostos seletivos gerou críticas, nomeadamente a importadores acusados de especulação nos preços.
Equipas de fiscalização da Autoridade Aduaneira e da Autoridade de Inspeção e Fiscalização das Atividades Económicas e de Segurança Alimentar de Timor-Leste (AIFAESA) estão há vários dias a realizar inspeções a várias empresas em Díli.
O assunto tem suscitado amplo debate nas redes sociais, com cidadãos e pequenos comerciantes a denunciarem aumentos significativos de preços em produtos como açúcar e bebidas açucaradas, alvo de um aumento de imposto a partir de 01 de janeiro.
Em alguns produtos, os preços quase duplicaram, apesar das reservas existentes no país terem sido todas importadas em 2022, ou seja, antes das novas taxas se aplicarem.
Depois de inspeções iniciais, os grossistas e outros chegaram mesmo a retirar alguns produtos dos locais de venda, algo visto igualmente como especulação de preços.
Importadores têm manifestado preocupação sobre os novos impostos seletivos, com especialistas a sublinharem igualmente à forma como foram introduzidos, usando o modelo conhecido como ‘cavaleiros orçamentais’, ou seja, mexidas noutras leis através de medidas introduzidas no OGE.
Dada a demora em chegarem contentores do estrangeiro – as compras chegam a ser feitas quatro ou cinco meses antes – os importadores não sabem, quando compram, que vão ter impostos adicionais.
Rui Gomes disse à Lusa que, comparativamente a outros países, como Portugal, “Timor-Leste tem muito poucos ‘cavaleiros orçamentais’”, notando que “a alteração das leis fiscais pelo OGE, que acontece em quase todos os países, é perfeitamente natural”.
“É quando se está a fazer o OGE que se avaliam as necessidades de financiamento e que é preciso decidir qual a receita e despesa do ano seguinte. O Governo compreende que seja preferível ter algum tempo entre a aprovação de novas taxas de impostos e a sua entrada em vigor, mas a verdade é que a proposta de OGE foi entregue no Parlamento e publicada no site do Ministério das Finanças a 03 de outubro de 2022, há mais de três meses, pelo que desde essa data os importadores podiam ter conhecimento da proposta de alteração das taxas”, referiu.
“O problema para os importadores é acima de tudo um problema para o país: ainda dependemos demasiado da importação de produtos alimentares e, se não mudarmos isso, nomeadamente através da política fiscal, ficamos reféns da volatilidade dos preços internacionais”, sustentou.
Observadores políticos notaram igualmente o facto das medidas impopulares serem aprovadas a poucos meses das eleições e numa altura de grandes pressões inflacionárias devido ao contexto internacional.
Rui Gomes insiste que as medidas adotadas na área das finanças públicas “visam contribuir para o crescimento económico, aumentar a sustentabilidade das finanças públicas e do Fundo Petrolífero” e que “são para o bem do país”.
“Não governamos a pensar em sondagens ou eleições. Podem criticar, mas conseguimos superar as previsões de crescimento do PIB [Produto Interno Bruto] enquanto reduzimos os levantamentos do Fundo Petrolífero”, explicou.
“Os produtos afetados pelas novas taxas são consumidos por uma pequena percentagem da população que tem maiores rendimentos. E por isso escolhemos aumentar as taxas sobre estes produtos e não sobre os produtos consumidos por todos os timorenses, como o arroz, os vegetais, as frutas, ou mesmo o combustível ou as motorizadas. Claro que há sempre quem se queixe, mas estamos confiantes que esta opção é a melhor para o país”, vincou.
Relativamente à perceção de desigualdade nos impostos sobre o álcool, aplicados de acordo com a variação e por litro das bebidas, Rui Gomes rejeitou críticas sobre o facto desse modelo penalizar, por exemplo, vinhos mais baratos.
“O imposto sobre as bebidas alcoólicas não serve só para arrecadar receita, serve também para moderar o consumo de álcool, que é um produto prejudicial para a saúde, que está associado ao crime e à violência doméstica e que aumenta os acidentes viários”, afirmou.
“Um vinho mais barato é tão prejudicial como um vinho mais caro. Por isso a taxa de imposto sobre as bebidas alcoólicas não é determinada pelo preço da bebida, mas pela quantidade de álcool. A taxa das bebidas mais alcoólicas é maior do que as bebidas menos alcoólicas”, disse.
ASP // VQ
Lusa/Fim